São Paulo, domingo, 20 de julho de 2008

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ELIO GASPARI

Uma boa briga, de peixes que pescam gente


A Camargo Corrêa e a Odebrecht ameaçam brigar na Justiça pelas usinas de Santo Antônio e Jirau

UMA BOA notícia: as grandes empreiteiras Camargo Corrêa e Odebrecht ameaçam levar para a Justiça a discussão que envolve as obras das hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira. É um negócio de R$ 18 bilhões e as duas empresas lideraram os consórcios que construirão as usinas. A Odebrecht venceu em Santo Antônio e a Camargo Corrêa, em Jirau.
Como sempre, os concorrentes acusam-se de descumprimento dos editais. Habitualmente, esses assuntos são resolvidos por amigos que têm amigos nos escritórios certos. O repórter Agnaldo Brito mostrou que o primeiro tiro veio da Odebrecht, ameaçando levar Jirau para os tribunais. A Camargo Corrêa respondeu ameaçando Santo Antônio.
Estranho. Um acusa o outro de ter feito algo errado e o outro responde sacando uma malfeitoria do adversário, em outro projeto. Nesse caso, podem ser dois os malfeitos. Há ainda a possibilidade de que a Camargo Corrêa tenha acertado ao mudar o traçado de Jirau. O mesmo pode ter acontecido com as mudanças da Odebrecht. A Justiça é um ótimo lugar para decidir pendências desse tipo.
O litígio público é o melhor dos detergentes. Será uma pena se a burocracia elétrica entrar com panos quentes (aquele tipo de pano que esquenta quando vira grampo e arruína o servidor público). No pior cenário, o recurso aos tribunais é uma salva de tiros de pólvora seca, simples ameaça velada para colocar na mesa a carta da procrastinação dos projetos.
Um litígio judicial poderá adiar a obra, mas, quando o Ibama defendia o meio ambiente, todas as empreiteiras reclamavam do atraso na concessão das licenças. Agora, na defesa dos seus interesses, esqueceram a preocupação com os prazos. Nosso Guia chegou a ridicularizar as restrições criadas pelos ambientalistas "por causa do bagre".
Agora os peixes são maiores e de uma espécie rara, a que pesca gente.

O PLANALTO ESTÁ FELIZ COM 1,4 MILHÃO

A Polícia Federal localizou uma conversa telefônica de Gilberto Carvalho com Lula. Deu-se o seguinte diálogo:
- Chefe, entre janeiro e junho conseguimos 1,4 milhão, 24,27% acima do mesmo período do ano passado.
- Você acha que podemos chegar a 2 milhões até o fim do ano?
- Barbada.
- Eu achava que não conseguiríamos.
Essa conversa é falsa, inventada pelo signatário, diante de um teatro no qual os grampos tornaram-se uma modalidade preferencial de expressão. Mesmo assim, os números são verdadeiros. No primeiro semestre, a economia brasileira produziu 1,4 milhão de novos empregos com carteira assinada. Tudo indica que o ano terminará batendo a marca dos 2 milhões.
Esse expressivo resultado mostra que a vida do trabalhador melhorou com a expansão dos empregos protegidos pelas leis trabalhistas. Ficou para trás o tempo em que o governo mostrava uma ponta de orgulho com a deterioração do mercado de trabalho.
Em 1998, durante o tucanato, quando havia 2 milhões de desempregados em São Paulo, o economista Edward Amadeo assumiu o Ministério do Trabalho informando que procuraria "aumentar a empregabilidade do trabalhador brasileiro". Traduzindo: o desempregado não conseguia serviço porque tinha baixa empregabilidade. Culpa da vítima.
Um ano antes, Jorge Jatobá, assessor especial do Ministério do Trabalho, disse o seguinte: "Eu acho que o grande mecanismo de ajuste do mercado de trabalho brasileiro não foi o desemprego, foi mais a informalização".
Felizmente, a degradação do trabalho deixou de ser parte de um ajuste virtuoso.

NOVA HIROSHIMA
O comissário Tarso Genro e os çábios do Planalto conseguiram o impossível. Levaram para dentro do governo a crise do banqueiro da privataria tucana.
Algo parecido como mandar o bombardeiro Enola Gay sobrevoar Hiroshima para depois jogar a bomba Daniel Dantas em Nova York.

URUCUBACA
O ministro Gilmar Mendes deve colocar um raminho de arruda no processo de Daniel Dantas. No último dia 10, quando todo o país esperava sua decisão sobre o pedido de habeas corpus do banqueiro, a página de lançamento de despacho do Supremo Tribunal Federal informou que o HC/ 95009 havia sido "indeferido".
Outro lançamento, posterior, registrou o contrário: "deferido". Junto, esclareceram que ocorrera um "lançamento [isso mesmo] indevido de indeferimento". O STF informa que a confusão decorreu de um erro de digitação do código interno do tribunal.

ALMANAQUE
Um curioso bateu num livro onde havia uma tabela relacionando os salários dos trabalhadores da construção civil de Londres em 1800 com o preço da cesta básica de alimentação da época. Comparando esses números com os de uma aldeia rural do Malawi contemporâneo, resulta que os ingleses estavam um pouco melhor. O cidadão adaptou a tabelinha para preços e salários brasileiros de hoje. Resultou que o trabalhador que recebe dois salários mínimos (R$ 960) está num patamar três vezes superior ao da escumalha londrina de 1800.
Antes que Nosso Guia atribua essa diferença às suas iluminações, vale lembrar que desde 1800 o padrão de vida das sociedades desenvolvidas melhorou entre 10 e 20 vezes.

MÁ FAMA
A indústria de brinquedos Estrela, fabricante do velho e bom "Jogo da Vida", da marca americana Hasbro, deve presentear os filhos de seus diretores com a versão da família Simpson que mantém no mercado. Segundo a empresa, o brinquedo é recomendado para crianças com mais de oito anos.
Se o jogador cai no quadrinho onde pode comprar a "Casa do Prefeito Kuimby", aprende que "o quarto principal possui uma passagem secreta para auxiliar na fuga de amantes".
Até aí, mandaram mal, mas pegaram leve. Noutro quadrinho, a criança recebe a seguinte informação:
"Como um freqüentador da casa de má fama Maison Derriére, você tem a honra de jogar de novo".
A Estrela diz que com esse jogo sua clientela pode "vivenciar todas as experiências da família mais divertida da TV". Não deixa de ter razão, mas aos oito anos é cedo.

LIVROS SUMIDOS
O Teatro Municipal do Rio de Janeiro começou as comemorações do seu centenário com um espinho no pé. O repórter Joaquim Ferreira dos Santos mostrou que em 2002 a patuléia pagou a confecção e impressão de 39 brochuras com biografias de artistas que fizeram a glória da instituição, como o maestro Alberto Nepomuceno e a cantora Gabriela Bezanzoni. Transformaram-se em fantasmas da ópera, que aparecem aqui e ali, mas ninguém sabe onde estão.
A cobrança já completou cinco anos. Em maio passado, um caçador de livros soube que "infelizmente ainda não está liberada para a venda a coleção pela Fundação Teatro Municipal".


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