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Apoio de petistas a Sarney é insustentável, diz Marina
Senadora compara disputa contra candidatura do PT a luta entre Davi e Golias
Ela diz que nunca defendeu o criacionismo e, ao falar
da descriminalização do aborto, afirma que questões de fé devem ser respeitadas
Alan Marques/Folha Imagem
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A senadora Marina Silva (AC), que na última semana anunciou sua saída do PT, em seu gabinete
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Um dos argumentos que a senadora Marina Silva (AC) ouviu para não sair do PT foi que o
lançamento de sua candidatura
à Presidência poderia inviabilizar o "projeto histórico" do partido no qual militou por quase
30 anos. Lançou mão de personagens da Bíblia para comparar
a candidatura Dilma Rousseff e
uma candidatura pelo PV à luta
entre o gigante Golias e Davi.
Na Bíblia, Davi vence. Marina, 51, insiste em que a decisão
sobre sua eventual candidatura
só será anunciada em 2010.
FOLHA - Antes de mudar de partido, a sra. mudou de religião, de católica para evangélica. No ano passado, equiparou a teoria da evolução
de Charles Darwin ao criacionismo,
que atribui a origem da vida a Deus.
Entre fé e ciência, a sra. fica com a fé?
MARINA SILVA - Houve um completo mal-entendido. Fui dar
palestra em uma universidade
adventista, que é uma faculdade confessional. A legislação
brasileira permite as escolas e
as faculdades confessionais,
que têm o direito de fazer a
abordagem do ensino a partir
da perspectiva religiosa.
Um jovem me perguntou o
que eu achava de as escolas adventistas ensinarem o criacionismo. Respondi que, desde
que ensine também a teoria da
evolução, não vejo problema.
A partir daí, as pessoas começaram a dizer que eu estava defendendo o criacionismo. Sou
professora, nunca defendi essa
tese e nem me considero criacionista. Porque o criacionismo
é uma tentativa de explicação
como se fosse científica para
responder a questão da criação
em oposição ao evolucionismo.
Apenas acredito em Deus, é
uma questão de fé. Nunca tive
dificuldade em respeitar e me
relacionar com os ateus, com
pessoas que professam outras
crenças ou outra forma de pensar diferente da minha.
FOLHA - E essa fé a impede de discutir questões como a descriminalização do aborto?
MARINA - Questões de fé e as
convicções de cada um devem
ser respeitadas. Não me envergonho de dizer que sou cristã e
jamais tergiversaria sobre minha fé para ganhar simpatia de
quem quer que seja. Seria capaz
de perder todos os votos, de
nunca mais ser eleita, mas nunca faria um discurso fácil.
FOLHA - O PV já prepara festa para
a sua filiação no dia 30. A sra. já disse
que todos os partidos têm problemas. Qual é o maior do PV?
MARINA - O primeiro deles é
que o partido teve de se abrir
para evitar perder o registro.
Algumas pessoas se filiaram e
até se elegeram sem identidade
programática.
FOLHA - O presidente do PV disse
ter feito o convite à sra. para ser candidata ponderando que haveria
muitas limitações de dinheiro e de
espaço na televisão. Com quanto dinheiro se faz uma campanha?
MARINA - Não sou candidata
ainda, isso é em 2010. E tenho
consciência dessas limitações.
Inclusive, quando alguns companheiros me perguntavam como eu me sentiria se, porventura, a minha saída inviabilizasse
o projeto histórico do PT, sobretudo na questão da inclusão
social, eu dizia: acho que vocês
estão superestimando.
Se comparar o tempo de TV
da candidatura do PT -o que
significa o Bolsa Família, o
PAC, o Luz para Todos, o que
significa (o programa) Minha
Casa, Minha Vida, ter um presidente com 80% de credibilidade, ter palanques de A a Z em
5.000 municípios, com uma
militância de 1,6 milhão de filiados- com a de um partido
pequeno, com menos de dois
minutos na TV, sem palanques,
é como se fosse uma luta de Golias contra Davi.
Como não imagino que a candidatura do PT é Golias e nem
tenho a pretensão de ser o Davi,
só posso imaginar que a minha
funda vai se lançar contra o Golias da desesperança, do pragmatismo. Tenho experiência
nisso. Se fosse fazer cálculo em
termos pragmáticos, nunca teria feito nada. O esforço é por
aquilo que significa em termos
de semeadura.
FOLHA - O que não é sustentável
hoje no Brasil?
MARINA - O próprio modelo de
desenvolvimento, que tem origem numa visão equivocada de
que os recursos naturais eram
infinitos. Temos de aprender a
lidar com essa limitação no
sentido de criar novas práticas,
novas oportunidades, nova relação de produção e consumo.
FOLHA - É sustentável o apoio do
PT a José Sarney?
MARINA - Isso já se mostrou insustentável por tudo o que está
acontecendo com o Congresso,
com o governo, com o PT, e
com o próprio presidente Sarney. No meu entendimento, o
melhor para a crise era o seu
afastamento temporário, inclusive como forma de preservar a
figura histórica de Sarney.
FOLHA - Como entram na agenda
da sustentabilidade os juros altos e a
independência do Banco Central?
MARINA - Os juros altos não são
sustentáveis, obviamente, sobretudo em um país que precisa continuar crescendo. O Banco Central, na realidade do Brasil, já tem essa independência.
FOLHA - A hidrelétrica de Belo
Monte e BR-319 são sustentáveis?
MARINA - Belo Monte está passando por um processo de licenciamento, que verificará se
ela é sustentável. A BR-319, eu
considero economicamente,
ambientalmente e socialmente
insustentável.
FOLHA - O programa nuclear brasileiro é sustentável?
MARINA - Nós temos outras
fontes de energia. Alega-se que
são caras. E, na verdade, são.
Mas a nuclear também é cara.
Com uma diferença: a energia
eólica e da biomassa são caras
mas são seguras, a nuclear é cara e não é segura.
FOLHA - Quão sustentável é o Bolsa Família?
MARINA - É um programa importante na promoção da inclusão social. O problema
apontado, com razão, é a questão da porta de saída, para que
as pessoas tenham uma integração produtiva e não dependam da bolsa. Mas só é possível
falar em porta de saída porque
teve porta de entrada.
Uma vez, uma pessoa reclamava que não quiseram fazer
uma faxina pelo valor que ela se
dispunha a pagar. "A culpa é
dessa Bolsa Família", dizia. Fiquei feliz, porque, se não tivesse o Bolsa Família, a pessoa se
aviltava a receber qualquer valor por seu trabalho.
FOLHA - O pré-sal é sustentável?
MARINA - Os combustíveis fósseis são insustentáveis. O pré-sal tem de ser visto com os cuidados para que não façamos a
apologia do recurso em si. É
preciso que parte dos recursos
obtidos sejam drenados para
compensar os danos ambientais das emissões de CO2.
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