São Paulo, segunda-feira, 24 de agosto de 2009

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Valor de indenizações pagas provoca jogo de pressão e críticas

Grupos que representam anistiados se dizem insatisfeitos com a alteração no cálculo dos valores das reparações pagas

Câmara criou grupo para acompanhar trabalhos da Comissão de Anistia; integrantes consideram medida uma intimidação

DO ENVIADO A BRASÍLIA

Por trás da discussão sobre distorções na concessão de indenizações milionárias a anistiados políticos existe, de um lado, uma forte pressão de alguns grupos organizados, e, de outro, críticas a falhas da lei.
Enquanto a questão dos crimes cometidos de ambos os lados e da busca da verdade sobre muitos casos permanecem com poucos avanços, a indenização aos prejudicados pela ditadura militar tem funcionado há anos. E acabou por levar uma série de críticas.
Integrantes tanto da Comissão de Anistia do governo federal quanto de grupos insatisfeitos com decisões recentes do órgão relatam a guerra nos bastidores. O mais recente instrumento para canalizar a pressão, dizem os dois lados, foi a criação de uma comissão na Câmara, a Ceanisti (Comissão Especial de Anistia), para acompanhar os trabalhos da Comissão de Anistia.
O presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, já foi chamado mais de uma vez para depor sobre casos em que o desfecho não foi favorável a quem fez o pedido, o que é visto como uma tentativa de intimidação por alguns integrantes da entidade, que fazem críticas sob condição de sigilo.
Um documento a que a Folha teve acesso, elaborado por entidades que representam anistiados, lista 13 pontos de descontentamento, todos relacionados a respostas negativas a pedidos de indenização ou a valores abaixo dos esperados.
O principal motivo para a escalada na disputa entre o governo e os grupos de anistiados é uma mudança na interpretação da lei que criou a Comissão de Anistia, em 2002.
Até dois anos atrás, o governo pagava as indenizações vitalícias e os retroativos com referência no ponto em que a carreira do perseguido estaria se não tivesse sido interrompida. Na prática, é como se todos os que fazem os pedidos estivessem no auge da carreira -mesmo quando retomaram seus empregos alguns meses depois ou partiram para outras profissões e foram bem-sucedidos.
Desde então, Abrão passou a aplicar um "princípio da razoabilidade e da adequação aos valores atuais", com uma média do salário da profissão, não mais o topo. Isso levou a uma queda no valor médio das indenizações.
O ministro da Justiça, Tarso Genro, disse à Folha que a legislação é "imperfeita" e permite distorções nos valores das indenizações. Mas afirma que não deve haver mudanças. "É difícil, porque a pressão maior que existe para modificações vai no sentido contrário a essa visão [de que as reparações são exageradas]."
Para Tarso, "o próprio conceito de anistia no Brasil é totalmente deformado".
"Qual é a moralidade que está contida num perdão que o regime militar dá a quem resistiu contra ele, dizendo que eles são criminosos, por isso devem ser perdoados? O conceito de Anistia que temos de trabalhar é o contrário, que o Estado diga para o cidadão que ele errou, e que ele está pedindo desculpas ao cidadão. Tem danos que a ditadura causou para indivíduos e famílias que são absolutamente impagáveis", afirma.


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