São Paulo, domingo, 22 de março de 2009

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ELIO GASPARI

Boa notícia: o vestibular pode mudar


As notas do Enem poderão substituir o massacre do decoreba e das pegadinhas da primeira fase

NOSSO GUIA poderá livrar os jovens da praga do vestibular. O ministro da Educação, Fernando Haddad, está concluindo uma negociação com os reitores das universidades federais e é possível que já em 2010 a primeira fase seletiva seja substituída pela nota do Exame Nacional do Ensino Médio, o Enem. Apesar de haver ideias adicionais, a mudança tende a começar pelo mais simples. A cada ano, as 55 federais recebem em torno de 1,2 milhão de candidatos para 150 mil vagas. Numa primeira fase, 70% deles são massacrados numa prova mais preocupada em eliminar do que em julgar. Adotando-se as notas do Enem para a demarcação das linhas de corte, leva-se para dentro das escolas a responsabilidade pelo desempenho dos alunos. Atualmente, a irracionalidade do decoreba e das pegadinhas serve de álibi para quem ensina mal. A segunda fase, que cobraria taxas de inscrição, continuaria no âmbito das universidades.
Devem existir argumentos razoáveis contrários à mudança, mas desde já seria bom separá-los da defesa de interesses estabelecidos. Algumas escolas não gostam do Enem porque ele expõe a má qualidade do ensino que entregam. As burocracias da organização dos vestibulares não gostam de mudanças porque elas secariam uma fonte de arrecadação e de distribuição de gratificações. Afinal, quem paga o Enem é a Viúva.

UMA OBRA DO TAMANHO DO DR. ALCEU

Talvez seja um sinal de que Deus existe. Numa época em que os católicos brasileiros se veem atirados em discussões sobre a utilidade das camisinhas, os poderes excomungantes de d. José Gomes Sobrinho e o revisionismo histórico do bispo inglês Richard Williamson (sagrado por d. Antonio de Castro Mayer, prelado cismático da diocese de Campos), o professor Candido Mendes publica seu livro "Dr. Alceu da "persona" à pessoa".
Candido Mendes escreveu 30 livros, mas "Dr. Alceu" é a obra de sua vida. Trata da monumental figura de Alceu Amoroso Lima (1893-1983), seu amigo e mestre. Ele foi a "trombeta bíblica" do laicato brasileiro e atravessou a história da igreja do início do século 20, elitista, até reacionária, que se transformaria num clero militante, defensor do andar de baixo e, a partir de 1970, adversário assumido da ditadura. O regime militar ainda não completara cem dias quando Dr. Alceu escreveu um artigo intitulado "Terrorismo Cultural". Dez anos depois, ele brigava contra o terrorismo da tortura e do extermínio de militantes da luta armada e assinou "Os Esperantes". Referia-se ao sofrimento das famílias de cidadãos desaparecidos.
O livro de Candido Mendes fixa-se no campo das ideias. É daquelas obras torrenciais que pede reflexão sem conceder o refrigério do cotidiano, com seu tempero anedótico. Projeto difícil, realiza-se porque mostra como "Dr. Alceu" foi maior que a política em que viveu. Foi um militante por imposição do pensamento e da fé, seu interesse pela ação era subsidiário.
Dr. Alceu teve algozes e Nelson Rodrigues foi o mais famoso deles. O outro foi Gustavo Corção. A ele, sem contar tudo o que sabe, o professor dedica umas vassouradas, num capítulo intitulado "Da ordem ao dever da delação".
Aos interessados, um aviso: o livro exige atenção, algum conhecimento da história da época e uns dicionários. Alguns exemplos: o Jackson da página 15 não é o do Pandeiro, mas o líder católico Jackson de Figueiredo; o cientificismo lamarckiano da 39 nada tem a ver com a VPR do capitão Carlos Lamarca, pois se refere ao naturalista francês Lamarck. "Patrística", que está logo adiante, é o conjunto dos trabalhos filosóficos dos primeiros pensadores da igreja.

MP 449
O deputado Tadeu Felipelli (PMDB-DF), que chegou a um novo texto para a medida provisória 449 e concedeu um refresco amplo, geral e irrestrito para sonegadores, poderia receber uma Emenda Obama.
Como há grandes, prósperas e conhecidas empresas espetadas num contencioso de IPI que não foi pago à Viúva, ficariam taxados em 90% os bônus dos diretores daquelas que aderirem ao Trem da Alegria.
É o velho negócio: o andar de cima brasileiro está cheio de gente que é Obama por lá e Bush por cá.

NATASHA E MANTEGA
Madame Natasha tem horror a economia mas descobriu um aliado recente no professor Ilan Golfajn, ex-diretor do Banco Central. Ele ouviu o ministro Guido Mantega dizer que, apesar da contração de 3,6% do PIB no último trimestre de 2008, o cenário para este ano é razoável, pois "ficaremos distantes de um déficit técnico".
Nas palavras do professor: "Que diabos é um "déficit técnico'? Meu leitor, o termo "déficit técnico" não existe. O que existe é o termo recessão, que ocorre tecnicamente quando há dois trimestres seguidos de crescimento negativo".
Natasha acredita que o doutor Mantega está com déficit técnico. De que, ainda não sabe.
Seu colega Eremildo, de quem ela não gosta porque é um idiota, suspeita que o Banco Central passou a remarcar as previsões de crescimento do PIB pela técnica das liquidações do varejão. Baixou uma previsão feita por seus sábios de 1,2% para 0,59%. O cretino acredita que daqui a pouco o BC anunciará um PIB de 5,99% em oito prestações anuais.

ENTRA E SAI
Pode-se entender melhor a qualidade da base de apoio do governo quando se vê que em menos de um mês aconteceram duas coisas:
1) O deputado Eduardo Cunha, um parlamentar de real grandeza, defendeu a saída do senador Jarbas Vasconcelos do PMDB porque ele disse que uma banda do partido gosta do alheio.
2) Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, o Lord Keynes do mensalão, foi a Brasília para cabalar o seu retorno ao partido, do qual foi expulso.
O melhor seria chamar Jarbas para o PT, mandando Delúbio para o PMDB. Pode até dar na mesma, mas anima o bailado.

O PREÇO DA QUEIXA
Coisas que acontecem quando uma pessoa entra no mundo dos hospitais, passa pela banca e termina no Judiciário. Em 1995, um professor aposentado do Colégio Pedro 2º, de 90 anos, levou sua mulher, com mais de 80, para uma consulta na Clínica São Vicente. Durante o exame ela teve um desmaio e acabou na UTI. Passadas 72 horas, sua família transferiu-a. Sobrou uma conta de R$ 19 mil. Inconformado com o custo, o professor fez um depósito judicial no Banerj de R$ 20 mil e passou a discutir o pagamento.
A senhora, o professor e o Banerj já morreram, e a conta de R$ 19 mil virou uma cobrança de R$ 60 mil contra o espólio. Como a execução judicial esqueceu-se dos herdeiros do depósito de R$ 20 mil, ir à Justiça resultou numa multa de 100%.

EL DEPORTADOR
Negociando com os arrozeiros de Roraima, o comissário Tarso Genro deve perguntar quantos deles gostariam de ir para Cuba.


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