São Paulo, terça-feira, 19 de outubro de 2004

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JANIO DE FREITAS

Honra ao demérito

Ex-prefeito bem apreciado no exercício do cargo, Raul Pont abre o jogo: é a decepção com o governo Lula, por parte do eleitorado, que explica a sua dificuldade de confirmar, agora, o favoritismo lógico e demonstrado no primeiro turno pela Prefeitura de Porto Alegre. Algum petista chegaria, inevitavelmente, à sinceridade de expor em público o ponto de vista de muitos, inclusive ou sobretudo em São Paulo.
Os nove pontos de vantagem com que Raul Pont bateu José Fogaça, ex-PMDB e neófito do PPS, transformam-se em 12 pontos de desvantagem. Justifica-se a estranheza de Pont com a surpreendente (segundo Fogaça, também) rapidez de virada tão grande, na pesquisa Ibope. Pont observa, porém, que aparece com percentual que corresponde à sua votação no primeiro turno. Assim sendo, os números de Pont e suas observações se confirmam e completam:
"Não dá para negar que havia expectativa e esperança de soluções mais rápidas do governo para os problemas do país. Isso é o que as ruas estão dizendo." Ou seja, a decepção com o governo Lula reduz o eleitorado de Pont ao petismo incondicionalmente fiel, e lhe nega as condições, nem se diga para colheitas invasoras, mas para preservar o seu apoio eleitoral passado.
Se estudados com menos superficialidade do que até agora, os resultados eleitorais ainda acabam levando ao reconhecimento de que Antonio Palocci foi a grande figura nas eleições pelo país afora. A surra levada pelo PT no Rio -na cidade e no Estado- a ele é devida em grande parte: quando menos, por ser surra, e que surra, onde Lula obteve igualados 80% dos votos. É provável que em pouco se declarem muitos outros candidatos e lugares que justificam um busto de Palocci erguido pela oposição.

Incógnita
Um argumento que petistas têm brandido em favor de Marta Suplicy, como razão que supera todos os possíveis motivos de restrição ou indiferença à sua reeleição, é o fato de que teve a maior votação nas áreas eleitorais mais pobres de São Paulo, no primeiro turno.
O que aconteceu em tão pouco tempo, de lá para cá, além da natural complicação do eleitorado paulistano, talvez o menos compreensível nas eleições passadas?
Nos desdobramentos do Datafolha de domingo, Marta não tem mais a preferência dos eleitores mais pobres, tanto se considerados por níveis salariais como pela escolaridade, que é um claro indicador de nível socioeconômico.
A causa da virada não deve estar no debate mais recente, cujos índices de audiência parcial ou integral não parecem suficientes para tamanho efeito. O horário de propaganda, por sua vez, estava apenas recomeçando, sem produzir reflexos. É certo que, na última semana, Marta perdeu quase todos os votos de bancários que tivesse, mas em número que não bastaria, em princípio, para a inversão constatada pela pesquisa.
Estas eleições estão ficando mais interessantes do que prometiam. E, sobretudo, mais sutis do que as consideraram as análises dos "cientistas políticos" depois do primeiro turno.


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