São Paulo, segunda-feira, 23 de abril de 2001

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CÚPULA DAS AMÉRICAS

Senalca, organismo que fará debate entre governo e sociedade civil, reúne-se em Brasília

Brasil faz "cúpula" interna sobre Alca

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A QUÉBEC

O Brasil começa a definir no dia 9 como vai negociar a sua adesão (ou não) à Alca (Área de Livre Comércio das Américas), que, se vier de fato a ser constituída, será o maior bloco comercial do planeta, com seus 800 milhões de habitantes e uma economia de US$ 12 trilhões. Nesse dia, em Brasília, reúne-se a Senalca (Seção Nacional da Alca), o organismo incumbido de fazer a ligação entre o governo e a sociedade civil.
Para dar um sinal da importância que o Itamaraty concede à reunião, a presidência será do próprio chanceler Celso Lafer, quando o habitual é que encontros do tipo sejam conduzidos pelo embaixador Graça Lima, negociador-chefe do Brasil para assuntos de comércio internacional.
Já confirmaram presença representantes do empresariado, das ONGs , sindicatos e políticos.
A negociação da Alca termina em 31 de dezembro de 2004. 2005 será dedicado ao processo de ratificação pelos respectivos Parlamentos nacionais. A implantação se dará, portanto, a partir de 2006.
Por iniciativa de Mercadante, o Congresso também terá seu próprio calendário de preparação. Já foram convidados para depor o chanceler Celso Lafer, o embaixador Graça Lima e também o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, recém-demitido da presidência do Ipri (Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, o centro de estudos do Itamaraty), por ser crítico agudo da Alca. Estarão representadas no Congresso, portanto, as três visões da Alca: a política, por meio do chanceler, a técnica, pela voz de Graça Lima, e a de frontal oposição, com Pinheiro Guimarães. Mas, a julgar pela avaliação do próprio FHC, a preparação ainda é muito insuficiente para o tamanho do desafio.
O presidente diz que seu colega mexicano Vicente Fox lhe contou que, durante a negociação para o Nafta (o acordo de livre comércio com EUA e Canadá), o México tinha 150 negociadores. FHC acha que o Brasil hoje tem mais que isso, mas contabiliza os grupos do setor privado que se mobilizam eventualmente para debater a Alca. Acontece que no próprio empresariado há quem diga que o setor "está atrasado" na preparação para a Alca. É o caso de Paulo Tigre, presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiergs (a federação gaúcha das indústrias ).
O atraso, de todo modo, não é grave. A Cúpula de Québec, ontem encerrada, serviu acima de tudo para demonstrar que as divergências entre EUA e Brasil, os dois maiores países da Alca, permanecem, a rigor, do mesmo tamanho desde que se iniciou o processo, em 1994.
Fernando Henrique, aliás, explicitou as divergências no seu discurso de abertura da Cúpula, listando as condições para que o Brasil participe da área de livre comércio. Trata-se basicamente da abertura do mercado norte-americano, mas não apenas pela derrubada de barreiras tarifárias. FHC quer que acabe também o protecionismo disfarçado, por exemplo, de antidumping.
Em conversa com jornalistas brasileiros, o presidente dizia que o objetivo fora "mandar um recado no mais alto nível".
O recado funcionou em favor da posição brasileira. "Os temas que Cardoso colocou são de fato os temas-chave da negociação", diz o presidente chileno Ricardo Lagos.
Como as condições que o Brasil listou são igualmente as condições do Mercosul, tem-se que a posição do governo brasileiro conta com o respaldo de dois dos três países latino-americanos que mais influem em negociações hemisféricas (Argentina e Chile).
Sobra o México, cujo chanceler, Jorge Castañeda, também elogia o discurso de FHC, mas que não tem muito interesse na Alca porque já goza de acesso privilegiado ao mercado dos EUA, via Nafta.
Nesses termos, a discussão que se abre com a reunião da Senalca pode ter como grande foco de divergência não a posição negociadora do Brasil, mas algo que a antecede: a participação ou não na Alca. Se depender só de FHC, a participação, nas condições expostas, é não só inevitável, mas desejável. "Qual país hoje é autárquico? Nem Cuba", diz FHC.



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