São Paulo, quarta-feira, 22 de dezembro de 2004

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ELIO GASPARI

Uma cartinha de Lula Noel

Um teste para curiosos:
Os presidentes do Brasil e dos Estados Unidos, na defesa do progresso de suas sociedades, escreveram cartas a alguns milhões de cidadãos.
Um escreveu aos jovens que conseguiram as melhores notas nos colégios onde estudavam: "Vejo com satisfação que estudantes excepcionais como você vão nos ajudar a conduzir o país (à). Fique com o meu estímulo para continuar buscando altos objetivos, acreditando em você".
O outro presidente escreveu aos aposentados e pensionistas da Previdência avisando-os de que foi criada uma linha de crédito que lhes oferece empréstimos a juros camaradas: "Esperamos que essa medida possa ajudá-lo a atender melhor às necessidades do dia-a-dia. Por meio de ações como essa o governo quer construir uma Previdência Social mais humana, justa e democrática".
O país onde o presidente oferece dívidas para o "dia-a-dia" (a juros de 1,75% ou 2% ao mês) é o Brasil. Nos Estados Unidos, onde os juros dos carros novos estão a 6% ao ano, o presidente não é doido de aparecer na casa dos outros oferecendo empréstimos como se eles fossem uma realização do seu governo. Na carta do presidente americano não há referência ao tal de "governo".
À custa da Viúva, Lula e o ministro Amir Lando, do PMDB e da Previdência, escreveram aos aposentados de todo o país informando:
"Em maio passado o governo federal encaminhou ao Congresso um projeto de lei para permitir aos aposentados da Previdência Social acesso a linhas de crédito com taxas de juros reduzidas.
Agora, o Legislativo aprovou o projeto e acabamos de sancioná-lo. Com isso, você e milhões de outros beneficiários(as) passam a ter o direito de obter empréstimos cujo valor da prestação pode ser de até 30% do seu benefício mensal".
O cidadão que recebe um benefício de R$ 360 por mês (10% da aposentadoria de vítima da ditadura que a Viúva paga a Lula) pode tomar cerca de R$ 100 emprestados. Amortizando-os em dez prestações, desembolsará pelo menos R$ 119. Nos juros da banca que não lhe empresta dinheiro pagaria pelo menos R$ 170. É bom negócio. Pena que esse mesmo dinheiro colocado na poupança do andar de baixo paga apenas R$ 7, enquanto rende o dobro nos fundos do andar de cima.
Há na carta de Lula o cheiro da propaganda. Esse é o aspecto mais velho e menos relevante da questão. Que o PT Federal faça o que criticava em Paulo Maluf (condenado a ressarcir a Viúva por uma emissão de cartas à custa da prefeitura) não chega a ser surpresa. O verdadeiro problema está no teste lá de cima. Foi fácil intuir qual presidente estimula estudantes bem sucedidos.
Um felicita o jovem cidadão pelos seus êxitos. O outro comporta-se como se fosse o construtor da Previdência. Dirige-se ao contribuinte como se estivesse a "ajudá-lo" emprestando-lhe dinheiro. Um lidera uma sociedade. O outro patrocina-a. Depois Lula oferece lições de moral à patuléia, dizendo que é preciso deixar de ver no Estado uma espécie de Paizão que vai resolver todos os problemas. Tudo bem se Lulão não se apresentasse no papel de Paizinho para oferecer emprestado um dinheiro que não é dele.

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