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JANIO DE FREITAS
Grampos políticos
A investida contra Lula não parte da oposição, mas de duas alas inusitadas de infantaria: Mendes e Jobim
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O PROBLEMA dos grampos não
existe mais. Ou, na pior hipótese, está em suspenso até a
próxima safra. Não foi resolvido, todas as hipóteses a respeito continuam abertas. Transfigurou-se, assumindo a natureza que, talvez desde os primeiros vagidos, trazia com
aparência de componente apenas intrometido, como um carona excessivo. O caso dos grampos é hoje um
forte embate político, no qual escutas e maletas e agentes não passam
de coadjuvantes úteis.
Lula e seu governo foram imobilizados no caso. Estão reduzidos à
inércia também por perplexidade e
boa dose de covardia, mas, na mesma
medida, pela investida persistente
que, entre inúmeras possibilidades
de idêntico quilate, concentra-se na
hipótese de má conduta dentro do
governo. Figurado, no caso, por uma
área sempre passível de suspeições e,
por seus próprios fins, sempre com
dificuldade de explicações públicas
-a Agência Brasileira de Inteligência, Abin.
A peculiaridade do embate político
é que a investida contra o governo, e
portanto contra Lula, não parte da
oposição partidária, nem conta com
sua colaboração, toda ela perdida em
um abobalhamento humilhante e
desmoralizador. A ofensiva que sitia
o governo é feita por duas alas inusitadas de infantaria. Uma está na cúpula de um poder do qual se supõe,
como faz também a Constituição,
alheamento em relação às questões
políticas até que seja chamado, se o
for, a apreciá-las em confronto com
os princípios constitucionais. Cúpula personificada, nas atuais circunstâncias, pelo presidente do Supremo
Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, Gilmar Mendes.
A outra frente do assédio ao governo e a Lula está no governo mesmo.
Sem trocadilho, o ataque do ministro
da Defesa, Nelson Jobim, é mais exposto e desmoraliza-se pelas acusações e denúncias sucessivamente
desmentidas até por técnicos e autoridades de sua área. Na prática e de
imediato, porém, seus efeitos têm sido muito mais corrosivos. Está aí, como exemplo eloqüente, a embaraçosa situação de Lula por ceder à pressão de Jobim para afastar o diretor-geral da Abin, Paulo Lacerda, cujas
afirmações no caso vêm mostrando a
veracidade que falta às do ministro
da Defesa. O mesmo se evidencia em
afirmações do sério e equilibrado general Jorge Felix, na divergência
acusatória que Nelson Jobim mantém com ele, ministro da Segurança
Institucional que inclui a Abin.
Buscar a motivação essencial da investida concomitante seria, por ora,
uma aventura especulativa ou ficcional. Provável, por falta absoluta de razões para o contrário, é que Lula jamais tenha ordenado grampos, compra de maletas, mistura de PF com
Abin em inquéritos e trapalhadas.
Certo, por simples obviedade, é que o
alcance final da investida é Lula.
As convergências de Gilmar Mendes e Nelson Jobim não precisam ter
a mesma inspiração para estarem tão
à vista. Poderiam mesmo ser opostas.
Assessor jurídico de Fernando Collor,
adversário do "impeachment", figura
relevante no lado mais duro do governo Fernando Henrique, Gilmar Mendes transparece conformação muito
mais ideológica do que política, isto é,
submete o componente político de
suas atitudes ao serviço da ideologia.
Nelson Jobim, a quem Ulysses
Guimarães por certo tempo revestiu
com o conceito de grande jurista,
tem compromisso com seus projetos
políticos. A aposentadoria antecipada no Supremo Tribunal Federal foi,
a rigor, um ato de desincompatibilização com vistas à eleição presidencial de 2006. O PMDB, seu velho partido, não se definira ainda e uma candidatura própria não era de todo impossível, ainda mais nos sonhos pessoais. Jobim, a propósito, chegou a
procurar Lula no Planalto. Decidido
o apoio do PMDB à reeleição, restava
o lugar de vice. Jobim voltou ao campo. Para evitar um eventual problema na área peemedebista, Lula se viu
na contingência de protelar ao máximo a indicação da vice-presidência,
que sempre desejou para José Alencar e nunca para Jobim. Mas outra
eleição vem aí em 2010, e já é a razão
de ser e agir de muita gente.
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