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TERRA SEM LEI
Após morte de ex-líder sindical na terça, ação militar tenta conter escalada da violência em Parauapebas
Aparato de segurança muda rotina no PA
LAURA CAPRIGLIONE
ENVIADA ESPECIAL A PARAUAPEBAS (PA)
A maior parte deles provavelmente nunca andará de avião. A
partir de ontem, entretanto, todos
os imigrantes de Parauapebas, no
sul do Pará, 90% dos quais provenientes de Estados do Nordeste,
serão obrigados a passar por detectores de metais como os que
existem nos aeroportos, e por um
pequeno interrogatório, assim
que descerem na estação de trem,
a fim de saber o que pretendem
fazer na cidade.
Também serão filmados. O objetivo: tentar conter a escalada de
violência que mata um a cada dois
dias, e que vitimou o ex-presidente do Sindicato dos Trabalhadores
Rurais do município, Soares da
Costa Neto, assassinado na terça-feira passada.
Na última sexta, o prefeito de
Parauapebas, Darci Lermen, do
PT, chegou de surpresa à estação
de trem. Acompanhavam-no cinco policiais militares. "Que tal instalar aqui os detectores de metais?", perguntou ao oficial PM.
"Quantos chegam por vez?", quis
saber o soldado. "De 500 a 1.000",
respondeu o segurança. "Então
temos de pôr mais à frente, senão
ninguém consegue descer do
trem", decretou o prefeito.
"Que tal pormos também uns
violeiros para dar as boas-vindas
a quem chega?", sugeriu Lermen.
A apenas um quilômetro da estação, enquanto isso, 45 soldados
do Exército, deslocados de Marabá e que foram enviados a Parauapebas, paravam todos os carros em trânsito por uma estrada
vicinal. Estavam em busca de armas. Espingardas velhas, trabucos. Foi tudo o que se apreendeu.
Por semana, desembarcam entre 1.500 e 3 mil pessoas na estação
de Parauapebas, o que resulta em
algo entre 78 mil e 156 mil por
ano. Ninguém sabe quantos ficam
na cidade, quantos voltam.
O trem vai e vem de São Luís, no
Maranhão, pela mesma estrada
que escoa o minério produzido
em Carajás, uma montanha de
ferro que se transformou em um
bairro de Parauapebas.
Todos os dias, dez vezes por dia,
composições de 200 vagões cada
uma saem da cidade, levando o
minério ao porto de Ponta Madeira, no Maranhão. De um extremo
ao outro, o trem chega a ter dois
quilômetros de comprimento.
Cada vagão comporta 96 toneladas de minério, o que resulta em
números astronômicos: 70 milhões de toneladas ao ano saindo
da cidade. Até 2007, a Companhia
Vale do Rio Doce quer atingir a
marca de 100 milhões de toneladas anuais, ou um faturamento de
US$ 2 bilhões.
Se exportasse o ferro com um
mínimo de processamento, transformando o minério em ferro-gusa, seria possível ampliar esse faturamento para US$ 30 bilhões.
Os números vistosos contrastam com a pobreza de quem chega à cidade. Foragidos da miséria
e da fome, os nordestinos que pegam a estrada de ferro Carajás vão
para o sul do Pará atrás das riquezas prometidas pela existência da
Companhia Vale do Rio Doce e
seu negócio mineral. Vêm sem
qualificação, muitas vezes sem
carteira de trabalho.
Nesta época do ano, os vereadores de Parauapebas recém-eleitos,
e a Câmara Municipal enche-se de
gente todos os dias. A maioria trabalhou gratuitamente como cabo
eleitoral e agora cobra a fatura dos
vereadores: quer um emprego.
Outra alternativa é filiar-se a
uma das mais de cem associações
de trabalhadores rurais existentes. Viram sem-terra. São a massa
que enche os mais de 35 assentamentos no entorno da cidade.
A boca que expele os trabalhadores em Parauapebas lembra
uma estação de metrô -concreto
aparente, limpa, funcional, sólida.
Uma raridade em Parauapebas,
cidade em que o padrão de construção, de tão precário, faz da
existência de goteiras nas casas
uma instituição municipal. A
qualidade da obra tem explicação:
foi construída pela Vale do Rio
Doce, responsável por quase tudo
o que funciona em Parauapebas.
Logo ao saírem da estação, os
migrantes deparam-se com a outra cidade. Basta atravessar a rua e
se está na vila do assentamento de
sem-terra denominado Palmares.
Ali, as casas, miseráveis, são de
pau-a-pique e sapé.
Apenas há 16 anos emancipada
de Marabá, Parauapebas já conta
mais de 100 mil habitantes (pelo
Censo 2000, são 71.568), mas toda
a infra-estrutura urbana foi pensada para no máximo 15 mil. Dos
19 bairros, apenas dois foram
construídos com algum planejamento (para variar, pela Vale). Os
demais, resultam de invasões.
Na segunda-feira passada, mais
uma invasão tentava se estabelecer na encosta de um morro.
"Isso aqui é um caldeirão saindo fumaça", diz Raimundo Nonato da Silva, que tentava se instalar
no morro. "Tem gente demais, esperança demais, frustração demais. Isso acaba em morte."
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