São Paulo, quarta-feira, 19 de outubro de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ HORA DAS CASSAÇÕES

Quase metade dos 14 parlamentares sob processo tem chance de manter mandato; conselho cogita arquivar imediatamente casos sem provas

Seis deputados podem escapar da cassação

RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Pelo menos 6 dos 14 deputados que sofrem processo de cassação do mandato acusados de envolvimento com o "mensalão" têm chances de serem inocentados pelo Conselho de Ética da Câmara, que cogita até arquivar alguns casos imediatamente sob o argumento de ausência de provas.
Sob pressão de vários dos acusados, o conselho sorteou ontem 11 deputados para relatar os novos processos. Escolhido para dar parecer em relação ao caso de Pedro Henry (PP-MT), o deputado Orlando Fantazzini (PSOL-SP) admite propor o arquivamento já no início se não constatar provas.
"Isso [arquivamento imediato] vale para qualquer caso. Se não há provas, não há por que levar o processo adiante, apenas por levar. Há que ter o mínimo de provas para que se possa levar adiante a investigação", diz Fantazzini.
Além de Henry, os deputados que podem escapar da cassação segundo a avaliação reservada de membros do conselho e dos líderes partidários são: Sandro Mabel (PL-GO), Romeu Queiroz (PTB-MG), Professor Luizinho (PT-SP), Vadão Gomes (PP-SP) e Wanderval Santos (PL-SP).
Parte dos integrantes do conselho adota a tese de que não há provas de que esses deputados tenham sido beneficiados pelo dinheiro arrecadado por meio do esquema montado pelo PT em parceria com o publicitário Marcos Valério de Souza.
Henry é o exemplo mais citado. Apesar de ter sido líder da bancada do PP durante a época em que o partido teria se beneficiado do suposto "mensalão", contra ele por enquanto só pesa a palavra do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), que o aponta como um dos integrantes do esquema.
O pepista foi pessoalmente ao conselho assinar a notificação. Disse que quer ver seu caso julgado logo e que não solicitará que sejam ouvidas testemunhas de defesa. "O importante para mim é fazer isso logo. Testemunha para rebater prova que não existe? Para quê?", argumentou antes de se reunir com Fantazzini para acertar a data de apresentação de sua defesa, que deve acontecer hoje.
Sobre Vadão, que teria recebido R$ 3,7 milhões, o argumento é que não há provas do repasse. Contra Mabel, há a palavra de Jefferson, de que ele teria participado do "mensalão", e da deputada licenciada Raquel Teixeira (PSDB-GO), que teria recebido proposta em dinheiro de Mabel para trocar o PSDB pelo PL.
Queiroz teria intermediado um repasse dos recursos de Valério a pedido do PTB. Luizinho e Wanderval afirmam que não tiveram responsabilidade nem conhecimento da ação de seus funcionários, que teriam recebido recursos de Valério a pedido dos partidos.
O arquivamento de parte dos processos que pode estar sendo montado já causou reação. Um grupo de integrantes do conselho -que é formado por 15 deputados- já busca apoio para o caso de ter de derrubar no voto algum parecer pela absolvição que considerem suspeito. "Todos os deputados que renunciaram sabem do rigor com que os processos são tratados no conselho. Por isso renunciaram", disse o presidente do órgão, Ricardo Izar (PTB-SP).
Ele disse que quer acelerar todos os processos (o prazo limite é de 90 dias) para finalizá-los até 20 de dezembro. Caso isso não ocorra, o deputado afirmou ter o compromisso do presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PC do B-SP), de que a Casa será convocada extraordinariamente em janeiro, sem o pagamento de salário extra.
Relatório parcial das CPIs do Correio e do Mensalão apontou 19 deputados como suspeitos de envolvimento com o escândalo. Quatro renunciaram antes da abertura dos processos -Valdemar Costa Neto (PL-SP), Carlos Rodrigues (PL-RJ), José Borba (PMDB-PR) e Paulo Rocha (PT-PA)- para escapar à inelegibilidade até 2015 que uma possível cassação acarretaria. Jefferson (PTB-RJ), autor das denúncias, foi o único cassado até agora.

Relatores
Na sessão do conselho realizada ontem, sete relatores de partidos de oposição foram escolhidos por sorteio para analisar acusações contra governistas. O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP), por exemplo, terá como relator de seu processo o deputado Cezar Schimer (PMDB-RS), antipetista ferrenho.
"O deputado Schimer é uma pessoa muito séria e tenho certeza de que ele vai apreciar o caso com os olhos da Justiça", afirmou João Paulo, que teria recebido R$ 50 mil das contas de Valério.
A única petista a relatar um processo é Ângela Guadagnin (SP), que tem se destacado no conselho pela defesa que faz de José Dirceu (PT-SP), cujo parecer pela cassação foi lido ontem. Ela analisará o caso do líder da bancada do PP, José Janene (PP-PR), acusado de receber R$ 4,1 milhão de Valério.
Professor Luizinho foi um dos poucos que terão um relator de partido aliado -Pedro Canedo (PP-GO). "Vou esmiuçar todo o caso. Não tem inocência nem culpa a priori", disse Canedo.

Desafetos
O ponto de partida dos processos de cassação contra a maioria dos acusados de envolvimento no "mensalão" foi marcado por pressões e divergências entre os integrantes do conselho. Foi forte a tensão para que desafetos de alguns dos acusados não fossem incluídos no sorteio que definiu os relatores de 11 dos 14 processos.
Pedro Corrêa (PP-PE), o único dos acusados a ir à sessão, teria sido um dos que pressionaram para que desafetos não fossem escolhidos para analisar seu processo, segundo integrantes do conselho. No final, elogiou o escolhido, Carlos Sampaio (PSDB-SP).
A relação relator-acusado foi debatida na sessão. Chico Alencar (PSOL-RJ), que relatará o caso de Wanderval Santos (PL-SP), defendeu relação "institucional" apenas no conselho. Outra discussão se deu porque a Mesa da Câmara não incluiu nas representações os artigos da Constituição e do Código de Ética que tratam de "recebimento de vantagem indevida", a principal acusação contra os deputados. Os tucanos exigem a inclusão, decisão que deve ser tomada hoje pelo conselho.


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