São Paulo, quarta-feira, 19 de outubro de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ A HORA DE DIRCEU

Petista diz que não é corrupto, insiste que não há provas contra ele e que é vítima de um julgamento político e volta a atacar imprensa

Relatório é produto de "má-fé", ataca Dirceu

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BRASÍLIA

O deputado José Dirceu (PT-SP) reagiu irritado ao relatório de Júlio Delgado (PSB-MG) pela sua cassação, dizendo que ele é produto de "má-fé". Antes, em sua defesa no Conselho de Ética da Câmara, disse: "Não sou corrupto". E que não iria fugir das responsabilidades como muitos fugiram. "Eu não fujo."
"Acredito que o voto do relator continua na linha de buscar uma prova para me cassar. Ou seja, me condenaram, buscam uma prova. Na verdade, é um voto de má-fé", declarou Dirceu depois da leitura do parecer. Mais tarde ponderou que "respeitava" o trabalho de Delgado.
Antes de conhecer o parecer, Dirceu apresentou uma defesa oral no conselho, procurando transformar as acusações que pesam contra si em um julgamento político do governo e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Sem citar nomes, Dirceu insinuou que membros do alto escalão do governo têm responsabilidade política pela crise no PT, mas não a assumem.
"O que está em jogo é o PT e o governo do presidente Lula e não apenas as denúncias de corrupção e/ou de utilização de recursos irregulares. [...] Sei da minha responsabilidade política. Muitos fugiram, eu não fujo", disse Dirceu, falando de improviso e pausadamente ao plenário do conselho por cerca de 15 minutos.
Para reforçar sua linha de raciocínio, o deputado traçou um paralelo entre o momento atual e ações anteriores para derrubar governos democráticos. O petista citou o "mar de lama" que derrubou Getúlio Vargas (1954), a cassação do ex-presidente Juscelino Kubitschek (1956-60) pelo regime militar e a derrubada de João Goulart (1964).
"De certa maneira estamos revivendo outros períodos da história do Brasil. Eu lia hoje [ontem] o discurso que Juscelino fez antes de ser cassado pela ditadura militar. O Brasil viveu momentos como esse contra o Getúlio Vargas, no "mar de lama". O golpe de 64 foi dado contra a corrupção e a subversão", afirmou.
Ao detalhar sua responsabilidade política, Dirceu disse que se restringe aos atos praticados enquanto esteve na direção do PT. Mas ele se recusa a responder por qualquer coisa que tenha ocorrido com o partido no período em que esteve na Casa Civil.
"Eu fui presidente do PT, sou responsável pela sua construção nos últimos dez anos, pela eleição do presidente Lula. Mas não pelos atos que a direção do PT tomou após dezembro de 2002, quando deixei a Executiva."
A fala, em certos momentos, foi contraditória. Primeiro o ex-ministro reclamou de ter sua vida "devassada" nos últimos 150 dias. Depois, disse que a experiência tem sido uma das melhores coisas que já lhe aconteceu, porque permitiu a ele fazer uma autocrítica e enxergar erros cometidos.
"Nada melhor me aconteceu, por incrível que pareça, do que os 150 dias deste processo, porque posso fazer um exame de consciência dos erros que cometi na minha vida recente. Sei que não foram poucos, mas nenhum que diga respeito à quebra de decoro parlamentar", afirmou.
Ele também recorreu a uma certa dramatização, como quando comparou sua situação à de uma vítima de racismo. "Cassação por razões políticas é a mesma coisa que cassação por cor, raça, etnia, religião, ideologia."
Dirceu aparentou tranqüilidade desde a hora em que entrou no plenário do conselho para acompanhar a sessão. No começo estava disposto a não falar, mas mudou de idéia. Relaxado, cumprimentou deputados e deu até um caloroso abraço em Delgado.
Ele só se alterou um pouco ao falar da imprensa. Disse que foi transformado "da noite para o dia" em chefe de quadrilha e mostrou-se magoado ao ser chamado de "Maluf da esquerda", em referência ao ex-prefeito de São Paulo Paulo Maluf.
"Não posso ser linchado como fui por grande parte da imprensa. Não há precedente na história do Brasil recente do que está acontecendo comigo. [...] É verdade que tenho tido a oportunidade também do contraditório. A opinião publicada não pode prevalecer sobre a opinião pública, nem sobre a consciência dos deputados." (FÁBIO ZANINI E SILVIO NAVARRO)

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