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ENTREVISTA DA 2ª/LUIZ MARINHO
"Previdência tem de conter explosão de pensões por morte"
Ministro afirma que reforma em debate não atingirá atual geração de trabalhadores, mas defende ajustes no curto prazo
JULIANNA SOFIA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O GOVERNO quer mudar as
regras de concessão das
pensões por morte pagas
pelo INSS. Há menos de um
mês na Previdência, o ministro Luiz
Marinho disse à Folha que existe uma
"explosão" nesses benefícios e propõe
a revisão das regras paralelamente à
reforma previdenciária que ele defende apenas para o longo prazo. Hoje a
Previdência paga cerca de 6 milhões
de pensões. Só no ano passado, 144
mil novos benefícios foram somados
ao estoque. Não há uma estimativa total do gasto. Segundo o ministro, as
mudanças devem combater, por
exemplo, o problema com as "viúvas
jovens". "Acho que na situação de uma
jovem que ficar viúva, sem filhos, ela
faz jus a uma indenização. Não a um
benefício para o resto da vida", afirma.
De seu novo gabinete -no oitavo andar do mesmo prédio
em que comandava o Ministério do Trabalho-, Marinho disse que a reforma da Previdência para o longo prazo não atingirá a atual geração de trabalhadores e não será mais um "remendo". Será acompanhada,
porém, de uma fase de ajustes
na legislação com efeitos imediatos. Além das pensões, o ministro quer novamente alterar
as normas do auxílio-doença.
Marinho descarta a idéia do
Ministério da Fazenda de leiloar a folha de pagamento do
INSS, mas admite que conversará com os bancos para mudar
o atual sistema. Hoje, a Previdência paga à rede bancária para prestar os serviços aos aposentados. A intenção é deixar
de gastar e, se possível, passar a
receber dos bancos.
Marinho se declara "chateado" com os aposentados que o
acusaram de ter machucado
manifestantes em um protesto
na frente do ministério durante
a saída do carro oficial. "O pessoal veio agredir o carro", afirma, atribuindo o incidente a
uma "falha de assessoria".
Na entrevista, ele, que é ex-presidente da CUT, também
nega que haverá um processo
de "cutização" do Ministério da
Previdência. "Isso não existiu
quando assumi o Trabalho e
não existirá aqui."
FOLHA - O que mudará na equipe
do Ministério da Previdência com
sua vinda para cá?
LUIZ MARINHO - Vão sair só os
que desejarem. A equipe é equipe de governo. Não tem por que
mudar. No Ministério do Trabalho não mudei absolutamente ninguém, a não ser os que
saíram para acompanhar o [Ricardo] Berzoini [seu antecessor]. Aqui é a mesma coisa. Alguns profissionais vão acompanhar o Nelson Machado [ex-ministro que será secretário-executivo do Ministério da Fazenda] e serão substituídos. No
mais, a equipe está mantida.
Evidente que está mantida se o
titular achar que está dando o
resultado esperado.
FOLHA - Há boatos de que estaria
havendo uma pressão pela "cutização" [ocupação de cargos pela CUT]
da Previdência?
MARINHO - Desconheço. Isso
não existiu quando assumi o
Trabalho e não existirá aqui. Se
existe pressão, desconheço.
FOLHA - O sr. comandará a segunda reforma da Previdência do governo Lula. Qual é a reforma que busca?
MARINHO - O modelo vai ficar
claro no decorrer do debate do
fórum [Nacional da Previdência Social]. O que eu procuro é
acalmar os trabalhadores que
muitas vezes se preocupam, e
com razão, quando se fala em
reforma. Todo mundo se coloca
apavorado: "Será que a reforma
vai tirar direitos?". É assim que
o cidadão reage sentado lá na
poltrona quando vê televisão.
Precisamos fazer uma reforma
que não seja mais um remendo.
Reforma da previdência em
país nenhum do mundo se resolve no curto prazo. Ela se resolve no longo prazo. É com esse olhar que estamos conduzindo o debate e precisamos passar uma mensagem que tranqüilize os trabalhadores que estão no mercado há 10, 20, 30
anos. Será que agora que estou
próximo de me aposentar vou
ter esse direito adiado?
Isso não vai acontecer. Não
há no governo a idéia de fazer
uma reforma que venha a atingir os atuais trabalhadores. Temos que dar sustentabilidade à
Previdência, olhar para o perfil
demográfico do país e ir adequando as regras.
Se não fizermos adequações
para o futuro, lá na frente a Previdência vai estar estrangulada
e não vai ter condições de garantir cobertura previdenciária
para futuras gerações. A partir
desse conceito vamos fazer um
debate no fórum sobre qual
proposta adotar.
Queremos chegar à conclusão do fórum em agosto, para
em setembro ter uma proposta
elaborada para submeter à
apreciação do presidente Lula.
Se a proposta estiver redonda,
no conceito do governo e do
presidente, será enviada ao
Congresso. O Congresso é a autoridade para fazer mudanças.
FOLHA - Mas o sistema se sustenta
ao longo desses 30 anos?
MARINHO - Sim, se sustenta. Essa é a reforma do longo prazo.
Agora nós precisamos falar do
curto prazo, e no curto prazo
estamos trabalhando. O Nelson
começou e nós vamos dar continuidade, se for preciso adaptar algo, vamos adaptar, aperfeiçoar, sempre há espaço.
Esperamos que a unificação
das receitas dê maior efetividade na arrecadação e no combate à sonegação. Espero que a
Receita cumpra rigorosamente
esse papel. Cabe a nós dar continuidade ao trabalho de combate às fraudes, à melhoria do
cadastro. Estamos aperfeiçoando o cadastro. Também
vamos trabalhar o bom atendimento lá na ponta. Vamos ainda adequar alguma coisa na legislação, que também precisa
ser olhada no curto prazo.
