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CHOQUE ENTRE PODERES
Legislativo quer tutelar Judiciário, afirma Carlos Velloso
Para Supremo, CPI provoca
risco de desobediência civil
Ichiro Guerra/Folha Imagem
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O ministro Carlos Velloso, futuro presidente do STF, em entrevista |
FLÁVIA DE LEON
da Sucursal de Brasília
O futuro presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro
Carlos Velloso, disse que a instalação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para apurar
casos de corrupção e nepotismo no
Judiciário pode levar "descrédito"
às decisões de juízes e tribunais e
causar "desobediência civil".
"As pessoas precisam do Judiciário para resolver os seus conflitos.
Se o Judiciário ficar desacreditado,
podem ocorrer, inclusive, casos de
desobediência civil", disse ele ontem em entrevista à Folha.
Ele afirmou ainda que a proposta
de criação de uma CPI, feita pelo
presidente do Congresso, senador
Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), "no fundo reflete o desejo de
um Poder tutelar o outro Poder".
Velloso, que assumirá a presidência do Supremo em maio e estará à frente do tribunal no próximo biênio, defendeu que o Judiciário seja reformado e fez um apelo a
ACM para que os dois Poderes, Legislativo e Judiciário, procurem
juntos uma saída para os "verdadeiros problemas" da Justiça.
Para o ministro, a "maior mazela" do Judiciário é a lentidão. Ele
citou como principais causas da
morosidade da Justiça a "explosão
de processos" decorrente da Constituição de 1988, que "assegurou
novos direitos e facilitou o ingresso de recursos ao Judiciário", e as
possibilidades de recurso às decisões de juízes e de tribunais.
Além disso, afirmou que há poucos juízes no país. Enquanto na
Alemanha a proporção é de 3.000
habitantes para cada juiz, e a média mundial é de 7.000 habitantes
por juiz, no Brasil para cada grupo
de 30 mil pessoas há um único juiz.
Para resolver esse problema, Velloso defende cursos de especialização em magistratura para bacharéis e doutores em direito e a
melhoria dos salários. "Há juízes
da primeira instância passando
necessidades", disse.
Procurado pela Folha, o senador
ACM não foi localizado. À noite,
segundo a sua assessoria, ele estava viajando de São Paulo para Brasília. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Folha - Qual a sua opinião sobre
a abertura de uma CPI para investigar o Judiciário?
Carlos Velloso - O Poder Judiciário precisa de reformas, e os juízes
são os primeiros a fazer essa afirmativa. Reformas que deverão ser
feitas a partir da análise das necessidades do Judiciário. É preciso verificar qual o problema que constitui a mazela do Judiciário. Pesquisas de opinião têm indicado que o
problema básico é a lentidão, que
pode levar à ineficácia de prestação jurisdicional.
Então temos de estabelecer as
causas e equacionar as soluções.
Os problemas do Judiciário são estruturais, não pontuais. E, nesse
caso, uma CPI não seria capaz de
equacionar soluções. Uma CPI
desse tipo, generalizando acusações contra juízes, simplesmente
expõe o Judiciário à execração pública, levando o descrédito às suas
decisões. E isso não é bom para a
nação. As pessoas precisam do Judiciário para resolver os seus conflitos. Se o Judiciário ficar desacreditado, podem ocorrer, inclusive,
casos de desobediência civil. Como bem disse o editorial da Folha,
a proposta é extemporânea. No
fundo ela reflete o desejo de um
Poder tutelar o outro Poder.
Quero fazer um apelo ao senador
Antonio Carlos Magalhães, presidente do Congresso: para que ele
reflita quais são os problemas da
Justiça brasileira para que caminhemos juntos, se for o caso, para
darmos solução ao angustiante
problema da Justiça que é a lentidão.
Folha - E os casos de nepotismo e
corrupção falados pelo senador?
Velloso - Se está se falando em
nepotismo, em corrupção e em vagabundagem no Judiciário, vamos
curar esses males. Cumpre remeter à autoridade competente, às
corregedorias e ao Ministério Público, as denúncias. Tenho certeza
de que, se o STF tiver em mãos acusações sérias contra magistrados,
encaminhará a quem de direito.
Uma CPI enfraquece e desmoraliza instituições que devemos lutar
para fortalecer.
Folha - O advogado Dalmo Dallari classificou as afirmações de ACM
como "levianas e irresponsáveis".
Velloso - Prefiro acreditar que o
senador está agindo com idealismo, pensando em melhorar o Poder Judiciário. E é por isso mesmo
que novamente dirijo a ele um apelo: por que não agirmos em conjunto e procurarmos as soluções
para os verdadeiros problemas do
Judiciário?
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