São Paulo, domingo, 23 de outubro de 2005

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Caso Herzog foi "gota d'água", afirma jornalista

DA REPORTAGEM LOCAL

Até hoje Audálio Dantas se emociona ao rememorar a semana que, para muitos, foi um marco decisivo na luta contra o regime militar. No período que separa o dia da morte de Vladimir Herzog, em 25 de outubro, até a realização do culto ecumênico na Praça da Sé, na sexta-feira seguinte, dia 31, o então presidente do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo dormiu muito pouco.
"Para começar, permaneci acordado de sábado à noite, ao ser avisado da morte do Vlado pelo Fernando Pacheco Jordão, até segunda-feira, dia do enterro", lembra Dantas, que havia assumido o sindicato alguns meses antes, em maio. "O que mantinha a gente de pé era o sentimento de revolta e a solidariedade dos colegas."
O afluxo espontâneo, e não só de jornalistas, ao sindicato era sintoma de que alguma coisa nova estava ocorrendo. "Já se sabiam de tantos casos de morte devido a prisões; de repente aquele momento era o da chamada gota d'água, em que as pessoas diziam que não dava mais para aguentar."
Ele conta a dificuldade de conciliar a revolta com os limites da lei, num tempo em que, com uma simples penada, o governo podia destituir a diretoria do sindicato e nomear uma de seu agrado.
"Desde o começo ninguém acreditou na versão de suicídio, mas a gente não podia soltar uma nota dizendo que os militares estavam mentindo", afirma Dantas. "Estávamos no fio da navalha, e a saída foi denunciar a ilegalidade das prisões e dizer que as autoridades eram responsáveis pela integridade dos presos."
A proposta de culto ecumênico foi sugestão de Hélio Damante, diretor do sindicato. Foram dias de muita pressão e tensão crescente. "Tínhamos plena consciência de que aquele processo tinha uma importância muito grande, todo mundo estava esperando para ver o que ia acontecer no culto", recorda Dantas.
O resto da história todos conhecem: apesar dos bloqueios policiais esparramados pela cidade, cerca de oito mil pessoas foram à Catedral da Sé. Foi a primeira grande manifestação contra o regime militar depois do Ato Institucional nš 5. Aos 76 anos, Dantas dedica-se agora a escrever um livro resgatando a atuação do sindicato naqueles dias. "A sociedade, naquele momento, despertou e disse: então eles matam? Muita gente não acreditava nessa hipótese." (RM)

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