São Paulo, terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

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Receita detecta notas frias na campanha de Serra em 2002

PSDB foi autuado em R$ 7 milhões e teve suspensa sua imunidade tributária

Segundo a auditoria, notas somam R$ 476 mil; PSDB nega haver irregularidades em suas contas e diz que o órgão federal age de má-fé

LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Receita Federal detectou notas fiscais frias emitidas por uma empresa fantasma e por outra inidônea para o PSDB e a campanha à Presidência da República em 2002 do tucano José Serra, no valor de R$ 476 mil, segundo a Delegacia da Receita Federal de Brasília, que suspendeu a imunidade tributária do partido e o autuou em aproximadamente R$ 7 milhões.
A Folha obteve documentos sigilosos da auditoria nas contas tucanas e do auto de infração. A empresa inidônea é a Marka Serviços de Engenharia, que estava desativada desde janeiro de 1996 e pertence a Márcio Fortes, secretário-geral do PSDB (1999 a 2003) quando as notas foram emitidas. Em 2002, Fortes presidiu o comitê financeiro tucano nas eleições.
Dois dos cheques do PSDB nominais à Marka (total de R$ 94,7 mil) foram depositados na conta pessoal de Fortes. Houve também uma transferência eletrônica (R$ 44,5 mil) referente ao pagamento de uma nota fiscal da Marka para a conta de Margarete Licassali Lucindo, funcionária do PSDB.
Equipe especial de fiscalização constituída para esquadrinhar as contas de nove partidos foi ainda mais dura com o PSDB. Os auditores identificaram 15 notas frias, no valor de R$ 1,144 milhão, emitidas por quatro empresas, incluindo a Marka e a fantasma Gold Stone Publicidade e Propaganda.
"A empresa está baixada desde 09/01/1996, e as notas foram emitidas em 2001 e 2003. Não pode o partido alegar que agiu de boa-fé, isto é, que não sabia da situação baixada da empresa, pois o responsável pela empresa perante a Receita Federal é o sr. Marcio João de Andrade Fortes, que, à época, era secretário-geral do partido", destacaram os auditores.
Embora a Gold Stone tenha registrado que foi aberta em 1996, a Receita nunca conseguiu localizar a sede da empresa, ou seja, ela nunca existiu fisicamente. Também nunca recolheu um centavo de imposto.
No auto de infração, baseado na auditoria da equipe de fiscalização, a delegacia da Receita aceitou as explicações do partido em relação a outras duas empresas, Casablanca Service Provider e Aconchegante Editora e Eventos, que emitiram notas para o PSDB no valor total de R$ 668 mil em 2002, ano em que ambas as empresas declaram receita zero ao fisco- isto é, não recolheram nada de imposto, como se não tivessem funcionado naquele ano.
A delegacia da Receita entendeu nesses dois casos que irregularidades tributárias e eventual sonegação de impostos são de responsabilidade das empresas, e não do PSDB.
Em relação à Marka e à Gold Stone, contudo, a delegacia do fisco em Brasília manteve a constatação da equipe de fiscalização: a primeira não tinha idoneidade para emitir notas, e o PSDB não comprovou a efetiva prestação de serviços pela segunda. A delegacia corroborou também a afirmação da auditoria de que houve distribuição de recursos do partido no caso do depósito na conta de Margarete, em desrespeito ao Código Tributário Nacional, que rege a imunidade fiscal dos partidos políticos.
No jargão dos fiscais da Receita, notas frias são em geral emitidas para "acobertar despesas", isto é, escamotear a verdadeira finalidade do dinheiro.
O PSDB nega qualquer irregularidade e já entrou com recurso na Delegacia de Julgamento da Receita. Independentemente do resultado, a Receita deve encaminhar os ilícitos à Justiça Eleitoral, que pode cassar o registro do partido.
O secretário de Organização do PSDB, Eduardo Jorge, disse que não tem cabimento o trabalho da Receita, que o órgão está agindo "de má-fé" e acusou o PT de estar por trás do vazamento da informação para desviar o foco do escândalo dos cartões. Afirmou ainda que o PSDB vai provar a lisura das contas na Delegacia de Julgamento.
As investigações nas contas do PSDB fazem parte de uma devassa na contabilidade dos partidos iniciada pela Receita em 2005, após as denúncias de caixa dois do PT no escândalo do mensalão. Antes direcionada aos partidos da base aliada ao governo, beneficiários do mensalão, a auditoria foi estendida ao PSDB e ao DEM.


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