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São Paulo, quarta-feira, 24 de setembro de 2003

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ELIO GASPARI

Feliz o analfabeto que não lê este artigo

O tucanato contava uma linda história: a elevação do nível de escolaridade do brasileiro produziria ganhos de produtividade que alavancariam um período de inédita prosperidade em Pindorama. Lorota. O professor Márcio Pochmann (Unicamp) informa: em 2000, em São Paulo, para cada desempregado analfabeto, havia dois desempregados com diploma de curso superior. Dando números aos bois, havia 23 mil analfabetos desempregados e 45 mil cidadãos com o curso superior completo desocupados. Se essa tendência se manteve (e não há motivo para duvidar disso), há hoje 66 mil desempregados com diploma em São Paulo. Os analfabetos desocupados seriam 36 mil.
O país onde vivem esses diplomados é a 13ª economia do mundo. Há 20 anos, era a oitava. Se tivesse continuado a crescer ao ritmo dos anos 60/70 (que Pochmann chama de ciclo da jaca, pelo tamanho da árvore e do fruto), o Brasil seria hoje a quinta potencia econômica do mundo, depois dos EUA, do Japão, da Alemanha e da França, à frente da Inglaterra e da Espanha. Se continuar no ciclo do bonsai (aquele em que cada galho de crescimento deve ser devidamente avaliado e, quase sempre, podado), será a 19ª, junto com a Índia.
Pochmann ocupa atualmente a Secretaria do Trabalho da Prefeitura de São Paulo. Ele é um daqueles economistas que descobrem os números que os governos preferem deixar na sombra. Enlouqueceu o tucanato quando mostrou que, depois da Índia, o Brasil era o país com o maior número absoluto de desempregados no mundo. Era uma vinheta, pois estava implícita a relatividade do tamanho da população. Hoje são os tucanos que enlouquecem os petistas, pois ninguém tira do governo de Lula o vice-campeonato mundial de desemprego por pelo menos dois anos.
Algum dia, Lula decidirá se acaba com o terceiro mandato de FFFHHH. Ele pode decidir encerrar o triste período da história nacional que abriu seu alçapão nos anos 80 e levou uma geração de brasileiros para o andar de baixo. Essa é a verdadeira herança maldita. Infelizmente, o PT federal resolveu se tornar parte dela. Pena, porque algum dia vai herdar a própria maldição.
O desemprego é apenas parte do estratagema maldito. Entre 1950 e 1980, no ciclo da jaca, a participação do trabalho na renda nacional ia a 55% do PIB.
Em 1980, caiu para 50%. Hoje, ela está em 36%. Já as rendas do capital, aquelas que a ekipekonômica ceva com seus juros, manteve-se em 45%. No ciclo do bonsai, torraram os bens da Viúva, destruíram a qualidade dos serviços públicos, agrediram a máquina do Estado e desmoralizaram seus servidores.
Mesmo assim, em 1992, o governo mordia 12% e, no ano passado, passou a morder 19% do PIB nacional. Divertidas essas ekipekonômicas: degradam os serviços, mas aumentam a mordida. Depois da privataria tucana, o governo prepara a terceirização (com garantia de retorno) dos seus serviços básicos. Chamam o truque de PPP (Parceria Público Privado, mas podem chamar também de Pilhagem do Patrimônio da Patuléia).
O PT foi levado ao poder porque o Brasil vivia essa crise de duas décadas. Se decidiu ser a própria crise, problema dele. Quem se dá bem numa situação dessas é o analfabeto. Consola-se com o desemprego dos diplomados e não se chateia lendo artigos como este.


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