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CELSO PINTO
Bancos podem ajudar na crise?
Em meio à confusão do mercado financeiro, semana passada, o presidente da Fiesp, Horacio
Lafer Piva, ligou para o presidente Fernando Henrique Cardoso
com um pedido e uma sugestão. O
pedido era para que o presidente
interviesse na greve da Receita
Federal, que estava prejudicando
a indústria. A sugestão era para
que o presidente conversasse com
os principais banqueiros nacionais e pedisse seu apoio para acalmar o mercado e absorver, sem
sustos, a rolagem da dívida interna.
O presidente disse que a crise
era puramente psicológica, sem
motivos econômicos concretos e
ficou de pensar na idéia de conversar com os banqueiros. Dois
outros importantes empresários
industriais estão convencidos
que, se o governo pedisse o apoio
dos três maiores bancos, Bradesco, Itaú e Unibanco, que, junto
com os bancos oficiais, detêm
uma parte muito significativa da
dívida interna, a crise sumiria.
"Graças a Deus, sobraram alguns
grandes bancos nacionais", diz
um deles.
Pelo que se sabe, o presidente
não seguiu o conselho de Piva.
Um importante banqueiro diz
que, se ele tivesse seguido, o efeito
prático seria mínimo. "Nós somos
clientes cativos do governo", argumenta. "Ele é que deveria nos
acalmar".
Os grandes bancos nacionais
não têm muita opção. Um grande
banco fez uma reunião de diretoria, semana passada, para examinar alternativas e concluiu que
não há nada substancial a fazer.
Pode-se cortar algumas linhas,
aumentar a cautela, mas o grosso
do risco continuará sendo Brasil.
A turbulência pegou os grandes
bancos com muitos papéis federais (LFTs) longos na carteira,
que passaram a ter deságios significativos. O Banco Central tem
oferecido a opção de trocar LFTs
longas por curtas, com perda de
rentabilidade. Os bancos têm assumido a perda, porque é alto o
risco de manter o papel longo.
Hoje, o deságio está entre 1 e 2%,
mas, se a eleição levar a uma crise, temem os bancos, o deságio
poderia ir a 15% ou 20%, colocando em risco o patrimônio. Ou
seja, a crise financeira se transformaria em crise bancária.
No limite, o BC será obrigado a
rolar a dívida a cada dia no
"overnight", como já fez no passado. É difícil imaginar bancos dispostos a correr o risco voluntário
de ficar com papéis longos na carteira. Só quando há espaço na tesouraria para carregar papéis até
o vencimento, caso em que o deságio não tem efeito. Mas a tendência é aceitar vencimentos de
meses, não de anos.
No caso dos bancos estrangeiros, há para onde correr. A decisão de cortar linhas e retrair atividades é tomada nas matrizes e
pode fazer sentido na estratégia
global. Isso já está acontecendo
em certa medida. Grandes bancos
nacionais estão preenchendo espaços abertos por bancos estrangeiros em linhas cambiais e de
crédito.
Um problema sério é que os
mesmos investidores e bancos que
perderam dinheiro na Argentina
têm duas ou três vezes mais investidos no Brasil. Um banqueiro
lembra que o Citibank tinha estimado o máximo de perdas com
uma crise na Argentina em US$
400 milhões. As perdas chegaram
a US$ 2,2 bilhões e vários funcionários foram demitidos. Ninguém quer correr o risco de ver a
história se repetir no Brasil.
Nesse sentido, talvez realmente
seja uma vantagem o Brasil ter
preservado grandes bancos nacionais. Na Argentina, dizia-se que o
sistema bancário era invulnerável a crises porque tinha sido internacionalizado e os bancos estrangeiros não deixariam suas
subsidiárias quebrar. O canadense Nova Scotia e o francês Crédit
Agricole já abandonaram suas
subsidiárias e a desconfiança do
investidor argentino, hoje, não
discrimina bancos locais, externos ou oficiais. No limite, pelo
menos os bancos nacionais, no
Brasil, podem evitar a aceleração
do ritmo da crise de confiança.
A saída de dinheiro dos fundos
é outra história. Está havendo
uma procura por dólares não só
por parte de grandes investidores
mas também de investidores médios. Essa desconfiança só o governo e os candidatos poderiam
tentar amenizar.
As reformas de Serra
O candidato tucano, José Serra,
pode surpreender seus adversários à direita, depois de eleito, ao
colocar na mesa, no início de seu
governo, três reformas "liberais":
tributária, previdenciária e trabalhista. Não é um tema que faça
sucesso em campanha, mas faz
parte das discussões do candidato
e seria, certamente, muito bem recebido pelos mercados.
Sobre a reforma tributária ele já
falou. A idéia é eliminar, gradualmente, os impostos em cascata e,
se possível, racionalizar o ICMS.
Na área da Previdência, uma
idéia, que o PT também tem acenado, é aprovar o projeto que já
existe transformando novos contratados no setor público em celetistas. Não resolveria o problema
do estoque de aposentadorias de
878 mil servidores, que devem gerar um déficit de 2,3% do PIB este
ano, mas pelo menos evitaria que
o problema crescesse à frente.
O INSS, que beneficia 19 milhões de trabalhadores, deve ter
um déficit de 1,2% do PIB este
ano. Uma projeção mostra que, se
a proporção de trabalhadores
com carteira assinada fosse hoje
idêntica à que existia há uma década, haveria superávit no INSS.
Uma idéia para estimular a formalização do emprego seria permitir que as empresas deduzissem
o que pagarem em CPMF do valor das contribuições trabalhistas
pagas. A reforma trabalhista iria
na direção de maior flexibilidade.
No início de março, Serra se
comprometeu com o tripé que encanta o mercado: o regime de metas inflacionárias (ao falar em
convergir a inflação, no futuro,
para 2,5%, foi mais ousado do
que a atual equipe econômica);
superávit primário de pelo menos
3,5% do PIB por vários anos; e
câmbio flutuante. Depois disso, já
aceitou elevar o superávit para
3,75% em 2003 - ou mais, se necessário. Já "convidou" Armínio
Fraga para permanecer no BC e
ele "aceitou". Topou fazer um novo acordo com o FMI. Se, além de
tudo isso, acenar com algumas reformas no início de seu mandato,
o mercado não terá o que reclamar dele.
E-mail: CelPinto@uol.com.br
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