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JULGAMENTO DO MENSALÃO
Com consultorias secretas, Dirceu mantém influência
Ex-ministro, que viaja de 2 a 3 vezes por semana para atender empresas privadas, mantém sob sigilo nomes de seus clientes
Atual refúgio do petista é seu sobrado em Vinhedo, avaliado em R$ 500 mil; ex-ministro se recusa a mostrar contratos e nega fazer lobby
RUBENS VALENTE
ENVIADO A VINHEDO (SP)
Portugal, República Dominicana, Argentina, Peru, Chile,
duas vezes nos Estados Unidos,
México, Nicarágua e, por fim,
uma semana de folga em Toronto, no Canadá - só de janeiro para cá. Duas a três viagens
por semana pelo Brasil, palestras e consultorias remuneradas para empresas privadas.
Para descansar, um sobrado
avaliado em R$ 500 mil, de 300
metros quadrados com três
quartos, quatro banheiros e
dois escritórios, em Vinhedo, a
76 km de São Paulo.
Aos 61 anos, o ex-líder estudantil, ex-aprendiz de guerrilheiro em Cuba, ex-vendedor
de jeans, ex-ministro e ex-homem forte do governo Lula -
acusado de ser o "chefe da quadrilha" do mensalão -, o advogado José Dirceu de Oliveira e
Silva cumpre uma rotina tão
agitada quanto reservada
-ninguém fora de seu círculo
sabe para quem ele trabalha e
quem sustenta a maratona de
hotéis e aeroportos. E ele não
faz questão de esclarecer.
A Folha encaminhou à assessoria do ex-ministro lista de
17 possíveis clientes de Dirceu,
citados pela imprensa. A resposta: "Os contratos de consultoria têm cláusulas de confidencialidade, o que é normal e
rotineiro. Ele teria de pedir aos
contratantes autorização para
confirmar e não acha que deva
fazer isso". A reportagem pediu
então para ver as "cláusulas de
confidencialidade", mas não
houve retorno.
Sabem-se cacos dessa história. Uma escuta telefônica da
PF neste ano captou, acidentalmente, a informação de que ele
trabalharia para o frigorífico
Minerva, de Barretos (SP) - o
que Dirceu confirmou, indiretamente, numa entrevista à revista "Playboy".
No ano passado, Dirceu esteve na Bolívia a bordo de um jato contratado pelo empresário
de siderurgia Eike Batista. Em
abril, um jornal do Tocantins
informou que Dirceu circulou
durante três dias na região
num jato Cessna Citation registrado em nome de uma empresa de táxi aéreo de Fortaleza. Segundo contas da senadora Kátia Abreu (DEM-TO), que
pediu esclarecimentos, a viagem teria custado não menos
que R$ 200 mil.
Na entrevista à "Playboy",
Dirceu negou fazer lobby no
governo: "No fundo, o que eu
faço é isso: analiso a situação,
aconselho. Se eu fizesse lobby,
o presidente saberia no outro
dia. Porque no governo, quando eu dou um telefonema, modéstia à parte, é um telefonema! As empresas que trabalham comigo estão satisfeitas.
E eu procuro trabalhar mais
com empresas privadas que
com empresas que têm relação
com o governo".
Dirceu toca duas empresas
ao mesmo tempo, uma de consultoria e outra de advocacia,
ambas na Vila Mariana, em São
Paulo. Divide a segunda com a
advogada Lilian Ribeiro. Passa
pouco tempo nos escritórios.
O presidente do Irib (Instituto de Registro Imobiliário do
Brasil), Helvécio Duia Castello,
é dos poucos a divulgar na internet que manteve encontro
com Dirceu. Disse que foram
cerca de 20 minutos, no escritório da rua Sena Madureira.
Castello, filiado ao PT do Espírito Santo, foi deputado federal
entre 1991 e 1994.
O Irib retirou de sua página
na internet a menção ao encontro. O instituto define-se
como uma entidade sem fins
lucrativos que tem como objetivo "o estudo e a pesquisa de
procedimentos e normas jurídicas referentes ao registro de
imóveis e o assessoramento de
autoridades públicas e órgãos
governamentais".
Não há relatos de que Dirceu
passe muito tempo em Vinhedo - em novembro, o ex-ministro disse à Folha que ficava
"a maior parte da semana" na
cidade. A ausência é referida no
boletim de ocorrência lavrado
para apurar furto ocorrido em
sua casa em novembro de 2005
- Dirceu deixara a Casa Civil
em 23 de junho daquele ano,
após as denúncias do mensalão
feitas pelo ex-aliado e ex-deputado federal Roberto Jefferson
(PTB-RJ).
A empregada da casa de Dirceu disse à Polícia Civil que os
ladrões arrombaram uma janela e levaram uma TV com tela
de plasma, charutos, medalhas,
chocolates, um tapete vermelho", além de tentarem carregar um aparelho de som, que
acabou abandonado no jardim
da casa. O dado revelador é que
tudo estava embalado na casa,
intocado, havia mais de dois
meses, junto com aparelho de
microondas, sofá e cama.
Dirceu comprou o terreno
em Vinhedo em dezembro de
2001, por R$ 50 mil. Escolheu
um dos condomínios mais distantes e isolados, a cerca de 10
km do centro. Construiu a casa
nos dois anos seguintes.
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