São Paulo, domingo, 23 de dezembro de 2007

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JANIO DE FREITAS

Efeitos da tarefa inesperada


Além de cansado, Lula deve estar dolorido, que assim as derrotas, duas delas recentes e duras, deixam o corpo e a alma


O PRESIDENTE está cansado. E deve estar dolorido também, que assim as derrotas, duas delas recentes e duras, deixam o corpo e a alma. Entende-se que o presidente volte, com insistência, a um tema de que foi o lançador autêntico, este sem copiar de ninguém: a alegada necessidade de férias presidenciais. De minha parte, nada a opor. E só não acrescento o "pelo contrário" para não ser grosseiro, uma quase especialidade presidencial.
Nada a opor, de fato, por mais de um motivo. Há poucos meses, fui alvo, com um ou dois colegas, de uma acusação sem nomes, mas com clara direção, por parte de um ex-assessor de Lula: "Dizer que o presidente não trabalha é mentira; o presidente trabalha 14 horas por dia" (talvez tenha dito 16 horas, mas não faz diferença). Minhas referências à necessidade de que Lula trabalhasse mais como presidente foram feitas no ano passado: o ano eleitoral, em que Lula, sob os mais fúteis e até ridículos pretextos, viajou o ano todo pelo país afora em campanha escancarada pela reeleição, sem estar na Presidência senão de passagem, só uma conexão de luxo.
A idolatria é cega, e o ex-assessor não pôde ver nada disso, nem mesmo nas primeiras páginas dos jornais e nos telejornais diários. Mas por este ano não haverá acusação: digo que em 2007 Lula trabalhou. Além de dolorido pelas últimas e malsucedidas batalhas, deve ter algum cansaço. Imposição das circunstâncias, é certo. A divisão original das tarefas mal chegou a 2005, com José Dirceu encarregado da política e da coordenação administrativa, Antonio Palocci e Henrique Meirelles com o continuísmo econômico e financeiro, e Lula com o marketing do governo, aqueles blablablás do tipo "espetáculo do crescimento", fome zero e por aí. Desmoronado o esquema, seguiu-se o ano dedicado à reeleição, ano de candidato e não de presidente. Em 2007, enfim, veio um ano de trabalho.
Trabalho só de política, é verdade, porque Dilma Rousseff carregou a administração. Bem, a área política foi um desastre anual, como o diagnosticam os presidentes do Senado e da Câmara, por absoluta falta de articulação política na "base aliada" e de coordenação da Presidência e ministros com o Congresso. Mas que Lula trabalhou, trabalhou. Se o seu toma lá/dá cá, continuação da sua política sindical, transplantado para a política institucional e partidária não funcionou, nem por isso lhe pareceu menos exaustivo. Tanto que quase não viajou em 2007, no Brasil ou para o exterior, em comparação com as partidas e chegadas dos anos anteriores.
Apesar de menos conseqüente, outro motivo para reconhecer o trabalho de Lula neste ano é que, afinal, por aí se encontra a possível explicação para o mau humor constante e agressivo que exibiu. É um efeito secundário a que certas pessoas estão sujeitas.

Obras
A Secretaria de Imprensa da Presidência da República, em nota sobre a retirada de uma escultura de Elisa Bracher do jardim do Alvorada, diz que, em 2003, "a avaliação dos técnicos foi de que a obra não se adequava ao conceito original dos jardins". Pode ser. Mas, posta lá depois, a estrela do PT é adequada a tal conceito?


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