|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Bicheiros trocam jogo "original" por bingo e caça-níqueis, mais rentáveis
Contraventores contrastam grandes sinais de riqueza aparente com negócios legais de pequeno porte
Antes da prisão, Capitão Guimarães, Anísio e Turcão costumavam viajar juntos para jogar no Uruguai,
nos EUA e nas Bahamas
LUIZ FERNANDO VIANNA
RAPHAEL GOMIDE
SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO
Embora não haja valores
confiáveis em um negócio ilegal e resguardado como o jogo-do-bicho, quem acompanha as
atividades dos contraventores
sabe que, hoje, o tradicional jogo representa uma parcela menor de seus lucros. Os bingos,
dos quais seriam os reais donos,
e os caça-níqueis hoje rendem
muito mais.
Só na operação de sexta-feira, em diversos endereços, a PF
(Polícia Federal) apreendeu
pelo menos R$ 16 milhões em
dinheiro vivo. Por que esse dinheiro não estava aplicado em
bancos, guardado no exterior?
O Ministério Público Federal
avalia que era com parte dessas
notas que os bicheiros pagavam
seus "pedágios" para representantes das polícias federal e estadual, magistrados, promotores, políticos. Outra razão para
ter tanto dinheiro em casa é o
fato de que o eventual depósito
desse montante em bancos teria origem injustificável.
Antes da prisão, há nove dias,
Aílton Guimarães Jorge (Capitão Guimarães), Aniz Abrahão
David (Anísio) e Antônio Petrus Kalil (Turcão) costumavam viajar juntos para jogar em
Punta del Leste (Uruguai), onde teriam participação acionária no cassino Conrad.
Também viajavam para jogatinas em Atlantic City (EUA) e
nas Bahamas. Guimarães e Anísio estariam fechando novo negócio do gênero: um cassino em
Quito, no Equador. Empresários do ramo, são também, desde a juventude, entusiastas das
apostas a dinheiro. Toda a semana se reúnem para rodadas
de carteado.
Quando foram condenados
em 1993 pela juíza Denise
Frossard a pena de seis anos de
prisão -mais tarde reduzida
para três anos- por formação
de quadrilha armada, os bicheiros ainda tinham muitos bens
"a descoberto", em seus nomes.
Do processo até 1998, quando foi aprovada a lei 9.613, que
pune a lavagem do dinheiro,
transferiram propriedades, o
que fica claro na seqüência de
vendas de bens registrada em
cartórios por Turcão.
Com sua experiência de oficial do Exército, Guimarães é o
cérebro da "holding". Ele assumiu o lugar de Castor de Andrade (morto de doença em 1997)
no comando da organização
criminosa. Anísio é o mais articulado, com bom trânsito com
políticos e policiais. É, dos bicheiros presos, o mais próximo
da figura mítica do malandro
carioca.
Segundo a Junta Comercial
do Estado do Rio, Anísio é sócio
oficialmente de apenas uma
empresa: o Beverly Hills Motel
Ltda., em Nova Iguaçu (cidade
na Baixada Fluminense), do
qual detém 17% das ações -os
irmãos Farid e David detêm outros 33%.
O dado contrasta com os sinais exteriores de riqueza. Entre os imóveis em seu nome estão uma cobertura triplex em
Copacabana (zona sul do Rio),
outra na Barra da Tijuca (zona
oeste), uma mansão em Piratininga, bairro nobre na orla de
Niterói, e outra mansão em Nilópolis, na Baixada. Irmãos e filhos seus têm apartamentos na
Barra da Tijuca.
Quando prendeu Anísio, a PF
encontrou no apartamento de
Copacabana US$ 47 mil em dinheiro, 19 relógios, 75 anéis,
137 brincos e 39 pulseiras, entre outras jóias. Em razão de irregularidades no Imposto de
Renda, Anísio é réu de processo
criminal aberto em 2006, que
corre em segredo de Justiça.
Capitão Guimarães tem poucos imóveis, mas todos valorizados: um apartamento de cobertura na praia de Icaraí, em
Niterói; uma propriedade de
veraneio na região oceânica do
município; um apartamento
duplex, também em Niterói,
junto ao MAC (Museu de Arte
Contemporânea), obra do arquiteto Oscar Niemeyer.
Oficialmente, trabalha como
agente financeiro -assim define sua ocupação em documentos. Mas, na Junta Comercial,
seu nome não aparece como
proprietário ou sócio de qualquer empresa.
De acordo com certidão do
órgão, Guimarães é apenas administrador de duas companhias ligadas ao mundo do
samba: a Gravadora Escola de
Samba Ltda. e a Editora Musical Escola de Samba Ltda., ambas pertencentes a representantes das principais escolas
que desfilam no Sambódromo
durante o Carnaval.
Para limpar o dinheiro ganho
na contravenção, segundo policiais federais, Turcão utiliza
uma rede de empreendimentos
que tem à frente o luxuoso Tio
Sam Hotel & Fitness -cujo nome comercial é Amteas Praia
Hotel Ltda. (capital social de
R$ 4 milhões, R$ 1,6 milhão de
Turcão).
Outras empresas são a Gourmet Comércio Alimentício
Ltda. ME, (com capital de R$
30 mil), a Therezinha Calil Representações Ltda. ME (capital
social de R$ 100 mil) e a Cellular Conection Comércio, Representações e Serviços Ltda
(Cr$ 13,7 milhões, em 1993, ou
R$ 494.910,00, atualizado pelo
IGP-M).
Texto Anterior: Lobby do bicho aprovou projeto de lei no Senado Próximo Texto: Aos 82, Turcão já não comanda os negócios da família Índice
|