São Paulo, sexta-feira, 20 de setembro de 2002

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FOLCLORE POLÍTICO

Fechar e abrir

AUGUSTO MARZAGÃO

Certos livreiros das cidades de Nova York, México, Lisboa, Paris, Madri e outras capitais estrangeiras têm mais familiaridade com o maranhense José Sarney do que muito livreiro no Brasil. É que eles recebem com bastante frequência o freguês que, além de comprador certo, incorpora o charme adicional de ser um escritor de sucesso (com imortalidade garantida pela Academia Brasileira de Letras), um político proeminente no Brasil e ex-presidente. Tudo isso constitui um somatório de boas razões para o atendimento especial que Sarney merece não só nas livrarias mais famosas como também em nichos de obras antigas e usadas só conhecidos dos que realmente amam esses santuários da intelectualidade.
O escritor Sarney não raro demora duas horas numa livraria, em busca de um alvo já escolhido ou à caça de alguma obra especial que lhe venha aos olhos aleatoriamente. Costuma pedir vários livros de uma só vez e quando ainda para ele desconhecidos faz um julgamento sumário de sua qualidade ou do seu interesse apenas folheando-os, aplica a sua técnica de leitura dinâmica. Outras vantagens ajudam o autor de "O Dono do Mar" e "Saraminda" a cumprir uma carreira de poeta e prosador que nem as piores turbulências do período presidencial interromperam: por exemplo, uma "memória de elefante" e uma capacidade de organização que tange os limites da mania.
É a propósito do turismo livreiro que se conta uma boa história do folclore sarneysiano. No final de uma sexta-feira estava o senador pelo Amapá na famosa livraria Bertrano de Lisboa e, ao verificar que não teria mais tempo naquele dia para terminar o seu trabalho de busca, perguntou ao funcionário que o atendia: "Os senhores fecham amanhã, sábado?" "Não, não fechamos, Excelência." Satisfeito, Sarney passou a despedir-se do rapaz, dizendo: "Ótimo, então voltarei aqui amanhã para completar a minha compra". O gerente da livraria, também presente, intervêm no assunto: "Lamento muito, Excelência, mas não trabalhamos no sábado".
Sarney se surpreende: "Como? Se acabo de ser informado que amanhã os senhores não fecham". Resposta conclusiva e definitiva do chefe da casa: "Sim, é verdade. Mas não fechamos porque não abrimos..."


AUGUSTO MARZAGÃO, jornalista, autor do livro "Memorial do Presente", ex-secretário particular dos presidentes Jânio Quadros e José Sarney e ex-secretário de Comunicação Institucional de Itamar Franco, escreve às sextas-feiras nesta seção


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