São Paulo, Domingo, 19 de Setembro de 1999
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REVISTA DA FOLHA
Netos e filhos ensaiam primeiros passos
Cenário político atrai herdeiros

PAULO SAMPAIO
da "Revista da Folha"

Todo mundo já ouviu falar de Antonio Carlos Magalhães, Fernando Collor, Jânio Quadros e José Dirceu. Pelo menos, é isso que esperam os personagens desta reportagem. Eles são herdeiros desses homens e ensaiam os primeiros passos na vida política.
Mas, será que basta ser filho, ou neto? "É possível aprender política por osmose, pela vivência familiar, mas o poder não "passa" assim. Precisa ter luz própria", diz o cientista político Gildo Marçal Brandão, professor da USP.
Antonio Carlos Magalhães Neto, 20, assessor político da secretaria da Educação da Bahia, é eloquente, adora um discurso e abusa de expressões como "povo da Bahia", "razão de ser" e "força". Recentemente eleito presidente do PFL jovem, renunciou com receio de ser acusado de favoritismo. Seu próximo passo é disputar uma vaga de deputado estadual.
"Adoro um discurso. É o melhor momento", diz ACM Neto, após desfazer o laço de fita branco, na inauguração do laboratório de informática de uma escola em Conceição da Feira, cidade de 24 mil habitantes a 124 km de Salvador. Foi recebido com uma salva de morteiro, faixas e duas fanfarras entoando sucessos.
Ele não reclama do peso da "grife" ACM. "Meu avô é meu grande professor, é quem vai me passar a experiência de toda uma vida. É em quem eu acredito politicamente, e quem vai me dizer quais os nortes que devo tomar."
Arnon Affonso de Mello Neto, 23, filho mais velho do ex-presidente Fernando Collor, faz o estilo "menino simples". Mas, desde que chegou de uma temporada de estudos na Suíça e nos EUA, há dois meses, o garoto loiro, alto, 1,92m, 90kg é considerado "o galã das Alagoas".
Exatamente como seu pai há 26 anos, ele foi eleito neste mês presidente do Centro Sportivo Alagoano, CSA, clube de futebol mais popular do Estado. Sobre seu futuro político, Arnon é evasivo: "O que tiver de ser, será."
"As pessoas precisam de mim em Maceió", afirma explicando porque preferiu morar na cidade em vez de viver no Rio de Janeiro com a mãe, a socialite Lilibeth Monteiro de Carvalho.
No espectro político, ele não se considera "nem direita nem de esquerda", mas teria votado em Ciro Gomes na última eleição. Sobre o impeachment de seu pai, tem a convicção de que foi a "direita" a responsável. "Fidel Castro me disse uma vez que meu pai era o verdadeiro socialista do Brasil. Nunca esqueci essas palavras."
Jânio John Quadros Mulcahy, 26, é o que mais assume o sobrenome famoso: mudou o nome para Jânio Quadros Neto, a fim de atrair votos. "Meu nome é uma mídia e tanto. A questão agora é fazer os janistas saberem que eu existo", diz "Janinho" ("sempre me chamaram assim").
Quando perguntam se ele transita bem pelo poder, a resposta vem ilustrada. Janinho saca de um envelope fotos dele em companhia de vários chefes de Estado.
Ele diz que pretende se candidatar pela segunda vez a um cargo público. Na primeira, em 94, para deputado estadual, ele obteve apenas 5 mil votos. Filiou-se ao PMDB de Orestes Quércia, mas diz que abandonou a candidatura no meio. "Não apareci nem no horário político." Quase foi expulso do partido quando deu uma entrevista apoiando Covas e Fernando Henrique, do PSDB.
Depois de sete anos em Londres, onde se formou em economia, Janinho está há um ano no Brasil. Ele é evasivo ao explicar o que faz em São Paulo. "Vivo de free-lances. Ajudei o governador de Utah em uma visita ao Brasil. Presto também assessoria a empresários americanos que querem se instalar aqui", diz.
José Carlos Becker de Oliveira e Silva, 21, o Zeca, filho de José Dirceu, presidente nacional do PT, é o mais "tranquilão" dos "filhos dos homens". Vivendo em Cruzeiro do Oeste, uma cidade de 24 mil habitantes no interior do Paraná, ele planeja se tornar vereador para deixar o "lugar mais bonito e com mais empregos". Não fala, por enquanto, em socialismo ou em planos políticos mais ambiciosos. "Quando vou para São Paulo, não aguento ficar nem uma semana", diz.
A iniciação política de Zeca foi com a mãe, a comerciária Clara Becker, 59, que se candidatou duas vezes a vereadora ("não me lembro o partido"). Clara se separou de Zé Dirceu quando Zeca tinha 3 anos.
"Eu era adolescente e a acompanhava nas reuniões do partido, uma coalisão do PDT com o PFL", conta Zeca. "Foi ali que eu percebi que estava tudo errado. Acabei convencendo minha mãe a desistir e a não votar neles." Em 1994, ele resolveu aderir ao partido do pai.


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