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São Paulo, sexta-feira, 21 de fevereiro de 2003

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CASO CC-5

Documento da PF revela que três brasileiros usaram "know-how" do Banestado para enviar dinheiro a paraísos fiscais

Laudo expõe esquema de US$ 1,7 bi de doleiros

ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
RUBENS VALENTE
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

O laudo da perícia feita pela Polícia Federal nas contas da agência do Banestado (Banco do Estado do Paraná) de Nova York (EUA), ao qual a Folha teve acesso, revela como apenas três doleiros brasileiros movimentaram US$ 1,7 bilhão em contas abertas em nome de empresas "offshore" (com sede virtual em paraísos fiscais).
Por meio de senhas e de um programa desenvolvido pela Divisão de Informática da direção-geral do Banestado de Curitiba (PR), os doleiros conseguiram, do Brasil, receber e remeter a quantia (hoje o equivalente a cerca de R$ 6,1 bilhões) para contas abertas em outros países, incluindo paraísos fiscais, ao alcance dos verdadeiros donos do dinheiro.
O valor corresponde a apenas 21 meses de movimentação no Banestado, período investigado até agora pela polícia (abril de 1996 a dezembro de 1997).
Ao todo, cerca de US$ 14,9 bilhões teriam sido movimentados na agência no mesmo período. A polícia e o Ministério Público suspeitam que a maior parte desse dinheiro se origine de atividades ilícitas, como corrupção, contrabando e narcotráfico.
Segundo o estudo da polícia, três doleiros tinham atuação direta ou indireta em pelo menos oito contas bancárias: Alberto Youssef, que atua no Paraná e em São Paulo, Sílvio Roberto Anspach, que vive em Miami (EUA), e Alexander Diógenes Ferreira Gomes, o "Alex", de Fortaleza (CE).
O laudo analisa 137 contas que tiveram maior movimentação na agência nova-iorquina do Banestado, alimentadas por milhares de remessas do Brasil feitas por contas CC-5 (para não residentes).
O documento é composto de cerca de 500 páginas e um CD com 237 arquivos, alguns deles com tabelas de até 20 mil itens - descrevendo toda a movimentação bancária, do primeiro depósito no Banestado até o beneficiário final em outras instituições financeiras do exterior.
O estudo é assinado pelos peritos criminais Renato Rodrigues Barbosa, Eurico Monteiro Montenegro e Emanuel Renan Cunha.
Os três principais doleiros, de acordo com o laudo, atuaram como procuradores em pelo menos cinco empresas "offshore" que tinham contas na agência nova-iorquina do banco, três delas sediadas nas Ilhas Virgens Britânicas e outras duas sediadas no Uruguai, ambos paraísos fiscais.
Youssef era procurador das empresas June International Corporation, que movimentou US$ 662 milhões, e da Ranby International Corporation (US$ 139,9 milhões).
Já investigado pela polícia por suposta evasão de divisas, Youssef também tem vínculos, segundo o laudo, com duas contas de pessoas físicas: a de Elias Kalil Youssef, seu irmão, que movimentou US$ 53,4 milhões, e a da sua cunhada, Maria Luzia Bazzo (US$ 21,5 milhões).

Laranja
Sílvio Anspach aparece como procurador da empresa Courchevel Investiments, com sede também nas Ilhas Virgens Britânicas, que movimentou US$ 238,2 milhões. Além disso, é relacionado pela polícia à "offshore" Drake Import Export (Ilhas Virgens Britânicas), que movimentou US$ 37,4 milhões, segundo o laudo.
O procurador que aparece nos papéis de abertura da conta é o paraguaio Elvio Cesar Gonzalvez. No entanto, a polícia encontrou junto com os documentos um fax enviado por Sílvio Anspach de Miami, onde mantém a empresa South Exchange, para o então gerente da agência do Banestado, Ércio Santos. A polícia suspeita que Gonzalvez não passa de um laranja do esquema.
As duas "offshore" relacionadas a Alexander Ferreira Gomes, do Ceará, ainda segundo a investigação da PF, movimentaram juntas US$ 575 milhões. No caso de Alex, como é chamado, os vínculos entre ele e as empresas não são tão explícitos como os dos dois outros doleiros investigados.
Ele não aparece como procurador da Blue Carbo, mas sim de uma empresa que a antecedeu, a Atlas Financial Corporation, cuja sede seria Fortaleza. Mas os peritos encontraram documentos que relacionam uma empresa à outra.
"Concluindo-se, após análise detalhada, que a Atlas Financial Corporation antecedeu a Blue Carbo com o mesmo número de conta", diz o laudo da PF.
O procurador que aparece nos papéis da conta da Nager Fidelity, "offshore" sediada no Uruguai que movimentou US$ 72,4 milhões, é um ex-funcionário de Alex numa casa de câmbios de Fortaleza, Carlos Eduardo Bechara Mussi. Localizado pela Folha anteontem, Mussi negou ter conhecimento da conta, sugerindo que possa ter havido uma fraude na abertura da conta no Banestado. Ele prestará depoimento ao Ministério Público Federal.
A atuação das duas empresas é objeto de investigação da PF de Fortaleza, que já recebeu documentos da perícia em Nova York.


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