São Paulo, domingo, 19 de novembro de 2006

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"Reforma é falta do que fazer", diz Leôncio

Para cientista político, reforma radical não seria aprovada pelo Congresso, e uma superficial provocaria resultado inútil

Contrário ao financiamento público, intelectual defende voto facultativo e diz não ter opinião formada sobre voto com listas fechadas

DA REPORTAGEM LOCAL

"Político, quando não tem o que fazer, defende a reforma política", critica o cientista político Leôncio Martins Rodrigues, 72, que foi professor titular dos Departamentos de Ciência Política da USP e da Unicamp. Além de não apostar na votação de nenhuma reforma, ele é contra o financiamento público. (MALU DELGADO)  

FOLHA - O sr. considera necessária uma reforma política?
LEÔNCIO MARTINS
- Haveria que distinguir reformas políticas profundas, ou radicais, e reformas políticas de pequeno alcance, ou superficiais. As primeiras não seriam aprovadas e as segundas seriam inúteis.

FOLHA - O que seria uma reforma profunda e uma superficial?
LEÔNCIO
- Uma reforma profunda seria, por exemplo, a mudança do sistema proporcional para os órgãos legislativos por um sistema majoritário ou distrital. Uma reforma superficial seria reduzir o tempo do horário gratuito, a proibição ou autorização da verticalização.

FOLHA - Há reforma ideal?
LEÔNCIO
- Sistemas eleitorais são resultados de interesses de grupos, de tradições culturais, do desenho institucional do Estado [federativo ou unitário] e muitos outros fatores. Sempre que aumenta o desprestígio da classe política o tema da reforma aparece como a "mãe de todas as reformas".

FOLHA - O sr. concorda com o financiamento público de campanha, lista fechada, fidelidade partidária e cláusula de barreira?
LEÔNCIO
- A substituição da lista aberta e voto uninominal pela lista partidária fechada (bloqueada ou flexível) diminuiria a liberdade de escolha dos eleitores. Poderia dar mais consistência aos partidos, mas aumentaria o poder dos chefes partidários e reduziria a liberdade de escolha dos eleitores. Não dá para conciliar as duas coisas. Não tenho opinião sobre esse ponto. Acho melhor deixar as coisas como estão.

FOLHA - E quanto ao financiamento público?
LEÔNCIO
- Sou contra. Primeiro: é um meio de a classe política fazer com que os cidadãos paguem pela ambição política de pessoas que querem ascender social e economicamente e que dificilmente poderiam ser entendidas como representantes do povo. Segundo: tal como prevê o projeto, a distribuição dos recursos se baseará nos resultados das eleições anteriores para a Câmara. Não leva em conta as mudanças ocorridas nas disposições eleitorais posteriores dos eleitores.

FOLHA - Qual sua opinião sobre o voto facultativo?
LEÔNCIO
- Uma das causas da mazela da nossa vida política decorre da presença de um eleitorado pouco informado sobre política e desinteressado. Assim, esquece rapidamente em quem votou e fica sem informação para punir os maus políticos, especialmente nas disputas por cargos legislativos. Essa é, aliás, tarefa, difícil em nosso complicado sistema eleitoral com um número enorme de candidatos e cargos em disputa. Mas poderíamos ter escolhas melhores se os que não estão interessados não fossem obrigados a votar.

FOLHA - Como o sr. viu a proposta de Lula de discutir a reforma numa Constituinte?
LEÔNCIO
- É um factóide para desviar da questão central, que é a corrupção. O político, quando não tem o que fazer, começa a falar de reforma política.
Ele se apóia no hábito tradicional do Brasil de entender que se pode salvar a sociedade por decreto.


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