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Bancada ruralista cresce 58% e barra combate à escravidão
Grupo impediu que emenda que expropriava fazendas fosse votada em 2º turno
O ex-secretário de Direitos Humanos Nilmário diz que setores do governo, como o Ministério da Agricultura, não ajudaram na aprovação
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL
A bancada ruralista cresceu
58% na atual legislatura da Câmara dos Deputados, e 59% de
seus integrantes estão nos partidos da base aliada ao governo
Lula, segundo levantamento
feito neste mês pela ONG Inesc
(Instituto de Estudos Socioeconômicos). São 116 deputados
(22,6% do total) contra 73 na
legislatura 2003-2007. Os 68
ruralistas que apóiam Lula somam 18% da base governista.
Entidades não-governamentais, setores do governo e parlamentares da situação atribuem
à bancada ruralista parte da
responsabilidade pelo andamento arrastado de 11 projetos
que têm algum tipo de punição
a fazendeiros acusados de fomentar o trabalho escravo.
O principal deles é a PEC
(Proposta de Emenda Constitucional) 438/2001, que prevê
a expropriação de propriedades
rurais com incidência de trabalho escravo. Ela chegou a ser
aprovada no Senado, em dois
turnos, e foi votada em primeiro turno na Câmara, em 2004,
mas não entrou mais na pauta
para a segunda votação. Uma
das líderes da bancada no Congresso, a senadora Kátia Abreu
(DEM-TO), disse que o grupo
decidiu não votar a emenda enquanto não seja redefinido o
conceito de trabalho escravo.
O presidente da Câmara na
época da primeira votação, Aldo Rebelo (PC do B-SP), 51,
descreveu o papel dos ruralistas na discussão: "A bancada
ruralista atuava sempre pelos
líderes partidários, apresentava os pontos de vista e participava dos debates no plenário".
Indagado se a bancada pediu
que a PEC não fosse votada, Aldo disse: "Não era diretamente
para que não fosse a segundo
turno, mas um esforço grande
para que ela não fosse aprovada. E daí outro esforço para que
houvesse uma redação que permitisse a votação e, portanto, a
aprovação". Aldo disse que o
governo "se empenhou na
aprovação da PEC", mas "não
transformou isso numa guerra,
porque o governo trabalha em
várias frentes, em atividades
para as quais [escolhe] distribuir esforço e energia".
O ex-secretário dos Direitos
Humanos do governo Lula
(2003-2005), Nilmário Miranda (PT-MG), 60, disse que os
ruralistas articularam um movimento contrário à PEC por
meio dos líderes partidários: "A
senadora Kátia Abreu era deputada na época, ela foi uma
das próceres para impedir
aquilo de qualquer maneira".
Segundo ele, "há uma grande
mobilização dentro da Câmara
para impedir qualquer chance
de aprovação da PEC".
O ex-secretário alegou que o
governo "não abandonou a
idéia" de aprovar a PEC, mas
reconheceu que "sempre houve
dificuldades, dentro da própria
base do governo há contradições". Além disso, "não é segredo que há áreas do governo que
não concordam [com a PEC]. O
próprio Ministério da Agricultura na época não tinha nenhum entusiasmo por isso. Não
trabalhava contra, mas não ajudava. Acho que ele não fez exatamente porque uma reação
expressiva de um setor".
Resistência
Segundo Nilmário Miranda,
o ex-ministro Roberto Rodrigues "não usou todo o potencial" para ajudar na aprovação
da matéria. "Acho que ele não
fez exatamente porque houve
uma reação expressiva de um
setor que votava com o governo
na maioria dos casos", afirmou.
Segundo Nilmário, Aldo Rebelo "tinha um compromisso"
de colocar a matéria para votar,
mas isso ocorreu apenas em
primeiro turno. "Entre o primeiro e o segundo turnos,
aconteceu alguma coisa, eu não
sei o que foi". Indagado, Aldo
afirmou: "Havia receio de não
obter os votos para aprovação e
a matéria ir para arquivo, e os
líderes tentaram encontrar
uma redação que permitisse
uma apreciação da matéria. E
isso não foi alcançado".
Um deputado ruralista assim
definiu a bancada, sob condição
de não ter seu nome divulgado:
"Eles estão presentes em quase
todas as bancadas. Tinham
uma referência importante no
Ministério da Agricultura [ex-ministro Roberto Rodrigues],
não tinham uma relação boa
com o governo, [tinham] uma
desconfiança grande do Lula.
Eles têm uma pauta de reivindicação muito ampla, que vai da
questão dos juros e do crédito
dos recursos para safra, passa
pelo preço dos insumos (...) e
vai até as questões mais sensíveis e polêmicas, como reforma
agrária e trabalho escravo".
Uma tese de doutorado defendida na USP (Universidade
de São Paulo) neste mês pelo
cientista político Leonardo Sakamotto vê uma relação entre a
morosidade na apreciação dos
projetos anti-escravagistas e as
doações de campanha eleitoral.
Segundo ele, empresas agropecuárias acusadas de trabalho
escravo, seus donos e parentes
fizeram doações nas eleições de
2002 e 2004 que ajudaram a
eleger dois governadores, cinco
deputados federais, três deputados estaduais, três prefeitos e
um vereador. Ele apontou ainda três deputados federais, um
estadual e três prefeitos entre
proprietários ou parentes de
donos de fazendas autuadas
por suposto trabalho escravo.
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