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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/O EX-TESOUREIRO
Ex-tesoureiro promete "explicar com clareza" esquema de Marcos Valério, mas não fala nada sobre os pagamentos a parlamentares
Delúbio se nega a falar nome de sacadores
DO ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O ex-tesoureiro do PT Delúbio
Soares falou por horas à CPI dos
Correios, mas nada explicou sobre a destinação dos recursos de
caixa dois, que ele insistentemente classificou de "recursos não-contabilizados".
Delúbio assumiu a responsabilidade pelas transações financeiras não declaradas, ou seja, pelo
dinheiro que o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza
emprestou dos bancos para repassar ao PT.
Ele também isentou o governo,
sobretudo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-ministro
José Dirceu, de qualquer envolvimento com irregularidades, e negou a existência do "mensalão".
Protegido por uma liminar que
lhe garantiu o direito de não responder a questões que pudessem
lhe auto-incriminar, Delúbio iniciou seu depoimento afirmando
aos parlamentares que iria "explicar com clareza" todo o esquema
dos empréstimos realizados pelas
empresas do publicitário Marcos
Valério de Souza em benefício do
PT e de partidos aliados.
Porém, o que se ouviu foi uma
repetição de negativas e falta de
explicação, que irritaram os deputados e senadores. O ex-tesoureiro também se irritava com a insistência nas mesmas perguntas.
"Posso ter errado e saberei assumir com honra e dignidade um
ato que fiz. Estou disposto a assumir." Em outra ocasião, declarou
que "meu partido, se achar que eu
estou mentindo, vai me expulsar.
Eu sei disso". Anteontem, a Executiva do PT decidiu não desligá-lo da legenda.
Em várias ocasiões, o ex-tesoureiro procurou envolver parlamentares na prática de caixa dois
para as eleições, em ameaças veladas, o que só serviu para provocar
a ira dos membros da CPI. "O senhor tem de esclarecer quem pegou dinheiro porque senão irá
pairar uma dúvida sobre todos e
inocentes poderão ser imolados",
pediu o relator da CPI, Osmar
Serraglio (PMDB-PR).
Mas nada demoveu Delúbio.
Toda vez que questionado a respeito, repetia: "Já falei sobre isso
ao relator e não tenho nada mais a
acrescentar." A resposta que havia dado a Serraglio é que as investigações e a quebra dos sigilos
das empresas de Valério mostrarão quem recebeu dinheiro.
Enquanto parlamentares da
oposição revezaram-se para acusar Delúbio de "mentiroso", os
petistas passaram por uma situação de saia-justa. Os senadores
Ideli Salvatti (SC) e Roberto Saturnino (RJ) procuraram se desassociar da prática de caixa dois, .
"Não sou nenhum santo. Já andei
transitando pelo Conselho de Ética, mas nunca fiz caixa dois. Todo
mundo faz é uma ova!", disse Saturnino, que o chamou de "crucificado sorridente".
A deputada Denise Frossard
(PPS-RJ) irritou-se com as respostas de Delúbio e perguntou:
"O senhor conhece uma prisão
brasileira?". Ele preferiu não responder. Afirmou que não é rico,
que seu patrimônio declarado é
de R$ 163 mil e que sua renda familiar líquida mensal é de aproximadamente R$ 13 mil e que comprou neste ano um carro da marca Toyota Corolla no valor de R$
71 mil. "Meu patrimônio é até vergonhoso pelas minhas atividades", disse.
"MENSALÃO" -"O PT não paga
mesada a parlamentares de nenhum partido, o PT não compra
votos para votar nos projetos de
interesse do governo", disse Delúbio. Ele afirmou que o relacionamento com o PTB do deputado
Roberto Jefferson, que denunciou
a suposta existência do "mensalão", era "sadia". "As informações
do deputado não procedem e, no
momento certo, vamos trabalhar
a informação correta."
