|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
30 anos da Anistia
"Feridas da ditadura ainda estão aí", diz Tarso
Para ministro, revisão da lei é "olhar" o passado para "ver com clareza o futuro"
"Quando falamos em punir torturadores, não estamos dizendo que eles irão para a cadeia", afirma Tarso, mas que sejam "sentenciados"
PEDRO DIAS LEITE
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
Um dos principais defensores de uma revisão da Lei da
Anistia, o ministro da Justiça,
Tarso Genro, afirma que "as feridas abertas pela ditadura e
pela violência ainda estão aí".
Ele argumenta que a visão de
que os crimes da esquerda também seriam punidos é "completamente distorcida", porque
os militantes "não só foram todos punidos como muitos barbaramente torturados".
FOLHA - A Lei da Anistia completa
30 anos. Ela atingiu seus objetivos?
TARSO GENRO - O processo de
conciliação teve uma consequência extraordinariamente
positiva, que foi sairmos de
uma ditadura sem um choque
sangrento entre irmãos brasileiros. De outra parte, não é
uma Lei da Anistia que resolve
todo o problema. Mas o processo legal não conseguiu até agora gerar reconciliação plena. As
feridas abertas pela ditadura e
pela violência ainda estão aí.
Aqui no Ministério da Justiça tratamos numa ótica de reconciliação através da verdade
e da assunção de responsabilidade. Não é revanchista, mas
exige um olhar profundo sobre
o passado para que a gente possa ver com clareza o futuro.
FOLHA - Existe um argumento de
que, ao rever a tortura, também seriam revistos os chamados crimes de
terrorismo. Qual sua resposta?
TARSO - Essa é uma visão completamente distorcida do processo de anistia, porque parte
de uma premissa falsa. Pessoas
que cometeram delitos durante
o regime militar, todas elas foram julgadas e punidas. Não só
foram punidas como muitas foram barbaramente torturadas.
Quando estamos falando em
punir torturadores, não estamos dizendo que essas pessoas
irão para a cadeia, porque são
pessoas que normalmente têm
mais de 80 anos. Os fatos têm
de ser apurados e as pessoas
têm de ser sentenciadas.
FOLHA - O sr. defende que torturadores respondam pelos crimes, mas
não que sejam presos? Há torturadores que continuam a trabalhar na
máquina do Estado, como a Folha
mostrou recentemente.
TARSO - A consequência dessa
visão [de que torturadores não
devem ser punidos] é que pessoas como esse delegado tenham a coragem de dar entrevista reconhecendo que foi torturador e dizendo sobre uma
senhora que não a tinha torturado porque não torturava mulher feia. A tortura foi feita por
estruturas paralelas ao Estado,
que cometiam atos ilegais em
relação à própria vigência do
sistema jurídico da ditadura.
FOLHA - Qual a implicação da não
punição dos torturadores? A tortura
persiste até hoje nas forças policiais.
TARSO - Se não imprimirmos
no "ethos" democrático do país
uma consciência da barbárie
que significa a tortura, vamos
perder a oportunidade de fazer
com que as pessoas compreendam que não podem derrubar a
Constituição. Elas poderão
pensar que poderão fazer tudo
isso e mais tarde serão perdoadas. E isso é imperdoável.
Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Governo anuncia Memorial da Anistia em 2010 Índice
|