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Pré-candidato à Presidência, prefeito de Belém diz que moderados empurram partido para repetir De la Rúa
Ala esquerda acusa Lula de domesticar PT
FÁBIO ZANINI
DA REPORTAGEM LOCAL
Candidato dos setores radicais
do PT à Presidência da República,
o prefeito de Belém, Edmilson
Rodrigues, 44, acusa Luiz Inácio
Lula da Silva de liderar um processo de domesticação do partido. Segundo ele, a tentativa da cúpula moderada de tornar o PT
"palatável" ao empresariado pode
acabar por desfigurá-lo.
As críticas fogem da praxe do
PT, em que os militantes divergem em todos os níveis, mas costumam poupar a figura de Lula.
A candidatura de Rodrigues,
que disputará com Lula e o senador Eduardo Suplicy (SP), visa
"marcar posição". Mesmo apoiado por facções como Articulação
de Esquerda, Fórum Socialista,
Força Socialista e Refazendo, ele
dificilmente superará os 15% na
prévia, em março. Mas poderá influir na agenda do PT em 2002.
Em entrevista concedida na
quarta-feira, ele diz recear que o
PT "light" repita o fiasco de Fernando de la Rúa na Argentina.
Folha - Por que lançar uma candidatura para "marcar posição"?
Edmilson Rodrigues - O que tem
provocado essa convergência de
vários segmentos da esquerda para minha candidatura é a atitude
cada vez mais domesticadora da
Articulação [ala moderada". Defendemos o projeto de um PT
classista, de massas, comprometido com o socialismo e não com
um projeto de social-democratização e domesticação.
Vamos fazer a crítica da situação que está aí, mostrar que temos
amplas possibilidade de revertê-la
e fazer com que os companheiros
da Articulação recoloquem o tema da ruptura com o FMI, do socialismo e da convocação de uma
Constituinte. Vamos mostrar que
é impossível haver transformações no país sem mudar a agenda
neoliberal e tocar na questão da
dívida externa.
Folha - O sr. acha mesmo que pode ganhar de Lula na prévia?
Rodrigues - O Lula não se inscreveu ainda. A Articulação tem trabalhado com uma orientação
equivocada, que é a do Duda
Mendonça, de transformar a política em matemática aplicada, estatística, baseada na opinião de
pesquisas. A impressão que a gente tem é que o Lula sairá candidato só se tiver a certeza absoluta da
vitória, pelas pesquisas. Mas isso
não existe em política. E, se ele
não sair, o partido vai ter pouco
tempo para trabalhar outro nome. Não creio que seja uma tarefa
fácil, mas política não é matemática. Eu nunca descartaria a hipótese de vencermos as prévias.
Folha - Lula está envolvido nesse
processo de domesticação do PT?
Rodrigues - O Lula está perfeitamente afinado com a domesticação do PT. E não é de forma ingênua. O Lula é um importante quadro intelectual. As posições dele
relativas ao ataque de Bush não
têm apoio da tradição partidária.
Quando ele defende a idéia de
que os EUA possam responder
com bombardeios, usando o
princípio da autodefesa, está legitimando um terrorismo de Estado. Nenhuma prova até hoje é
convincente de que o Afeganistão, enquanto Estado, patrocinou
os atos. Matam inocentes, envolvem o mundo numa guerra, colocam vidas em risco. Foi assim
quando Granada foi invadida,
quando os EUA apoiaram ditaduras militares. É assim quando se
endurece com Cuba. As posições
do Lula são uma tentativa de passar uma imagem de partido palatável ao capital, ao empresariado.
Folha - Lançar uma pré-candidatura de esquerda quando o PT tem
uma chance real de conquistar a
Presidência não é dividir o partido?
Rodrigues - O que está em jogo é
a possibilidade ou não de mudanças reais. A linha da "palatabilidade" do PT, que é a do próprio Lula, é equivocada. Em 94, ele tinha
40% nas pesquisas, mas, ao tentar
transformar o Lula num estadista,
o PT fez esse patamar se transformar em um fiasco em que sequer
chegamos ao segundo turno.
Ao tentar não criar imagem de
partido radical, nós perdemos.
Não conseguimos ter a confiabilidade do capital e perdemos a possibilidade de ter o povo conosco.
Folha - Mas não seria melhor o PT
estar unido em torno do Lula, preparando-se para o PFL ou o PSDB?
Rodrigues - Você falou no PFL. É
o próprio Instituto Cidadania
[ONG de Lula" que limpa a imagem do PFL quando convida um
ACM para falar de combate à pobreza. Ou quando o José Dirceu
[presidente do partido" procura o
PL. Ou quando o Zeca do PT [governador de MS" convida o PFL
para participar do governo. Não é
possível fazer de conta que isso
não está existindo. Seria uma falsa
unidade.
Estamos querendo recuperar os
três pilares fundadores do PT.
Um é o compromisso com a construção de uma sociedade socialista. Outro é a defesa da classe trabalhadora. O terceiro é resgatar a
democracia interna. Quando fazemos uma defesa do direito de o
Suplicy se candidatar a presidente, queremos dizer que somos
contra a violência que o tem vitimado. A candidatura é necessária
não para dividir, mas para resgatar o PT. Porque repetir aqui situações como a da Argentina seria vergonhoso.
Folha - O sr. está dizendo que o PT
"light" pode ser um fiasco como o
de Fernando de La Rúa?
Rodrigues - Veja alguns casos. O
[Vitor" Buaiz [ex-governador do
ES", ao negar o partido, criou problemas seríssimos ao PT. Há um
debate sobre o governo de Mato
Grosso do Sul, os riscos enormes
que o PT corre de se desgastar caso o Zeca mantenha esse desrespeito ao programa do partido.
Folha - Faz sentido falar hoje em
eliminação do capitalismo?
Rodrigues - Quando defendemos o socialismo, queremos um
modo social de produção alternativo ao capitalismo, mas que não
vai deixar de ter produção de
mercadoria ou trabalho assalariado. O socialismo não prevê o fim
de toda forma de propriedade privada. Não vamos estatizar carrinhos de cachorro-quente.
Folha - Mas isso não é exatamente o que os moderados defendem?
Rodrigues - Não. O outro campo
é socialista só na aparência. Eles
defendem uma tese que é a velha
social-democracia. Acho que você pode ter em algumas áreas a
coletivização da produção agrícola, setores industriais onde se dê a
produção coletiva, em que o Estado tenha de assumir a propriedade dos meios de produção.
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