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DOMINGUEIRA
Bancarrota Blues
MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
Editor de Domingo
De Antonio Candido a Astrid Fontenelle, da USP à MTV,
Chico Buarque de Holanda reuniu em sua estréia no Palace o
que a música brasileira é capaz
de reunir: sofisticação culta e
popular, samba e literatura,
alegria e crítica.
Foi uma estréia apoteótica,
não deixando dúvida de que será uma temporada memorável.
A volta de Chico faz um enorme bem ao ambiente. É colírio
para os ouvidos, limpeza, dissipação de poluentes. É também o
reencontro com uma história
da música popular, com um de
seus pilares, com um de seus
melhores registros e -por que
não?- um de seus sotaques
fundamentais, o do Rio de Janeiro de Tom e tantos outros. É
ótimo ouvir samba com som de
samba.
Livre da atmosfera de ato público que as envolvia em shows
de outros tempos, algumas antigas canções ressurgem revigoradas, como se mais tivessem
perdido do que ganhado com as
exacerbações da leitura politizada.
"Construção", por exemplo,
sempre foi uma obra-prima,
com suas proparoxítonas e sua
precisa engenharia poética.
Mas a releitura apresentada no
Palace a coloca em alturas que
a memória de quem há anos
não a ouvia jamais poderia
lembrar.
No capítulo da alusão política, apesar da mais recente "Assentamento", a que melhor se
sai é "Bancarrota Blues", do
disco "Francisco". Parceria com
Edu Lobo, ela reaparece estupendamente irônica neste Brasil FHC. Chico a apresenta sorridente, com uma graça sarcástica, estalando dedos para marcar o ritmo do blues e, ao mesmo tempo, aludir ao gesto que
se faz para significar grana.
É preciso rever Chico Buarque
cantando para perceber a dimensão da falta, o peso dessa
ausência de cinco anos.
Falando em Brasil FHC, não foi
Chico Buarque nem Itamar
Franco, mas Michel Camdessus,
diretor-geral do Fundo Monetário Internacional, quem disse
a um jornal francês, com todas
as letras, que a reeleição foi
uma das causas da crise do real.
Críticas semelhantes foram
feitas por um oponente do FMI,
o economista norte-americano
Jeffrey Sachs. Não são exatamente esquerdistas burros e
fracassomaníacos.
Será que o presidente tem ouvido?
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