São Paulo, domingo, 23 de setembro de 2007

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Governo desiste de recorrer de decisão sobre o Araguaia

AGU define como será cumprida a sentença que manda a União informar onde estão os restos mortais dos guerrilheiros

Apesar de desistir de ir à Justiça, a Advocacia Geral da União admite que será muito difícil encontrar os restos mortais dos envolvidos

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O governo decidiu que não vai mais recorrer da decisão judicial que determinou a abertura dos arquivos militares sobre todas as operações na guerrilha do Araguaia. A AGU (Advocacia Geral da União) deverá definir nesta semana como será cumprida a sentença que manda a União informar, em 120 dias, onde estão os restos mortais dos familiares dos 22 autores de uma ação movida em 1982.
O anúncio é feito depois de o governo Lula ter tentado, durante quatro anos, rever sentença em ação movida há 25 anos para garantir o traslado das ossadas e o sepultamento de pessoas mortas há 33 anos.
Em 1974, as Forças Armadas extinguiram o movimento armado organizado pelo PC do B contra o regime militar na região do Bico Papagaio (entre Tocantins, Pará e Maranhão). A abertura democrática não eliminou os focos de tensão entre militares e setores do governo da área dos direitos humanos.
A partir da decisão da juíza federal Solange Salgado, autorizando a quebra dos sigilos em 2003, o governo Lula emitiu sinais contraditórios, ora confortando as famílias, ora tentando reduzir resistências militares.
A AGU admite que "a probabilidade de localização dos restos mortais dos familiares dos autores [da ação] é mínima".
Em março deste ano, relatório de Comissão Interministerial registrou que as Forças Armadas informaram ter destruído, com base na legislação, todos os documentos das operações militares. O ministro Paulo Vanucchi (Direitos Humanos) afirmou, na ocasião, que a comissão "não aceitava" aquela informação como definitiva.
Em 2004, o ex-ministro da Defesa, José Alencar, chegou a prometer que o governo não temia reação à abertura dos arquivos. O então presidente do PT, José Genoino (que participou da guerrilha), disse esperar que o governo não recorresse.
O governo recorreu. O atual titular da Defesa ministro Nelson Jobim, segundo sua assessoria, "no momento não está se manifestando sobre o caso".
A juíza determinou a intimação de "todos os agentes militares ainda vivos que tenham participado das operações". Abriu a possibilidade de serem ouvidos de generais da reserva a militares de patentes inferiores. Em decisão publicada na quinta-feira no "Diário da Justiça", o STJ manteve integralmente a sentença.
A União recorreu, por entender que a sentença "ultrapassava os limites", ao determinar "a abertura indiscriminada de todos os arquivos sigilosos", e por causa da multa diária em caso de desobediência.
"Choca-me ver o governo se desdobrar em elogios às Forças Armadas, sem lembrar os abusos que elas cometeram e que procuram encobrir ainda hoje", disse, na ocasião, a ex-militante do PC do B Criméia Alice Schmidt Almeida. Ela tem, entre os desaparecidos no Araguaia, o marido, André Grabois, e o sogro, Maurício Grabois.
Criméia criticava o recurso da AGU. A peça enfatizava que as Forças Armadas e o poder civil "estão plenamente integrados", citava ações conjuntas de "garantia da ordem pública" e até a participação dos militares no programa Fome Zero.
Em 2004, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região foi além, ao julgar o recurso da AGU. Decidiu que ministros e comandantes das Forças Armadas deveriam comparecer a audiência naquele tribunal para iniciar a abertura dos arquivos, sob pena de serem presos.
O juiz Souza Prudente, do TRF, disse então que era "chegada a hora de o governo Lula dar eficácia à expressão de que a esperança venceu o medo".
Os ministros e as autoridades militares obtiveram salvo-conduto no STF (Supremo Tribunal Federal) para não irem à audiência. A decisão do TRF-1 foi derrubada em junho, pelo STJ, ao julgar que a sentença tem que ser executada pela Justiça de primeiro grau e não pelo tribunal federal.
Esse habeas corpus deveria ser julgado no Supremo no dia seguinte ao do recebimento da denúncia do mensalão.
Foi retirado de pauta porque o advogado-geral da União, José Antônio Toffoli, comunicou verbalmente ao relator, ministro Joaquim Barbosa, que a AGU obtivera decisão favorável no STJ em junho.


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