FOLHA - Adequar o quê?
MARINHO - O auxílio-doença
para quem se afasta do mercado tem um valor maior do que o
que o trabalhador recebe em
atividade. Isso é uma distorção
construída no tempo, a partir
das equações da última reforma. É uma distorção que precisamos corrigir.
É preciso discutir no curto ou
no longo prazo a pensão por
morte, que tem uma inadequação que precisamos olhar. Há
uma explosão da pensão por
morte. É uma coisa que a sociedade terá que debater. A sociedade quer manter isso ou precisa mudar? Por exemplo, um casal em que ocorra uma morte e
fica uma viúva jovem, de 20 e
poucos anos. Ela vai ter uma
pensão vitalícia.
A sociedade acha que dá para
sustentar isso? Eventualmente
é uma viúva sem filhos. Eventualmente ganhava mais que o
marido. Mesmo assim faz jus ao
benefício e pode arrumar outro
casamento, e o benefício não
cessa. Acho que, na situação de
uma jovem que ficar viúva sem
filhos, ela faz jus a uma indenização. Não a um benefício para
o resto da vida. São coisas que a
sociedade tem que discutir, e
não meramente o governo, que
levanta o debate.
FOLHA - Especialistas relatam que
em outros países o benefício não é
integral, nem é permitido acumular
com uma outra aposentadoria.
MARINHO - São essas questões
que temos de discutir. Tem que
adequar ou não? A reforma se
coloca em dois tempos. Essas
inadequações estão colocadas
na nossa geração. Nós precisamos então discutir no curto e
no médio prazo. A sustentabilidade requer, por exemplo, a
eventual fixação de uma idade
mínima para a atual geração?
Não. Não está colocado esse debate. São duas etapas completamente diferentes. No curto
prazo, somente inadequações.
Não tem mudanças de regras
para o curto prazo.
FOLHA - O governo também quer
rever a renúncia previdenciária?
MARINHO - Temos que organizar a contabilidade da Previdência. Se tem renúncia fiscal,
o Tesouro tem que compensar
a renúncia e, portanto, deixa de
ser déficit. Os trabalhadores
não podem ser vítimas desse
processo, se o Estado brasileiro
tomou a decisão de desonerar
um setor industrial.
Não pode ser simplesmente
dito: a Previdência que se vire.
Isso tem de ser contabilizado
como recurso que entra e o Tesouro paga. A Previdência não
pode ser sacrificada.
Outra questão são as filantrópicas. Não tenho absolutamente nada contra, o que não
dá é para a Previdência pagar a
conta. O Ministério da Educação considerou uma instituição
filantrópica, então ele tem que
reembolsar a Previdência daqueles recursos de renúncia.
O mesmo vale para a saúde e
a assistência. Estou propondo
que a gente rediscuta a questão
da filantropia, não para não ter
a filantropia, mas a Previdência
não pode ser sangrada.
FOLHA - E os clubes de futebol?
MARINHO - A Previdência não
pode ser sangrada por isso. Se
tem renúncia fiscal, o Tesouro
tem que reembolsar a Previdência. Não quero entrar no
mérito, mas tira do meu colo.
FOLHA - O governo vem negociando com aposentados uma pauta extensa. Será possível antecipar metade do 13º para julho como pedem?
MARINHO - Estou seguro de que
vamos conseguir antecipar
neste ano o 13º para o mesmo
período do ano passado [setembro]. Para julho acho que
neste ano talvez não será possível. Vamos continuar trabalhando. Se não der neste ano,
vamos trabalhar para o ano que
vem. Desejo fazer com que essa
questão do 13º a gente crie condições de assumir um compromisso com os aposentados, não
estou assumindo ainda o compromisso de se tornar algo permanente, para não ter que ficar
todo ano discutindo a mesma
coisa. O aposentado aí saberá
que todo ano naquele mês pode
contar com metade do 13º.
FOLHA - Na quinta-feira, o sr. viveu
um incidente com um grupo de aposentados que afirmam que o carro
oficial em que o sr. estava atropelou
manifestantes. O que aconteceu?
MARINHO - Eu sinceramente
não entendi. Dizer que eu não
tenho espaço para o diálogo?
Todos são testemunhas de que
eu tenho. Ontem [quinta-feira]
não tinha agenda marcada com
os companheiros. Estava saindo atrasado para uma audiência no Palácio do Planalto. Eu
nem sabia da manifestação. Foi
uma falha de assessoria, que
merece um puxão de orelha.
Se eu soubesse, não sairia no
meio da manifestação. Se estou
com tempo, saio, mas sem tempo não vou sair para causar
eventual tumulto. Eu saí, cumprimentei e entrei no carro.
Quando estou saindo, o pessoal
veio agredir o carro. Uma
agressão inexplicável. Estou
profundamente chateado com
esse troço. Como é que pode
um incidente gratuito desses?
O carro saiu cantando pneu,
disseram eles. É conversa mole.
FOLHA - O Tesouro Nacional tem
um projeto de leiloar a folha de pagamento do INSS, a exemplo de alguns Estados que leiloaram a folha
do funcionalismo. O que o sr. acha?
MARINHO - É completamente
diferente. O assunto vai avançar, mas não no modelo que o
Tesouro deseja. Não justifica,
de fato, a Previdência pagar o
que paga aos bancos. Mas talvez a saída não seja o modelo de
leilão que o Tesouro quer. Vamos discutir e encontrar uma
solução. Nós vamos chamar os
bancos para negociar isso.
O leilão é discutível. Vamos
conversar com o Tesouro para
encontrar uma outra equação
que atenda ao objetivo que está
colocado, que é legítimo. Não
pagar e receber, se possível.
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