São Paulo, quarta-feira, 22 de novembro de 2006

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JANIO DE FREITAS

O aeroporto de Lula

Lula está confuso, porque se dedicou à conquista do 2º mandato sem se dedicar ao que deveria ser sua execução

A AGÊNCIA Nacional de Aviação Civil, que nos poupa com seu apelido de Anac, é que está preparando as relações políticas e a montagem ministerial do segundo mandato de Lula, assessorada por algumas figuras de comando da Aeronáutica.
Se algo aí lhe soa estranho, tenha paciência, mas é a única explicação adequada que encontrei para a confusão de atos estapafúrdios e palavras desatinadas que se sucedem, a começar do adiamento sugestivo do novo ministério para as vizinhanças do Carnaval.
Conforme as circunstâncias, Lula encobre a razão do adiamento com duas explicações, cujo maior mérito é a perfeita igualdade da improcedência. A primeira é de que será mais conveniente, na distribuição de cargos às forças partidárias, escolher ministros depois da eleição para a presidência da Câmara. É um raciocínio novo, caso seja raciocínio. Lula acha importante a permanência de Aldo Rebelo, sejam quais forem os candidatos que PMDB e PT apresentem, como prometem.
Ministros com um pé já na calçada nada valem nem nos seus gabinetes, quanto mais no Congresso, sede nacional da esperteza. Mas desde sempre se viu o quanto ministros recentes, ou com boa caixa, podem influir em eleições no Congresso, pela expectativa de retribuições suas no decorrer do governo.
Para manter Aldo Rebelo, e prevenir-se contra uma surpresa que nem precisaria ser outro Severino Cavalcanti, o que convém a Lula é a nomeação do ministério no prazo normal, enquanto a protelação só estende as disputas e desentendimentos que o perturbam tanto.
Na outra explicação, Lula diz que aguarda a nova dose de propostas para o crescimento econômico (a primeira foi "insuficiente"), para então escolher os mais indicados a aplicá-las. Se os ministros escolhidos tiverem qualidade para dar contribuições ao plano, terão chegado tarde. Ou se limitam a cumprir a receita recebida ou os planos voltam a ser elaborados, e trabalho e tempo anteriores deram em desperdício por conta do país.
O sensato tem sido, não só em planos e implementações governamentais, partir de objetivos claros e montar equipes capazes de planejar e executar o caminho até eles.
Assim podemos sair das explicações marotas para o que faz mais sentido, na motivação do adiamento. É a soma de dois fatores que se tornaram óbvios. Lula está confuso, parece mesmo absolutamente confuso, porque se dedicou à conquista do segundo mandato sem dedicar sequer um minuto ao que deveria ser a sua desejada execução. Não foi só um programa, propriamente, que faltou. Faltou tudo. Lula não tem idéia do que fazer, apenas sente que seu governo foi e é economicamente vergonhoso. Desse sentimento dá prova todos os dias, com o incansável palavrório agora voltado para "o diferente" que será o segundo mandato, em relação ao primeiro.
Em tal situação, prevalece a dificuldade de Lula de tomar decisão. A reforma ministerial que fez, de meio de mandato, levou quase dez meses para consumar-se. O novo ministério já está protelado de novembro para fevereiro, sem previsão de que lá fique completo. Nenhum ministro atual, talvez com duas exceções, sabe se fica ou se vai. Parado até hoje, parado continuará o governo pelo novo ano a dentro. Parado, mas em plena balbúrdia, como os aeroportos.


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