|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ANÁLISE
A democracia sem ideias
GUILHERME MALZONI RABELLO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Toda a discussão política no
Brasil parece resumir-se a
quando vai ser lançada a campanha deste e daquele candidato e que obras serão inauguradas até as eleições. Essa história já é bem conhecida, e ninguém espera algo de novo.
Há tempos, a democracia
transformou-se numa panaceia universal capaz de curar
todos os males. Do PC do B ao
DEM, todos têm por grande objetivo defender, reforçar, aprofundar a democracia no país e
procuram fazer isso no canteiro de obras ou na televisão. O
que há de errado? Que no Brasil
não se debatem ideias. A política passou a ser assunto exclusivo de engenheiros e publicitários. Ou seja, de comadres.
Não se trata de esperar que o
debate político chegue às insondáveis profundezas de Habermas. Trata-se apenas de discutir aquilo que é necessário
para o bom funcionamento da
democracia, porque ela não
funciona sem ideias.
O problema está em pressupor que a democracia seja em si
mesma um valor acima de toda
a discussão, quando é apenas
um sistema de governo. Na melhor das hipóteses, reflete os interesses imediatos da população, ou mais comumente o do
partido que calhou de ser eleito. E como bem sabia Churchill,
sistema de governo, por si só,
não torna ninguém feliz.
Com a opinião nada singela
de que é preciso "dar ao povo o
que o povo gosta", elimina-se
toda a questão valorativa.
Não basta termos eleições
para que se instalem a justiça, o
respeito pela liberdade e a
igualdade dos indivíduos.
As oposições esqueceram-se
de que boas obras públicas não
garantem boa democracia, e
mais parecem um eco do que
diz o governo. No curto prazo, a
consequência é que o discurso
de uns e outros passa a ser vazio, em torno de uma manipulável competência administrativa.
No longo, minam-se as bases do sistema democrático e
instaura-se uma "ditadura da
opinião única". Afinal, se as
únicas diferenças são técnicas,
não estaremos lidando com "farinha do mesmo saco"?
GUILHERME MALZONI RABELLO é presidente
do Instituto de Formação e Educação (IEE) e editor da revista "Dicta&Contradicta".
Texto Anterior: Governador "inaugura" convênios Próximo Texto: PR investiga Assembleia por ato secreto Índice
|