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INCONSCIENTE ELEITORAL
A guerra das estrelas
MARCELO COELHO
Em tempos de paz e amor, o
certo seria Lula convidar Regina Duarte para tomar um chá
ou cafezinho e explicar-lhe afavelmente que o PT, bem, não há
nada o que temer etc. -e depois
disso torcer para que o episódio
fosse esquecido.
Ao contrário, não me pareceu
das mais tranquilas a reação petista ao discurso de Regina Duarte. Houve, não apenas medo, mas
um movimento de quase pânico
nas caixas de correio eletrônico,
depois da aparição da atriz no
horário eleitoral. O que haveria a
temer no que ela disse?
A tática de associar um eventual governo Lula com um retrocesso no combate à inflação, para
não falar em crises mais sérias como as da Argentina e da Venezuela não é nova, e foi tentada
anteriormente. Foi comum nas
declarações de autoridades, de investidores, de banqueiros. Na
prática o clima foi de medo também: passamos os últimos meses
assistindo ao crescimento do "risco Brasil", a frenéticas elevações
do dólar, e à quase unânime certeza entre os "formadores de opinião" de que só uma vitória de
Serra haveria de serenar o ambiente.
Reconhecendo isso, a resposta
do PT foi no sentido de "tranquilizar os mercados" o máximo possível. E de aplacar os medos da
classe média também. Ninguém
mais prudente, imagino, do que
um empresário mineiro do setor
têxtil, como José Alencar, o vice de
Lula. Só se ele fosse dono de uma
fábrica de guarda-chuvas. Talvez
o raciocínio seja o de que a chuva
é inevitável, das mais fortes, e que
não havendo nenhum guarda-chuva disponível, que pelo menos
esteja garantido o abastecimento
de toalhas.
A euforia em torno da alta votação de Lula, além do interesse
do próprio "establishment" financeiro em garantir a transição,
fez com que ficassem meio recalcadas as inquietações e temores
em torno de uma vitória petista.
Mas o sentimento é real, e considero legítimo expressá-lo.
Principalmente porque na
maior parte do tempo, e sobre a
maior parte dos assuntos, Lula
não diz nada de concreto. E foge
do debate, sim, como não cansa
de assinalar a propaganda serrista.
Acho que é nesse ponto que a
presença de Regina Duarte no horário eleitoral representa um baque para o PT.
Pois o mundo do "Lula paz e
amor", a construção deliberada
de uma imagem adocicada do
candidato, o script da mãozinha
dada, do casal romântico, do creme de amêndoas, da conciliação
política e do desenvolvimento
econômico, a proposta de "reunir
todo mundo em volta de uma mesa" -que é onde começa e acaba
quase tudo o que Lula tem a dizer
a respeito do que lhe perguntarem-, bem, este mundo, construído pelo marketing, é o mundo
da telenovela. É o mundo de Regina Duarte. O marketing de Lula
quis ocupá-lo.
A tola e grossa resposta de Lula
ao episódio -de que o medo de
Regina Duarte é de ser substituída por uma atriz mais jovem-
talvez indique secretamente a
sensação de que ambos, afinal,
disputam o mesmo público.
Serra continua a ter poucas
chances nesse concurso de beleza.
Mas a inquietação petista é, sem
dúvida, eloquente. O clima de
conto de fadas, de emoção folhetinesca e lágrimas globais em que
transcorreu a campanha de Lula
vai se dissipando.
Medo? Pode não haver medo de
perder a eleição, mas é natural
que se tenha também medo de
ganhar. Na dúvida entre um medo e outro, pode-se também ter
medo de debates. Por que não?
MARCELO COELHO, colunista da Folha,
escreve aos sábados
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