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Frases revelam as razões
da ira contra o presidente
MARIO CESAR CARVALHO
da Reportagem Local
"Ele desvalorizou os pobres".
Note bem: não foi a moeda, o real,
que ele desvalorizou; foram os
pobres. Ele é FHC. A autora da
frase, síntese do inferno astral do
presidente, tem 55 anos, mora em
Ribeirão Preto (SP), dita "a Califórnia brasileira" pelos índices de
prosperidade que exibe, tem renda familiar entre R$ 273 e R$ 408,
não concluiu o primário, votou
em Lula (PT) nas últimas eleições
e acha "péssimo"o governo de
Fernando Henrique Cardoso.
A frase de dona M. -vamos
chamá-la assim porque o anonimato em pesquisas é inviolável-
faz parte dos 3.771 questionários
do Datafolha sobre a avaliação de
FHC. Aqui, não há números; só
frases. Elas seguem a proporção
dos índices da pesquisa: oito
(56%) são dos que acham FHC
ruim/péssimo, quatro (27%), regular, e duas (13%), ótimo/bom.
Todos os clichês que se repetem
sobre o presidente -é frouxo para mandar, é teleguiado por ACM
e pelo FMI, privilegia os ricos e
despreza o social- grudaram à
sua imagem, demonstra a pesquisa. FHC virou o clichê.
Traição e ira
Não é só entre os eleitores de
Lula, como Dona M., que FHC está mal. Há uma certa unanimidade na imagem negativa -ela independe de níveis de renda, escolaridade, sexo e crença política.
Os próprios eleitores de FHC
consideram-se traídos. "Ele mentiu dizendo que haveria emprego
para todos e veja a atual situação...
Está uma merda!", diz um homem de 30 anos de Curitiba (PR),
cuja renda familiar é inferior a R$
272. Ele votou em FHC em 1998 e
pretende anular o voto em 2002.
"E a gente? Cadê o emprego pra
gente trabalhar?", pergunta uma
mulher de 55 anos de Acaraú, no
litoral do Ceará, com renda familiar abaixo de R$ 272. Após decepcionar-se com FHC, diz que votará em Ciro Gomes (PPS) em 2002.
"Ele é falso e hipócrita", avalia
uma eleitora de 31 anos de Itacoatiara (AM). Ela votou em FHC e
hoje dá nota zero para o seu governo. Diz que votará em Lula.
No outro extremo do país, em
Pelotas (RS), uma mulher de 32
anos, também eleitora de FHC,
diz sentir-se traída: "Ele prometeu mundos e fundos na campanha e não fez nada. Foram só promessas de campanha". Ela planeja votar em Lula em 2002.
Os eleitores de FHC que estão
no topo da pirâmide econômica
não têm uma visão muito melhor
do presidente. "Ele não deixa os
empresários investir no
país", resume um paulistano de 36 anos, com
curso superior e
renda familiar entre R$ 2.721 e R$
6.800.
O desemprego, anos-luz à frente, e a volta do fantasma da inflação são as principais razões listadas para se reprovar FHC. O
maior trunfo do presidente -a
estabilização de preços - já não
exerce o mesmo fascínio.
"Esse Plano Real faz as pessoas
perderem o emprego e só aumenta a inflação", diz uma mulher de
42 anos de Jaboatão, na região
metropolitana de Recife. Ele cravou FHC na eleição de 1998 e planeja votar em Ciro no próxima
disputa presidencial.
"Antes, ele tinha o poder de iludir o povo. Agora, não consegue
mais enganar ninguém. A inflação já está subindo", diz um eleitor de Lula de Agudos, no interior
paulista, que vive com uma renda
familiar inferior a R$ 272.
Viagens e indiferença
A síndrome de Viajando Henrique Cardoso, o personagem do
programa "Casseta & Planeta",
também colou à imagem do presidente. FHC é visto como um
"bon-vivant" alheio às agruras do
cotidiano. "Ele só viaja e não sabe
nada dos problemas da nação.
Por exemplo: a inflação. Ele diz
que não existe, mas a gente tá vendo os preços subirem", diz um
eleitora de São Paulo (SP).
Na lista das causas do desemprego entram itens plausíveis ("juros altos", "impostos exorbitantes") e outros quase paranóicos. A
tal paranóia, mesclada com xenofobia, aparece quando os eleitores
comentam a venda de estatais para empresas estrangeiras.
"Ele está vendendo as empresas
do Brasil para outros países e isso
gera desemprego. As empresas só
contratam pessoas de outros países para trabalharem aqui", acredita uma mulher de 25 anos de
Carapicuíba, na Grande São Paulo. Ela vai de ACM em 2002.
FHC falou tanto que investiria
na área social que as cobranças
voltam como um bumerangue
sobre ele. Cobra-se de tudo: saúde, educação, aumento nas aposentadorias, redução da violência
e casas populares.
"Ele deixou os pobres esquecidos. Só se preocupa em pagar juros aos banqueiros", diz um eleitor de FHC de 41 anos de Curitiba.
Para um presidente que já teve
47% de índice de ótimo e bom,
em dezembro de 1996, até os elogios soam xoxos. Uma eleitora de
FHC de Vilha Velha, que acha o
seu governo bom, pondera: "Pelo
menos o país não afundou".
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