CAIXA DOIS - O ex-tesoureiro
disse que foi procurado por candidatos de seu partido e da base
aliada que teriam ficado com dívidas de campanha. Recusou-se a
citar os nomes dos envolvidos,
alegando que poderia "esquecer
alguém e seria injusto", mas esclareceu que os recursos "não-contabilizados" normalmente eram
para campanhas majoritárias.
Disse que não avisou ninguém da
direção do PT. "Vou apresentar o
problema à atual Executiva, que
vai decidir o que fazer."
EMPRÉSTIMOS - Para quitar as
dívidas de campanha "não-contabilizadas", procurou o publicitário Marcos Valério. "Ele se ofereceu e eu concordei." Afirmou que
os empréstimos não foram registrados, mas feitos "na base da
confiança". Segundo o ex-tesoureiro, ele recorreu a empréstimos
de terceiros porque não havia como buscar transações próprias
uma vez que as dívidas não estavam declaradas oficialmente.
PT - Delúbio eximiu a executiva
do partido da responsabilidade de
manter um caixa dois para as
campanhas. "Fui eu quem fiz; eu
assumo." Ele não explicou, porém, como iria pagar os empréstimos com Valério, calculados em
R$ 90 milhões por ele mesmo,
uma vez que, segundo Delúbio,
não havia contabilização do valor.
"Estou diante de um grande problema e preciso resolvê-lo o mais
rápido possível", disse, arrancando risos dos parlamentares.
SACADORES - O ex-tesoureiro recusou-se a fornecer os nomes das
pessoas que teriam se beneficiado
do esquema do caixa dois. "As investigações irão esclarecer os fatos", repetiu. Mesmo quando
confrontado com a lista de assessores e parlamentares que retiraram dinheiro das contas de Valério no banco Rural, Delúbio limitou-se a dizer que conhecia apenas três pessoas, mas não disse se
participavam do esquema.
ALIADOS - Por várias vezes, o ex-tesoureiro fez questão de afirmar
que foi procurado por membros
de partidos da base aliada para resolver problemas de recursos de
campanha, mas não citou nomes.
Sobre o acordo com o PTB, que,
segundo Roberto Jefferson (RJ),
previa o repasse de R$ 20 milhões,
R$ 4 milhões dos quais teriam sido pagos em dinheiro por Marcos
Valério, Delúbio assentiu que o
PT teve uma "participação" nas
campanhas do PTB no ano passado, "mas não da maneira como
Jefferson falou".
GOVERNO - Questionado por
parlamentares sobre sua proximidade com o governo, participando, inclusive, da viagem oficial
que o presidente Lula fez à África,
em 2003, Delúbio negou qualquer
ingerência. Sobre a viagem, disse
que representou o PT. Também
participou de viagens nacionais,
mas disse que não discutia assuntos financeiros com o presidente.
MARCOS VALÉRIO - Disse que conheceu o publicitário em meados
de 2002, apresentado pelo deputado Virgílio Guimarães (PT-MG). "Ele me foi apresentado como um pessoa correta e digna,
que em 1998 tinha ajudado nas
campanhas de Aécio Neves para
deputado e de Eduardo Azeredo
para o governo daquele Estado."
O ex-tesoureiro confirmou que se
encontrou com o publicitário, na
segunda-feira da semana passada,
em Belo Horizonte, mas negou
que tenha ido combinar a versão
apresentada na Procuradoria Geral da República. "Fui tranqüilizá-lo, dizendo que ia procurar a nova
direção para honrar essa dívida."
GOLPE - Delúbio repetiu a tese
de que há uma tentativa de desestabilizar o governo Lula, mas não
quis dizer de onde ela viria. Para
comprovar sua teoria, ele deu como exemplo que até aquele momento só tinha respondido duas
perguntas relacionadas aos Correios, que é o foco das investigações da CPI. "O governo está sofrendo um ataque violento para
desestabilizá-lo."
(CHICO DE GOIS, LEILA SUWWAN E FERNANDA KRAKOVICS)
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