São Paulo, segunda-feira, 21 de novembro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ CASO SANTO ANDRÉ

Instituto de Criminalística transcreve para a Justiça fitas com diálogos de personagens acusados de envolvimento na morte de Celso Daniel

Transcrição demonstra pressão de petistas

ANDRÉA MICHAEL
LUCIANA CONSTANTINO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O INC (Instituto Nacional de Criminalística) entrega amanhã à Justiça Federal em São Paulo a transcrição oficial das 41 fitas do caso Santo André, o mais novo combustível da CPI dos Bingos.
O trabalho revelou indícios de que houve corte, sobreposição e, em pelo menos dois casos, duplicação de diálogos.
A ordem do juiz José Alexandre Cassetari, titular da 4ª Vara da Justiça Federal em São Paulo, determinou somente a transcrição das gravações. Portanto, o INC não apresentará laudo pericial relativo à identificação dos personagens dos diálogos nem sobre o grau de integridade das fitas, transcritas por uma força-tarefa de policiais nos últimos 30 dias.
O conteúdo das fitas -também encaminhadas pelo magistrado à CPI dos Bingos- revela, nos diálogos entre personagens acusados de envolvimento no assassinato do prefeito Celso Daniel, que alguns deles desconfiavam do grampo e aponta preocupação em pressionar a polícia para evitar "politização" do caso.
Em um dos trechos, por exemplo, Gilberto Carvalho, atual chefe-de-gabinete de Lula, conversa com o ex-secretário de Serviços Urbanos da prefeitura Klinger de Oliveira Souza. Carvalho diz: "Ontem eu tive uma conversa com o José Dirceu. Levei o João Avamileno [vice de Celso Daniel] comigo pra gente discutir nossa tática. O partido vai entrar meio pesado agora, viu?". E Klinger responde: "É. Eu vi as últimas declarações do Zé".
Em sua estratégia de defesa, os petistas também buscam a linha política. Levam o caso ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), e pedem ao então diretor-geral da PF, Agílio Monteiro, apoio nas investigações, que eram conduzidas pela Polícia Civil. As questões mais relevantes eram levadas, conforme os diálogos, ao conhecimento de Dirceu, que à época presidia o PT, e ao então candidato a presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Rocha Mattos
Cassetari substituiu o juiz afastado João Carlos da Rocha Mattos, que foi preso e condenado pela venda de sentenças judiciais. Mattos foi o responsável pela decisão que determinou a destruição das fitas, após considerá-las ilegais.
Conforme a decisão judicial, a autorização que a PF usou para grampear petistas foi concedida para uma investigação sobre narcotráfico na favela Pantanal e não relativa ao assassinato de Celso Daniel. O grampo foi feito entre janeiro e março de 2002 e, de fato, revelou nomes de pessoas que foram posteriormente presas sob acusação de participar do crime.
Mattos guardou cópia das gravações em seu gabinete funcional. Cassetari, ao encontrá-las e sem saber do que se tratava, determinou sua transcrição.

Combustível
Agora, os diálogos serviram, por exemplo, para Klinger confirmar à CPI na última semana ter havido uma tentativa de pressionar as investigações da polícia e a imprensa para evitar politizar a morte do prefeito. Segundo Klinger, nessa tentativa ajudou Gilberto Carvalho, que também foi secretário em Santo André.
As fitas também foram usadas por senadores no depoimento do empresário Sérgio Gomes da Silva, considerado pelo Ministério Público como mandante da morte de Celso Daniel. O empresário nega, dizendo ter sido "vítima" da quadrilha que seqüestrou o prefeito quando estavam juntos.
"As degravações estão sendo avaliadas. Mostram uma linha de que pessoas ligadas ao prefeito Celso Daniel estavam preocupadas em criar uma série de aparências, até com atitudes cínicas", diz o relator da CPI, senador Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN).
O relator afirma ainda ter "convicção" de que o crime foi planejado. A CPI dos Bingos incluiu o caso de Santo André nas investigações por haver suspeitas de que o assassinato tenha motivações políticas. A comissão também apura denúncias de um suposto esquema de arrecadação de propina de empresas de lixo e transporte pela prefeitura para campanhas políticas do PT.
Um dos diálogos gravados faz referência a uma entrega de "numerário" (dinheiro), na sede da Prefeitura de Santo André, sem dizer a razão da encomenda.
Em julho de 2002, a Folha teve acesso às transcrições feitas na época. O trabalho indicava como personagens desse diálogo Klinger e o então secretário da Saúde de Santo André, Michel Mindrisz.
Na quarta-feira, será a vez de a comissão ouvir a empresária Rosângela Gabrilli, que pertence a uma das empresas de transporte de Santo André. A família Gabrilli denunciou, logo após a morte do prefeito, a suposta existência do esquema de propina.
Chamado de "caixinha do transporte" pela CPI, o esquema consistiria em cada empresa contribuir com valores calculados de acordo com o número de veículos e a tarifa cobrada.
Parte do dinheiro seria depositada na conta de Gomes da Silva, como apontam recibos apresentados à comissão. O empresário nega. Por isso, mesmo com o depoimento de quarta, Rosângela deve voltar à CPI para uma acareação com Gomes da Silva, Klinger e o empresário Ronan Maria Pinto, também acusado pelo Ministério Público de participar do esquema de arrecadação.


Texto Anterior: Frase
Próximo Texto: Frase
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.