São Paulo, quinta-feira, 23 de março de 2000


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SAÚDE
Contratos sob suspeita totalizam R$ 4 milhões; sindicância apura
Hospital municipal fez compras superfaturadas

JOÃO BATISTA NATALI
DAVID FRIEDLANDER
da Reportagem Local


Um dos maiores hospitais da Prefeitura de São Paulo, o do Servidor Municipal, foi envolvido em desvio sistemático de dinheiro público na gestão Celso Pitta, segundo documentação obtida pela Folha. Estão sob suspeita contratos que até agora totalizam pouco mais de R$ 4 milhões. Entre 1997 e 1999, os recursos do hospital foram alvo de pelo menos dois tipos de operações fraudulentas.
Uma das ações consistia na compra superfaturada, em até 3.700%, de medicamentos e material hospitalar. Em outra frente, dirigentes do hospital pediam mais dinheiro do que realmente precisavam para quitar contratos com fornecedores.
O secretário da Saúde, Jorge Pagura, foi acusado por Nicéa Pitta, ex-mulher do prefeito, de estar por trás das irregularidades. Pagura nega, dá o troco e põe a própria Nicéa na linha de tiro.
O secretário instaurou duas comissões internas para fazer a varredura em compras suspeitas. Chegou ao nome de Hussein Hassan Yaktine, superintendente do hospital quando foi feita boa parte das operações superfaturadas.
Yaktine foi nomeado em junho de 1998 por indicação direta da ex-primeira-dama. Deixou o posto em abril do ano passado porque, segundo Pitta, era portador de um diploma falso em administração hospitalar.
Durante certo período o ex-superintendente foi tão próximo de Nicéa que chegou a estar entre os poucos convidados para um dos aniversários dela.
O superfaturamento esparramava-se por grande quantidade de compras miúdas.
Em abril do ano passado, por exemplo, o Hospital do Servidor adquiriu um lote de 600 drágeas do anti-hipertensivo Captoril, pagando R$ 0,44 cada comprimido. O mesmo remédio poderia ter sido comprado por R$ 0,01, ou 37 vezes mais barato, segundo lista de preços de fornecedores já licitados da Secretaria de Saúde.
Outros 600 comprimidos do diurético Lasix custaram ao hospital R$ 0,28 cada um. O preço correto, de acordo com a secretaria, seria R$ 0,02. A Folha constatou 16 dessas operações entre 98 e 99. Essas compras totalizaram R$ 115.779,00.
A estratégia usada era deixar acabar o estoque de determinado remédio, para comprá-lo em regime de urgência. Em um única vez foram comprados, nesse regime, 80 tubos da pomada oftalmológica Epitezan. Isso daria um terço de tubo para cada um dos 280 pacientes, inclusive aqueles que estivessem internados por problemas cardíacos ou ortopédicos.
O outro escoadouro de verba pública estava apoiado em contratos de valor inflado. Para pagar fornecedores, o Hospital do Servidor precisa fazer uma reserva de dinheiro no orçamento da Saúde. A fraude consistia em aumentar os valores na hora de informar quanto iriam precisar para fazer os pagamentos.
A Folha teve acesso a uma lista de contratos entre o Hospital do Servidor e 57 fornecedores. Procurou, aleatoriamente, seis dessas empresas para conferir se tinham recebido tudo aquilo que o hospital registrou.
Em três casos os valores estavam corretos, mas outras três empresas disseram ter recebido menos que o apontado pela planilha do hospital. Esses contratos, em conjunto, totalizam R$ 3,9 milhões.
Um exemplo. O laboratório Medifar, de Santos (SP), teria, segundo o hospital, R$ 35.190,00 para receber pela venda do antidepressivo Pamelor. Mas a nota fiscal que emitiu era de uma quantia bem menor: R$ 6.720,00. A diferença de R$ 28.470,00 ninguém sabe onde foi parar. O Ministério Público suspeita de que o mesmo esquema tenha funcionado nas cooperativas do PAS (Plano de Assistência à Saúde).
Informações recebidas pela Folha apontavam irregularidades em duas cooperativas do PAS, as de números 9 (Santo Amaro) e 10 (Campo Limpo).
Seus responsáveis, Roberto Tozze, para a primeira, e Márcio Joel Estevam, para a segunda, negaram tê-las cometido. Mas não forneceram, conforme lhes pedira o jornal, a relação dos contratos com laboratórios farmacêuticos e o valor pago por serviços ou cada lote de remédios ou material ambulatorial e hospitalar.


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