São Paulo, domingo, 24 de junho de 2007

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Juíza da Têmis é investigada por decisões sobre "títulos podres"

Maria Cristina Barongeno pediu processo da Friboi, que tem seu pai como um de seus advogados

Empresas conseguiram decisões sustando cobrança de impostos não pagos ao fisco e de contribuições não recolhidas ao INSS

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Rastreamento feito pelo Ministério Público Federal em processos julgados pela juíza federal Maria Cristina Barongeno, de São Paulo, para reconhecimento de títulos da dívida pública emitidos pela União no início do século passado -os chamados "títulos podres"-, sugere que ela teria avocado indevidamente para si um processo do frigorífico Friboi. O seu pai, Joaquim Barongeno, é um dos advogados do Friboi.
Ela é uma das 43 pessoas investigadas pela Operação Têmis, da Polícia Federal, por suspeita de venda de sentenças.
Dois processos despertaram a atenção pelo perfil dos primeiros litigantes: Nair Coimbra Motta, uma professora aposentada, de 60 anos, do Mato Grosso do Sul, e Ivone Andrade de Deus, uma comerciária paulista de 23 anos. Elas eram portadoras de velhas Apólices da Dívida Pública e, aparentemente, pretendiam lucrar, no futuro, com esses títulos que só têm valor como curiosidade histórica. Ambas eram representadas nessas ações por advogados ligados ao pai da juíza federal.
Tão logo distribuído o processo para a Vara de Maria Cristina, a professora cedeu parte dos títulos para outras empresas, entre as quais a Gocil, uma firma de segurança representada pelo advogado Márcio Pollet, amigo da juíza. Pollet atua em parceria com o pai da juíza. A professora desistiu de outros títulos, usados, depois, pela Friboi em ação distribuída para Maria Cristina.

Impostos
Por meio de expedientes como esse, as empresas conseguiram decisões da juíza para sustar a cobrança de impostos não pagos ao fisco e de contribuições não recolhidas ao INSS.
A comerciária viria a desistir do processo, que foi extinto. A partir do número de títulos comuns em duas ações, a juíza entendeu haver conexão desse processo extinto com outras ações, entre as quais uma da Friboi. A distribuição de processos "por dependência" para um mesmo juiz [prevenção] tem a finalidade de evitar julgamentos conflitantes de causas que guardam conexão entre si.
Em decisão unânime da 3ª Turma, o Tribunal Regional Federal entendeu, no último dia 30 de maio, que essa conexão com ação já extinta era impossível. E enviou os autos à Corregedoria Geral de Justiça.
O MPF considerou "inadequado" o modo de decidir da juíza. Entendeu, ainda, que a magistrada deveria ter-se declarado suspeita para julgar as ações da Friboi e da Gocil.
O rastreamento foi feito a partir de documentos apreendidos no escritório do advogado Luiz Roberto Pardo. Ele não atuou diretamente em nenhum processo, mas, segundo a PF, centralizava os negócios da suposta quadrilha. A PF flagrou a juíza participando de reuniões nos escritórios dos advogados Pardo e Pollet, ambos investigados pela Têmis.

Liminar
Em 2002, a juíza concedeu liminar [tutela antecipada] para a Friboi usar títulos emitidos em 1932 pela "Cie. Du Chemin de Fer Victoria a Minas", suspendendo a exigibilidade de tributos ou de contribuições previdenciárias da filial do frigorífico em Andradina (SP).
Essa liminar foi cassada em 2003 pela desembargadora Cecília Marcondes, do TRF-3. Em dezembro de 2006, Maria Cristina deu sentença confirmando aquela liminar. Determinou a atualização dos valores pela paridade franco-ouro. A Friboi foi representada pelo advogado Nevtom Rodrigues de Castro.
Castro e seu sócio Coriolando Bachega foram os advogados da ação, no valor de R$ 90 milhões, movida em 2002 pela professora Nair Coimbra Motta. Ele também foi o advogado da comerciária paulista.
Há pareceres de renomados advogados considerando válidos esses títulos. Mas a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, desde 2005, determina que eles não podem ser dados como garantia em execução fiscal. O Tesouro Nacional informou nos autos que o prazo para resgate, nos bancos, de títulos emitidos em francos pelo governo brasileiro na França esgotou-se em 1951.
Com as liminares, as empresas obtinham Certidões Negativas de Débito, podiam emitir notas fiscais, para acobertar outras operações, e participar de licitações públicas.


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