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Marcelo Coelho critica petistas por "busca do poder pela via televisiva"
DA SUCURSAL DO RIO
Para o sociólogo Marcelo Coelho, colunista da Folha, a tensão
na relação entre os intelectuais e o
PT começa na maneira com que
foi concebida a campanha de Luiz
Inácio Lula da Silva em 2002, e
não na crise atual. Foi o que Coelho afirmou ontem, em sua palestra no seminário "O Silêncio dos
Intelectuais", na Maison de France, na cidade do Rio de Janeiro.
O sociólogo argumentou que "o
problema começa quando se passa a apostar em uma conquista de
poder fundamentada não no esclarecimento da população e na
lucidez, mas no marketing, na
profissionalização da mistificação, da falta de transparência",
disse ele, criticando a "busca do
poder pela via televisiva" determinada, na sua visão, pela cúpula do
PT em 2002.
"Não se pode estar de acordo
com isso. Nem falo nas alianças
políticas extravagantes, com PTB
e PL, que nem a lógica da razão de
Estado torna aceitáveis. Quando
se investe na mentira, nenhum intelectual deveria estar apoiando",
afirmou ele, acrescentando que
não tem mais expectativas em relação ao PT.
Coelho estendeu sua crítica a
políticos e jornalistas, mas disse
que a imprensa está desempenhando um papel melhor do que
o dos intelectuais.
"Observando o comportamento de uma camada intelectual voltada à defesa de partidos, tanto do
PSDB quanto do PT, parece ter
restado aos jornalistas a apuração
da verdade. Com todos os erros e
precipitações, procurou-se investigar ao máximo o poder, algo que
os intelectuais não foram capazes
de fazer", disse.
Verdade e justiça
Na palestra "Verdade e Contra-Verdade", Coelho procurou fazer
uma revisão do papel dos intelectuais a partir do fim do século 19,
quando o escritor francês Émile
Zola produziu o libelo "J'Accuse"
("Eu Acuso") e se recusou a aceitar calado a condenação do capitão Dreyfus, acusado injustamente -e de forma anti-semita, pois
era judeu- de passar informações militares para os alemães.
"Escritores de prestígio, da Academia Francesa, diziam que não
podiam intervir, pois era um assunto de segurança nacional, que
a honra do Exército devia ser preservada. Mas em torno do lema
"Verdade e Justiça", Zola e outros
artistas, como Proust, Monet e
Anatole France, conseguem a revisão do processo", disse Coelho,
ironizando que essa é uma das
poucas histórias com "final feliz"
para a esquerda.
Para ele, verdade e justiça não
podem ser vistas como idéias metafísicas, mas como alvos concretos a serem perseguidos pelos intelectuais em contraposição ao
pragmatismo adotado pelos ideólogos. "Há [hoje] um certo culto
da realidade, como se ela fosse assim mesmo e não houvesse muito
o que fazer. Acho que os intelectuais têm de continuar seguindo
os ideais de cem anos atrás", afirmou.
Assim como Marilena Chaui
em sua palestra, Coelho abordou
criticamente a atuação nos anos
50 de Jean-Paul Sartre, o mais notório dos "intelectuais engajados". Para ele, Sartre traiu o papel
do intelectual ao faltar com a verdade durante os três anos (1953 a
56) em que esteve ligado ao Partido Comunista Francês.
A atuação de Sartre como comunista o teria levado a defender
mentiras: "Ao voltar de uma viagem à União Soviética, em 1954,
Sartre declarou: "A liberdade de
crítica é total na União Soviética".
Todos sabiam que não era. Só em
56, com a invasão de Budapeste
[pelos soviéticos], é que a ficha
caiu para ele e muitos outros",
disse Coelho, para quem a posição de Sartre está entre os muitos
"erros" e "vexames" da história
dos intelectuais.
O sociólogo também comentou
a defesa de princípios universais
por outro escritor francês, André
Gide, e as idéias do livro "A Traição dos Intelectuais" (ou "A Traição dos Clérigos"), escrito por Julien Benda em 1927 e hoje visto
como maniqueísta e ingênuo.
"Acho que Benda merece ser revisto. Para ele, o intelectual tem o
dever de ser inoportuno sempre
que a verdade e a justiça forem
inoportunas", disse Coelho, evocando os dois conceitos-chave
que, segundo ele, precisam ser defendidos pelos intelectuais quando incomodam interesses particulares.
Programação do evento
O sociólogo faz sua palestra hoje, em São Paulo, no Sesc Paulista.
No Rio fala o ministro da Educação, Fernando Haddad, e em Belo
Horizonte, o sociólogo Francisco
de Oliveira, que rompeu com o
PT em 2003.
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