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Papéis detalham pós-guerra, dizem analistas alemães
ÉRICA FRAGA
ENVIADA ESPECIAL A BERLIM
Na Alemanha, a notícia da
divulgação de documentos
inéditos pela Folha que
mostram a trajetória do médico nazista Josef Mengele
no Brasil foi vista como um
passo importante para a reconstrução da história posterior à Segunda Guerra.
Historiadores e representantes da comunidade judia
avaliaram o conteúdo de
cartas e do diário de Mengele como confirmação de que
ele faz jus à sua fama de "encarnação do demônio".
"Biografias já apontavam
para o fato de que ele nunca
se arrependeu do que fez. Esses outros documentos são
importantes porque reforçam a percepção de que uma
minoria de nazistas não mudou suas idéias em nem um
centímetro", disse Estephan
Malinowski, professor de
história da Universidade Livre de Berlim.
Segundo Malinowski, outro motivo da importância
de se esclarecer a trajetória
de figuras importantes do
partido nazista que se refugiaram na América Latina é
mostrar o papel da região na
história do pós-guerra.
"Alguns países, como a Argentina, permitiram que essas pessoas criassem um "paraíso sul-americano nazista",
no qual tiveram espaço para
se manter fiéis aos seus princípios e ideais, muitas vezes
impunemente", afirmou.
David Gal, que publica a
revista haGalil -revista eletrônica voltada para a comunidade judia na Alemanha-, recebeu a notícia da
descoberta dos pertences de
Mengele "com forte emoção", segundo ele próprio:
"É incrível confirmar que
ele nem mesmo se arrependeu do que fez. Mengele foi
um homem muito frio. Ele
não ficou sentado em uma
sala dando ordens, ele participou diretamente de tudo,
ele esteve nas câmaras de
gás. Saber que ele nunca se
arrependeu de nada disso é
horrível. Eu fico chocado".
Segundo Gal, os documentos descobertos são fundamentais para a reconstrução
de um pedaço da história.
"Não sabemos o suficiente
sobre o que aconteceu."
Neonazismo
Gal diz, no entanto, temer
que a divulgação dos pensamentos e das convicções de
Mengele sirvam como inspiração para os chamados
neonazistas. "Ao saber que
que ele nunca se arrependeu
essa nova geração de nazistas, que nos assusta muito,
pode se sentir incentivada.
Eles podem sentir que isso
fortalece suas crenças."
A preocupação não apenas
com os os movimentos neonazistas mas também com
outras tendências ideológicas de extrema direita segue
forte na Europa.
Malinowski destaca uma
vertente de "preconceitos
culturais" que surge até entre os partidos de esquerda.
Ele cita como exemplo a resistência em se aceitar a Turquia-país muçulmano-
na União Européia.
"Os argumentos usados
quando se fala em Turquia
não se limitam à religião, são
citadas também as diferenças culturais. É compreensível que essas discussões
ocorram, mas é preocupante." Ele diz crer que há uma
tentativa de frear esse tipo de
sentimento na Europa, mas
ressalta que é um processo
cujos desdobramentos são
de difícil previsão e que, provavelmente, se estenderão
por muitas gerações.
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