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MEMÓRIA
Presidente ficou apenas 12 minutos no local; segurança pediu que ele se retirasse
Lula é recebido aos gritos de "traidor" em velório de Brizola
DA SUCURSAL DO RIO
Os gritos de "traidor" e vaias dirigidos ao presidente Luiz Inácio
Lula da Silva marcaram o velório
do governador e presidente do
PDT, Leonel de Moura Brizola,
morto aos 82 anos anteontem de
infarto agudo do miocárdio.
Acompanhado de sete ministros, Lula chegou às 13h28 ao salão principal do Palácio Guanabara, sede do governo do Rio, onde
o corpo estava sendo velado. Mas
só ficou quatro minutos ao lado
do caixão, em razão do protesto.
"Traidor, traidor", gritaram
cerca de 300 militantes do PDT
quando Lula e José Dirceu (Casa
Civil) entraram no salão, vindos
do gabinete da governadora Rosinha Matheus (PMDB). Familiares
de Brizola e políticos do PDT pediam silêncio, sem sucesso, com
as mãos. "Brizola presente, é o
nosso presidente", insistiam.
Pouco mais de três metros separavam Lula e os ministros dos
manifestantes. Uma corda e dezenas de seguranças impediam a
aproximação. Houve empurra-empurra. Ciro Gomes foi o único
dos ministros que ficou ao lado
do caixão de Brizola por alguns
minutos. A segurança pediu que o
presidente e os ministros se retirassem, temendo pelo rompimento do cordão de isolamento.
Lula retirou-se sob mais gritos
de "traidor". Depois que o presidente cruzou a porta de volta ao
gabinete de Rosinha, os pedetistas
cantaram um samba de Jorge
Aragão e Dida, tornado hino da
oposição à gestão Lula. "Você pagou com traição a quem sempre
lhe deu a mão", no refrão de "Vou
Festejar", sucesso na voz de Beth
Carvalho, pedetista. Alguns militantes ainda puxaram o coro de
"cachaceiro" após a saída de Lula.
Rosinha e o secretário de Segurança, Anthony Garotinho,
acompanharam Lula e Dirceu até
os jardins de inverno do palácio,
onde a presença do público não
era permitida. Na despedida, Lula
abraçou Garotinho e beijou Rosinha e uma de suas filhas, Clarissa.
Questionado pela Folha sobre
os gritos de traidor a ele dirigidos,
Lula abriu os braços, franziu o cenho e se limitou a dizer: "É normal, é normal". Às 13h40, 12 minutos após ter chegado, entrou no
carro que o levou ao helicóptero
com o qual foi para a Base Aérea
do Galeão, de onde embarcou para os EUA. Lula atrasara seu embarque por causa do velório.
O pedetista e o atual presidente
mantinham uma relação instável,
ora aliados, ora adversários. Brizola apelidou Lula de "sapo barbudo". E o petista havia afirmado
que o pedetista "pisaria na própria mãe" para ser presidente.
Na saída, Dirceu resumiu o espírito da comitiva presidencial
em relação ao protesto: "Faz parte
do jogo", disse. Antonio Palocci
(Fazenda) também relevou a manifestação. "Era esperado. Comentamos com o presidente que
isso poderia acontecer."
Um dos principais alvos das críticas recentes de Brizola, que condenava a política econômica que
acreditava subordinada ao mercado financeiro, Palocci elogiou o
pedetista. "Sempre refletiu a opinião de um brasileiro preocupado
com os destinos do país e com a
democracia. As diferenças existiam e sempre as respeitamos."
Ciro Gomes voltou ao salão
principal acompanhado da mulher, a atriz Patrícia Pillar, sem ser
vaiado. ""Há aqui pessoas apaixonadas e chocadas com a morte de
Brizola, mas, voltando para casa,
vão perceber a grosseria que fizeram com o presidente Lula e com
o próprio Brizola", avaliou Ciro.
"Os dois lutaram juntos a vida toda, e, neste momento, é descabido
ajuizar quem tem razão."
A prefeita Marta Suplicy (SP)
também foi hostilizada por pedetistas. E Garotinho foi chamado
de traidor por alguns militantes.
Carlos Luppi, vice-presidente
do PDT, condenou a reação dos
brizolistas: ""Num velório, o silêncio é o maior instrumento de homenagem. Foi um desrespeito à
figura de Brizola".
O pré-candidato do PDT à sucessão paulistana, Paulo Pereira
da Silva, o Paulinho, no entanto,
justificou a reação dos militantes:
"É reflexo da traição do Lula ao
Brizola e ao povo brasileiro".
O velório começou às 8h. O corpo chegou ao palácio por volta
das 4h30. Às 8h de hoje, será levado ao Ciep (Centro Integrado de
Ensino Público) Tancredo Neves,
o primeiro a ser construído, que
se tornou obra-símbolo dos dois
mandatos de Brizola no governo
do Rio (1983-1986 e 1991-1994).
Às 11h, o corpo segue para Porto
Alegre (RS), onde haverá outro
velório, no Palácio Piratini, que
Brizola também ocupou como
governador entre 1959 e 1962.
O enterro será amanhã em São
Borja (a 583 km de Porto Alegre),
às 16h, no mesmo cemitério em
que estão a mulher de Brizola,
Neusa, e os presidentes Getúlio
Vargas (1930-1945 e 1951-1954) e
João Goulart (1918-1976).
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