São Paulo, segunda-feira, 22 de novembro de 2004

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CELSO FURTADO - A DESPEDIDA

Cerca de cem pessoas foram à cerimônia em cemitério no Rio; Stedile e Suplicy pediram mudança na política econômica do governo federal

Sem Lula, Furtado tem enterro discreto

DA SUCURSAL DO RIO
DO ENVIADO AO RIO

O economista Celso Furtado foi enterrado por volta do meio dia de ontem no mausoléu da ABL (Academia Brasileira de Letras) no cemitério São João Batista numa cerimônia discreta, que reuniu cerca de cem pessoas, entre amigos e políticos. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cuja presença chegou a ser anunciada pelo senador Eduardo Suplicy (PT-SP), não compareceu nem mandou representante ao enterro.
A Secretaria de Imprensa da Presidência da República afirmou que Lula se pronunciou sobre a morte por meio de nota oficial e decretou três dias de luto. O ministro Jaques Wagner e senador Aloizio Mercadante (SP) representaram o presidente no velório.
Em junho, Lula foi vaiado no velório do fundador do PDT, Leonel Brizola. O presidente ficou menos de cinco minutos na cerimônia.
Do governo federal, estavam presentes o ministro Waldir Pires (Controladoria Geral da União), amigo de Furtado, e Bernardo Appy, secretário-executivo do Ministério da Fazenda, representando Antonio Palocci. A prefeita Marta Suplicy representou o PT.
A jornalista Rosa Freire D'Aguiar, viúva de Furtado, disse que a ausência de Lula não a magoou. "Com sinceridade, não me importei com isso. Não fiquei [magoada] nem o Celso ficaria. Gostei da declaração de Lula [em nota oficial no sábado] e da do ministro José Dirceu [Casa Civil]."
Questionado sobre quem representava o governo no enterro, Waldir Pires disse: "Todos nós".
Furtado, autor do clássico "Formação Econômica do Brasil", morreu de infarto anteontem no Rio, aos 84 anos.

Críticas ao governo
No velório, o coordenador nacional do MST João Pedro Stedile e Suplicy pediram que suas idéias sirvam como motivação para o governo federal fazer mudanças na política econômica. "Espero que os economistas de plantão honrem a memória de Furtado, mudem a política para que ela não seja só para beneficiar banqueiros e transnacionais, mas para revolver os problemas concretos do povo", disse Stedile.
Para Suplicy, era "extremamente saudável" a insatisfação de Furtado com a política econômica: "Celso Furtado está aqui dizendo, ainda com muita força, ao presidente Lula, ao ministro Palocci, a todos os que o admiram: tratem de promover o desenvolvimento, tratem de combater a inflação, mas com o crescimento da economia, com aumento de oportunidade de emprego, e fazendo o que há anos ele vinha dizendo, que é fazer a economia crescer e erradicar a pobreza simultaneamente".
O prefeito do Rio, Cesar Maia (PFL), mencionou a dificuldade de encontrar alternativas à política econômica. "[Nos anos 50 e 60] tinha-se a certeza de que a América Latina tinha caminho próprio. Esse ciclo se vai com Furtado num momento difícil para as economias latino-americanas."
Também compareceram ao enterro os ex-presidentes do BNDES Carlos Lessa e Antônio Barros de Castro. Guido Mantega, atual presidente do banco, esteve no velório, mas não foi ao cemitério.
No velório, Lessa entregou à viúva a bandeira nacional que recebera na sexta-feira em ato público de desagravo a sua demissão. O caixão foi coberto com ela e deixou a sede da ABL às 11h10 em carro aberto dos Bombeiros.
O padre e acadêmico Fernando Ávila chorou ao fazer uma prece. O presidente da Associação Nacional de Anistiados Políticos, Aposentados e Pensionistas, Nilson Venâncio, cantou o Hino da Independência e foi aplaudido. O historiador José Murilo de Carvalho e o escritor João Ubaldo Ribeiro foram ao enterro. A economista Maria da Conceição Tavares, que esteve no velório, não foi.
Ao final do velório, Marta irritou o presidente da ABL, Ivan Junqueira, ao discursar em um microfone, ao pé do caixão. Ele pediu que as manifestações fossem deixadas para o momento do sepultamento. A prefeita voltou ao microfone e anunciou que a partir de hoje a ponte do Morumbi, em São Paulo, vai se chamar ponte Celso Furtado. Junqueira, em seguida, disse baixo, a colegas, que ali "não era lugar disso".
O registro de candidaturas para a cadeira de Furtado na ABL começará a ser feito na quinta.


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