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Aparelho reduziu voto anulado, demonstra analista
MURILO FIUZA DE MELO
DA SUCURSAL DO RIO
O voto e o alistamento eleitoral
obrigatórios e, mais recentemente, a adoção da urna eletrônica definiram a consolidação da democracia no Brasil. A conclusão é do
cientista político Jairo Nicolau, 38,
no livro "História do Voto no Brasil" (Editora Jorge Zahar), que será lançado amanhã.
Nas contas de Nicolau, professor do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro), entre a eleição de 94 e a de 98,
quando a urna eletrônica foi adotada em cinco Estados, atingindo
58% do eleitorado, a proporção
de votos anulados (brancos e nulos) caiu de 41% para 20%.
A redução é maior do que o
crescimento do eleitorado entre
as duas eleições (12%). Em números absolutos, representa a incorporação de mais 16 milhões de votos válidos entre um pleito e outro, o equivalente ao eleitorado da
Holanda, Uruguai e Suíça juntos.
A redução dos votos anulados,
após a adoção da urna eletrônica,
relativiza a idéia de que o alto percentual de brancos e nulos é motivado por descrença política. "Há
outra justificativa, que nos envergonha como país: a grande dificuldade do eleitor de operar com
a cédula de papel", diz Nicolau.
Segundo ele, a média de votos
anulados nas quatro eleições legislativas pós-regime militar (86,
90, 94 e 98) é de 33% -a média de
outras democracias com voto
obrigatório é de 7%.
Abaixo, trechos da entrevista do
cientista político à Folha:
Folha - Seu livro passa uma avaliação positiva do processo eleitoral no Brasil. O senhor ficou surpreso com o resultado apontado pela
pesquisa?
Jairo Nicolau - Até para mim,
que tinha algum conhecimento
da nossa história eleitoral, a pesquisa foi surpreendente, porque
revelou que a tradição eleitoral
brasileira é muito mais forte do
que imaginava. É um processo de
aperfeiçoamento, paulatino, lento, tanto no sentido de tornar as
eleições mais limpas, como no de
buscar uma incorporação eleitoral da população.
Nos 180 anos de vida eleitoral
desde que o Brasil se tornou independente, só ficamos 11 anos sem
eleições para o Parlamento, durante o Estado Novo. Foram 51 legislaturas eleitas. Nesse período a
Câmara foi fechada duas vezes,
deputados tiveram seus mandatos cassados, mas, em termos de
eleições legislativas, é uma marca
excepcional.
Folha - O Brasil tem uma das mais
altas taxas de votos anulados do
mundo. Qual a razão desse percentual?
Nicolau - O índice elevado de votos anulados reflete duas questões. A primeira é a descrença no
sistema político. Mais importante, porém, é a dificuldade de grande parte dos eleitores de votar, o
que fica claro com a adoção da urna eletrônica, a partir de 1996. Em
1998, por exemplo, quando a urna
foi usada em apenas cinco Estados, houve uma redução de 52%
dos votos anulados.
Folha - A urna eletrônica, então,
incorporou um maior número de
eleitores ao processo eleitoral?
Nicolau - Entre 1994 e 1998, o número de eleitores que votaram em
algum candidato passou de 45
milhões para 61 milhões. Se pegarmos os Estados que usaram a
urna eletrônica, em 1998, a taxa
média de votos anulados ficou entre 10% e 12%. É possível que possamos replicar esse resultado em
todo o país agora, em 2002.
Folha - O comparecimento às urnas passou de 1% da população, no
Império, para 51,6% em 1998. O
que levou o país a alcançar esse desempenho?
Nicolau - A universalização do
eleitorado -com a inclusão das
mulheres, a partir de 1930, e dos
analfabetos, depois de 1985- foi
importante, mas o fundamental
foi a obrigatoriedade do voto e do
alistamento eleitoral.
Se utilizarmos como exemplo
só o universo de adultos, o percentual de comparecimento no
pleito de 1998 foi de 79%. Em cada
cinco eleitores, quatro votaram. É
um índice acima da média de todos os países democráticos do
mundo (67%).
Folha - O senhor defende a manutenção do voto obrigatório no sistema eleitoral brasileiro?
Nicolau - Sim. Foi decisivo para a
consolidação da democracia no
país. Muitas vezes essa incorporação não veio de maneira positiva,
mas pela mão do clientelismo, do
coronelismo. Mas, do ponto de
vista do envolvimento dos cidadãos nas eleições, o Brasil é um
sucesso absoluto.
Folha - Que pontos, então, deveriam ser alvo de uma possível reforma política?
Nicolau - Acho que os temas que
merecem uma discussão séria são
a fidelidade partidária, as distorções produzidas pelo atual sistema proporcional, motivadas pela
representação dos Estados e pelas
coligações, e ainda o financiamento público de campanha.
Folha - Em seu livro, o senhor
mostra que a Justiça Eleitoral, criada em 1932, tornou os pleitos mais
limpos. Agora, vemos o Tribunal
Superior Eleitoral tomar uma medida polêmica, a verticalização das
coligações. Como o senhor avalia
essa decisão?
Nicolau - Ela vai contra a história
da própria Justiça Eleitoral. Não
há, nos períodos democráticos recentes, registro de uma medida
tão intervencionista da Justiça
Eleitoral como a verticalização.
A pretexto de interpretar a lei, o
TSE ultrapassou todas as fronteiras da sua tradição e produziu um
resultado absolutamente contrário ao que esperava, porque, em
vez de nacionalizar a política,
aprofundou sua regionalização.
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