São Paulo, domingo, 20 de agosto de 2006

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ELEIÇÕES 2006 / PRESIDÊNCIA

Concessionárias driblam lei para doar a candidatos

Empresas que têm concessão do Estado, proibidas de financiar campanhas, doaram ao menos R$ 30 mi entre 2002 e 2004

Dinheiro de prestadoras de serviço público chega até campanhas políticas por empresas associadas; presidente do TSE vê fraude


RUBENS VALENTE
CATIA SEABRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Por uma brecha da lei, concessionárias do serviço público das áreas de rodovias e telecomunicações doaram ao menos R$ 30,2 milhões para partidos e candidatos no país entre 2002 e 2004 -principalmente para o PT e o PSDB.
A lei eleitoral proíbe candidatos e partidos de receber qualquer tipo de doação de concessionárias e permissionárias do serviço público.
Segundo levantamento feito pela Folha, as donas da concessão fizeram doações por meio de empresas controladoras, associadas ou controladas, ligadas à holding que detém autorização do governo de operar.
O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Marco Aurélio de Mello, disse que a lei está sendo burlada. "A rigor, nós temos uma fraude. O espírito da lei é impedir promiscuidade entre público e privado", afirmou o ministro, que analisou o assunto em tese, sem interpretar um caso concreto.
"É uma burla ao sistema", disse o advogado eleitoral e professor da Universidade de Brasília Tarcísio Carvalho.
No entender do presidente do TSE, campanhas e candidatos também deveriam recusar doações de empresas de lixo que têm contratos com o serviço público -o que as enquadra como "permissionárias".
O número de doações dissimuladas seria então muito maior. Segundo dados do TSE e do site "Às Claras", da ONG Transparência Brasil, apenas duas empresas do setor, a Vega Engenharia Ambiental e a Qualix Serviços Ambientais, doaram R$ 11,1 milhões nos anos eleitorais de 2002 e 2004, tanto para candidatos de partidos diversos como para as direções nacional e estadual de São Paulo do PT e do PSDB.
A prática das doações dissimuladas, visível nas prestações de conta das campanhas anteriores, também deverá ocorrer nas deste ano. No último dia 1º, o candidato à Presidência Geraldo Alckmin (PSDB-SP) se reuniu em São Paulo com 16 executivos de teles. Antes de sua chegada, o empresário João Dória Júnior, colaborador da campanha tucana, falou da importância de contribuir para a candidatura de Alckmin.
Como trata-se de concessionárias, João Dória recomendou que doações fossem feitas por meio das controladoras ou dos fornecedores das teles.

Pedágios
O caso das concessionárias que exploram pedágios em rodovias federais e estaduais é o financeiramente mais expressivo. Grandes e médias empreiteiras que detêm autorizações do Estado e da União para operar aparecem como doadoras oficiais de cerca de R$ 23 milhões nos últimos quatro anos.
A construtora OAS detém 32,87% das ações da CRT (Concessionária Rio Teresópolis), responsável por 156 km de rodovias no Rio de Janeiro.
A empreiteira doou R$ 4,3 milhões para a direção do PT em 2002, 2003 e 2004 e mais R$ 2,72 milhões na campanha de 2002 -incluindo R$ 550 mil para o comitê do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva.
O Grupo CCR domina 1.452 km de rodovias sob responsabilidade de seis concessionárias, incluindo a Nova Dutra, que liga São Paulo e Rio de Janeiro, e a AutoBan, no interior paulista.
O grupo é comandado por empreiteiras como a Andrade Gutierrez, por meio da sua empresa AG Concessões, e a Camargo Corrêa. Nos milhares de prestações de conta ao TSE, não há doação eleitoral do CCR.
Mas as duas empreiteiras doaram, juntas, R$ 2,7 milhões a candidatos diversos nas eleições de 2002. A de Camargo Corrêa foi feita por meio de outra empresa do grupo, a Cavo.
A empreiteira Carioca Christiani Nielsen, que detém 24% das ações da concessionária Viapar, exploradora de 546 km de rodovias no Paraná, doou R$ 1 milhão para campanhas eleitorais de 2004, R$ 400 mil para a direção do PT de São Paulo em 2003 e mais R$ 400 mil para a campanha de Luiz Inácio Lula da Silva em 2002.
Outra dona de 24% da mesma concessionária, a Queiroz Galvão doou R$ 260 mil na campanha eleitoral de 2002.
Na área das telecomunicações, aparecem doações no valor total de R$ 6,2 milhões.
A Star One, resultado de uma parceria da Embratel com uma empresa francesa, doou R$ 3,37 milhões em 2002, dos quais R$ 750 mil ao comitê de Lula.
O TSE registra ainda R$ 410 mil em doações do shopping Iguatemi, da família Jereissati, dona da La Fonte, que tem participação na companhia Telemar Norte Leste. A Andrade Gutierrez, dona da AG Telecom, volta a figurar na área das teles, ao deter 10,28% das ações da Telemar Participações.
O grupo Pirelli, dono de parte da Olivetti (incorporada à Telecom Italia), doou ao menos R$ 2,4 milhões em 2002 e 2004. Na disputa municipal, a divisão foi milimétrica: R$ 501 mil ao PSDB e R$ 500 mil ao PT.


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