São Paulo, sexta-feira, 21 de maio de 2010

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JANIO DE FREITAS

Atores e seus papéis


Dilma e Serra pretendem tomar Lula como modelo; cada qual, um dos Lulas, o da campanha e o do governo


AS BRIGAS DE Dilma Rousseff e de José Serra com os papéis que devem representar, segundo o script de sua marquetagem, remetem menos à representação do Lulinha Paz e Amor de 2002 que à do super-Collor de 1989.
Ambas bem sucedidas, a de Lula foi convincente como a de um bom ator, e se tornou um dos dois fatores decisivos de sua vitória; a de Collor foi a de um canastrão, que precisou despejar fortunas no eleitorado e contar com truques sórdidos de mídia para fazer a sua efêmera vitória.
Nesta campanha ostensiva que é ostensiva, mas não é campanha, José Serra começou por revelar capacidade, incipiente embora, de fazer-se simpático, sorridente até, e acessível sem esforço aparente. Ocorrido o primeiro deslize fora do script, Serrinha Paz e Amor deu para escapulir, com frequência crescente, do personagem para a pessoa irritada, veloz na rispidez. Ah, sim, e "perseguida" por todos e por tudo.
Já mandou repórter ir fazer pergunta a seu chefe, já viu em pergunta o propósito de difundir mentira, já exigiu a revelação de fonte de informação contestada. Para Serrinha Paz e Amor, o clima onde haja repórter, e há repórter onde quer que Serrinha esteja, já se torna tenso e típico de Serra.
É reação de Serra a situações perversas ou embaraçosas? Podem ser perguntas apimentadas, irônicas, em busca de um escorregão que será mais notícia do que a resposta preparada. Mas sem dificuldade para a resposta neutralizante e tranquila. Serrinha, porém, aceita o escorregão. Briga com o seu papel, deixa mal o personagem. Serrinha já vira Serra até por pergunta de humorista.
Diz-se que a Dilma Rousseff é que falta a tarimba eleitoral. Só a ela? Sua capacidade de tropeçar em perguntas, e em suas próprias falas, impressiona pelo teor e pela frequência. Mas não pelos motivos de José Serra, ainda que ambos enfrentem os mesmos tipos de perguntas, com as mesmas primeiras e segundas intenções, e circunstâncias muito semelhantes. Os escorregões de Dilma parecem resultar de ansiedade. Também não de salto alto, mas em termos, porque a briga de Dilma com o seu papel é, digamos, a parte de figurinos no scritp de sua marquetagem.
Ao começar a campanha que não é campanha, a marquetagem vestiu Dilma Rousseff como se -já dito aqui- a toda hora fosse para um casamento ricaço em São Paulo. Não é muito certo que apenas tangenciasse o ridículo. Deu uma simplificada. Agora, para contatos públicos, parece apenas que vai jantar em restaurante caro. Da São Paulo de novos ricos, claro.
Mas a pretendida candidata dos eleitores movidos a trocados do Bolsa Família, candidata do presidente-"operário", que está aprendendo a trocar o tecnocratês pelo português, deve mesmo chamar a Brasília cabeleireiro de dondoca, para fazer corte estilo sei quê? E cobrir-se de maquiagens óbvias como se trabalhasse na Globo?
Cada qual com suas razões, Dilma Rousseff e José Serra são candidatos que pretendem tomar Lula como modelo. Cada qual, um dos Lulas, o da campanha e o do governo.
Nenhum dos dois está bem no seu papel.


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