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Êxito do fórum não produziu mudanças globais, diz sociólogo
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM NAIRÓBI
Vítima de seu êxito, o Fórum
Social Mundial vive um dilema
entre a irrelevância e a tomada
de posição. A opinião é de um
entusiasta do evento, o catedrático de sociologia da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra Boaventura
Sousa Santos, 65. Leia a seguir
trechos da entrevista que o sociólogo concedeu em Nairóbi.
(ANA FLOR)
FOLHA - Qual é o futuro do Fórum?
BOAVENTURA SOUSA SANTOS - O
Fórum é vítima do seu êxito. É
uma grande novidade política.
Alguns tendem a pensar que ele
se diluiu num "talk-shop": fala-se muito e nada acontece. Para
estes, o Fórum deveria estar
vinculado a uma forma política
mais organizada. Entre os fundadores, os brasileiros, é dominante a posição de que as novas
formas organizativas serão no
espírito do Fórum, onde não há
uma posição que exclua outras.
FOLHA - E qual a sua posição?
BOAVENTURA - A minha posição
é intermédia. O Fórum teve
muito êxito, e não apenas de
juntar pessoas. Foi de colocar
na agenda internacional temas
como a pobreza, o perdão da dívida, o tema ecológico. Por outro lado, muito da eficácia do
Fórum não foi em âmbito global, foi no âmbito de país. Saiu
do Fórum a política externa do
Lula, e não se pode compreender os governos de esquerda da
América Latina hoje sem essa
energia da sociedade civil.
FOLHA - O presidente Lula não estará no Fórum Social Mundial, mas
vai a Davos. O que o sr. acha disso?
BOAVENTURA - É mais um desgosto que o presidente Lula nos
dá. Não é o primeiro, não será o
último. Era preferível que ele
não fosse a nenhum.
FOLHA - Há pouco tempo, o sr. disse que o segundo mandato de Lula
terá que ser diferente. Como?
BOAVENTURA - No primeiro
mandato, houve um capital
enorme de aspirações populares canalizadas para Lula. Esse
capital foi, em grande medida,
desbaratado, mas não a ponto
que o projeto tenha sido completamente desbaratado. Primeiro, porque houve mudança em áreas significativas, que deram um sinal à sociedade brasileira de que algo poderia estar
mudando. E também porque a
direita no Brasil não tem credibilidade para atender às aspirações do povo.
FOLHA - O presidente hoje diz que
é de "centro". Isso é uma decepção?
BOAVENTURA - O presidente Lula tem uma coisa refrescante.
Ele representa, no Brasil, um
papel que, de alguma maneira,
[Bill] Clinton [ex-presidente
dos EUA] representou nos Estados Unidos. Clinton não pertencia aos grandes clãs que têm o poder nos Estados Unidos. E,
naturalmente, todas as suas
fraquezas foram exploradas da
pior maneira. Mas é evidente
que muito do comportamento
de Clinton, até no domínio sexual, não teria sido explorado
se ele fosse um insider. Tal e
qual, alguns comportamentos e
maneiras de falar do Lula, ou a
bebida, ou o que quer que fosse,
não seriam explorados se ele
fosse um insider.
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