São Paulo, terça, 21 de abril de 1998

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CELSO PINTO
O que preocupa no Brasil

O Brasil tomou algumas medidas importantes, melhorou sua situação, mas continua gerando alguma preocupação no mercado. O nível recorde de reservas, em si, não é garantia contra turbulências.
A avaliação é do professor Morris Goldstein, do Instituto de Economia Internacional de Washington, um dos mais respeitados "think tanks" do mundo. Especialista em crises bancárias e cambiais, Goldstein, que trabalhou mais de vinte anos no FMI, desenvolveu um complexo modelo de indicadores para este tipo de crises, que inclui mais de 100 variáveis.
Ele prefere não comentar que grau de risco de crise seu modelo aponta hoje para o Brasil. Comenta, de forma genérica, que o Brasil "não está numa situação que o coloca fora de preocupação, mas também não está numa situação ruim".
As reservas, hoje perto de US$ 70 bilhões, ajudam, mas não eliminam todos os riscos. "Eu não estaria confiante demais com as reservas altas como uma proteção", diz.
Obviamente, é melhor ter reservas altas do que baixas, mas elas podem sumir rapidamente. Ter muitas reservas também não é garantia absoluta contra ataques especulativos, como mostrou o exemplo de Hong Kong.
Ele argumenta que não faz sentido medir a segurança dada pelas reservas pelo número de meses de importações que elas podem garantir. Importações são fluxos que mudam devagar. Relevante é saber qual o nível de reservas em relação aos passivos financeiros contingentes, que podem ser convertidos em dólares se os investidores ficarem nervosos.
Uma forma de medir esses passivos é olhar o chamado M2, a moeda disponível nos bancos mais títulos do governo. Pode-se, contudo, refinar a medida, olhando o que o governo tem investido nos mercados futuros de dólar e outros passivos. Olhando o tamanho das reservas em relação à dívida interna do governo, que tem crescido rapidamente, o Brasil não está numa situação confortável em relação a outros países.
Outro ponto importante de preocupação em relação ao Brasil é o seu ritmo lento de crescimento recente, algo que está relacionado com a política cambial. Quando um país cresce três ou quatro anos abaixo de seu potencial, diz Goldstein, não há dúvida de que não está num padrão de crescimento sustentável a longo prazo. Sua taxa de câmbio não é de equilíbrio, ou seja, não é uma taxa que permita o equilíbrio das contas internas e um déficit externo financiável de forma sustentável, por capitais de boa qualidade.
Se um país está crescendo abaixo de seu potencial, existe um custo político embutido que será considerado pelo mercado e que pode gerar instabilidades. Hoje, o apoio político ao governo é alto, diz ele, mas se esse apoio diminuir, o país ficará mais vulnerável.
Goldstein não tem dúvidas de que "o câmbio é um item chave, um dos mais poderosos indicadores" de potenciais crises. O Brasil teve uma forte apreciação cambial no início do Plano Real, mas melhorou sua situação nos últimos anos. O crescimento abaixo do potencial indica, contudo, que o câmbio ainda não está num nível de equilíbrio.
Corrigir o câmbio, contudo, também não é simples. Se isso não ocorre em meio a uma crise, diz, se torna um problema político, porque é baixo o apoio para mudar quando a mudança é possível. Não se deve deixar o câmbio sair muito da linha porque, neste caso, não existe uma fórmula simples de mudanças. De uma forma ou de outra, contudo, a situação acaba sendo corrigida.
Os indicadores mais importantes de situações de crise, pelo modelo de Gosdstein, são: sobrevalorização cambial, recessão, grande aumento dos juros, desaceleração das exportações, baixa relação M2/reservas, queda nas Bolsas, déficit em conta corrente alto e muitos capitais externos de curto prazo em relação ao PIB.
Em todos esses casos, o que preocupa é uma mudança forte de rota em relação à tendência histórica de um país. O Brasil está confortável em relação a alguns itens e pouco confortável em outros. "Juros altos e baixo crescimento são fraquezas", lembra Goldstein.




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