São Paulo, quinta-feira, 20 de junho de 2002

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JANIO DE FREITAS

A pista

A duvidosa história do míssil, surgida da interpretação de um nome mal pronunciado ao telefone por um preso, dá o toque de sensacionalismo sempre necessário ao jornalismo do gênero global, seja da TV ou impresso, mas não é o resultado mais importante da escuta dos celulares de traficantes presos no Rio.
Há três semanas, aqui mesmo, o artigo "A tarefa da força" ligava o crescimento da presença e da ferocidade dos bandidos à facilidade com que passaram a dispor de armamento sofisticado. "As fronteiras, vá lá, são peneiras incontroláveis, mas o armamento que entra é transportado, depositado e distribuído nos centros urbanos e suas redondezas: por que não há, nunca, descoberta policial dessa atividade e desses depósitos, como acontece com drogas?"
Embora a irrelevância atribuída a esta parte dos telefonemas gravados, nela estão algumas informações preciosas sobre a aquisição, pelos traficantes, de equipamentos especiais de comunicação e armas sofisticadas. Há citação de pelo menos um nome -Rubinho- de contrabandista. Está feita a identificação do seu ponto: age a partir da cidade de São Paulo, de onde coordena as compras no exterior, a entrada e a distribuição no Brasil. E, como ele diz, tem contato no mundo inteiro" e "é difícil [alguém" pedir uma coisa e [ele" não arrumar".
Com a apreensão dos celulares usados na penitenciária de Bangu 1, é possível, em princípio, até mesmo a identificação do telefone utilizado pelo contrabandista na conversa em que combina novos fornecimentos com um dos traficantes. A Polícia Federal e a polícia paulista igualam-se, agora, na dívida de completar a identificação do contrabandista e prendê-lo. Mas não só isso. Ele é apenas a ponta final de uma rede a ser destrinchada, cujos canais, ao que consta há muito tempo, passam por setores policiais e por burocracias alfandegárias.
A audácia da criminalidade está ligada ao seu poderoso instrumental. As fontes desse fornecimento são, forçosamente, muito menos numerosas que as de drogas. Cortá-lo -e o tal Rubinho por certo não é único- é, provavelmente, o caminho mais curto para quebrar o poder do crime ligado ao tráfico.
É indispensável uma palavra de louvor à juíza Sônia Maria Garcia Gomes Pinto e aos promotores Magno Reis, Valéria Videira, Rogério Sá e Cláudia Condak, pela maneira corajosa como honram suas funções. Em tempo: a ação da juíza e dos promotores em nada se assemelha à da juíza Denise Frossard e do então promotor e hoje deputado Antonio Carlos Biscaia, cuja ação foi essencialmente política.



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