São Paulo, quinta-feira, 19 de outubro de 2006

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ELEIÇÕES 2006 / SABATINA FOLHA

Lula elogia Serra e Aécio e faz críticas a Alckmin

Petista diz que relacionamento com os dois governadores eleitos é muito bom

PERGUNTA DO LEITOR - Tenho 61 anos, sou pai de quatro filhos adultos, todos com curso superior, mas com dificuldades de bons empregos ou de empreender. Como é que o seu filho conseguiu virar empresário, sócio da Telemar, com capital vultoso de R$ 5 milhões?
LULA -
Primeiro, o meu filho se associou a companheiros que já tinham produtora há muito tempo. Aqueles meninos já tinham produtora há mais de dez anos em Campinas. Eles fizeram um negócio que deu certo. Deu tão certo que até muita gente ficou com inveja. Tentaram investigar, ver se tinha coisa ilegal, incluir na CPI, fizeram um monte de coisas. Para a minha surpresa, quem saiu na defesa do meu filho foram aqueles que eu pensava que eram meus inimigos, como o Di Genio [João Carlos Di Genio, proprietário da Mix TV e de rede de ensino], por exemplo, mostrando não só a qualidade dos produtos que eles fazem como o nicho de mercado que eles ocupam. E se alguém souber de alguma coisa que meu filho tenha cometido de errado, é simples: o meu filho está subordinado à mesma Constituição a que eu estou. Porque deve haver um milhão de pais reclamando. Por que meu filho não é o Ronaldinho? Porque não pode todo mundo ser o Ronaldinho.

FOLHA - Mas não é mais fácil ser o Ronaldinho quando você é filho do presidente, tem as portas abertas?
LULA -
Não é mais fácil, pelo contrário, é muito mais difícil. E eu tenho orgulho porque o fato de ser presidente da República não mudou um milímetro o hábito dos meus filhos.

FOLHA - O sr. entende que os mensaleiros, por terem sido reeleitos, foram anistiados pela população? É necessária a renovação do PT? Na Itália, a Operação Mãos Limpas implodiu o sistema partidário.
LULA -
Aqui vai ter que implodir. Aqui nós vamos ter que fazer um novo sistema partidário, pelo bem da democracia. Tem gente que vende a idéia de que o financiamento público é ruim. É melhor, porque é a forma mais honesta de fazer uma campanha política. E tornar crime inafiançável a contribuição financeira de empresários. O povo votou em quem votou porque acreditou que a pessoa era inocente. Eu espero que essas pessoas, tendo recebido do povo brasileiro uma espécie de "habeas corpus", façam jus a isso e tenham um comportamento irretocável daqui pra frente.

FOLHA - Se o sr. for reeleito, o que vai acontecer com o PT, se depender do sr.?
LULA -
Faz tempo que eu deixei de ser presidente do PT, faz 13 anos. Mas eu acho que o partido precisa passar por uma reciclagem. Eu espero que, ao terminarem as eleições, a direção convoque um encontro extraordinário, chame os nossos governadores eleitos, os deputados eleitos, que chame os movimentos sindicais e sociais participantes e rediscutam qual será o papel do partido, qual será a direção, porque não pode continuar como está. O PT cresceu demais.

FOLHA - O sr. acha que a turma de São Paulo atrapalha, como disse o governador eleito Marcelo Déda?
LULA -
Nós temos um hábito, que não é só do PT, mas também do PSDB. Os dois padecem da mesma deficiência, do núcleo de São Paulo determinar a política nacional. O PT tem que botar na cabeça que virou um partido nacional. A direção tem que representar a massa de heterogeneidade que tem no país. E colocar gente nova.

FOLHA - Essa "despaulistização" do PT e do PSDB tornaria mais fácil um entendimento entre eles?
LULA -
Eu tenho uma relação com o Serra infinitamente melhor do que com o Alckmin. Eu tenho uma relação com o Aécio que eu considero extraordinária, como amigo, como político, sabendo que estamos em partidos diferentes. É como se ele tivesse ido a um baile num lugar e eu a um baile em outro. Agora, nós gostamos de dançar e temos muitas afinidades.

FOLHA - E o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso?
LULA -
A minha relação com o Fernando Henrique sempre foi muito boa, mas ficou truncada. Eu acho que ele falou demais como ex-presidente. Eu fui conhecê-lo quando ele era um jovem voltando para o Brasil com a ambição de ser candidato a senador. E eu tomei a iniciativa de procurá-lo para fazer a campanha dele no ABC.

FOLHA - Entre os seus aliados, o sr. tem figuras polêmicas como Jader Barbalho (PMDB-PA), Renan Calheiros (PMDB-AL), Geddel Vieira Lima (PMDB-BA). Não incomoda ter o PMDB como um parceiro preferencial no início do segundo mandato?
LULA -
Você pode gostar ou não. As forças políticas que existem no Brasil são essas. Não existem outras. Tem o PMDB, PFL, PSDB, PDT, PT, PC do B, PP, PL, PTB. Foi isso que se conseguiu criar depois que houve a abertura política. Você trabalha com o que existe no Congresso.

FOLHA - Como está esse diálogo com o PSDB?
LULA -
Eu disse e vou repetir pra vocês que eu tenho uma boa relação com o governador José Serra, que não é de hoje. Eu tenho uma boa relação com o Aécio. É uma relação política, de pensamentos próximos, com divergências em nuanças que podem ser consertadas. O Serra é uma figura mais cosmopolita do que o Alckmin, tem uma dimensão nacional maior. É um político mais experimentado. O Aécio é um político muito esperto, se dá bem com todos os nossos governadores eleitos. Então nós vamos ter um outro clima mais favorável para conversar neste país. E com um agravante: quem está preocupado com 2010 são eles, não eu. Eu vou estar mais tranqüilo.

FOLHA - É possível que o sr. esteja num eventual palanque do Serra ou do Aécio em 2010?
LULA -
Não. Primeiro porque eu acho muito cedo qualquer cidadão brasileiro ficar vislumbrando uma candidatura para 2010. Tem muita água para passar debaixo da ponte.


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