São Paulo, domingo, 24 de setembro de 2006

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ELEIÇÕES 2006 / PARANÁ

Acusado de grampo citava Requião e se dizia seu "araponga"

Investigador preso sob acusação de fazer interceptações ilegais negociava compra de equipamentos em nome do governador

Oposição acusa Requião de usar Delcio Rasera como araponga com fins políticos; governador afirma que caso não é problema do palácio

Reprodução da TV Paraense
O investigador Delcio Augusto Rasera, acusado de chefiar quadrilha que fazia grampos ilegais


FÁBIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA

MARI TORTATO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CURITIBA

Gravações e documentos em poder do Ministério Público indicam que o investigador Delcio Augusto Rasera, que trabalhava na Casa Civil do governo do Paraná e foi preso há três semanas acusado de chefiar uma quadrilha de interceptações telefônicas ilegais, negociava com empresas a compra de equipamentos para o Estado em nome do governador licenciado Roberto Requião (PMDB), candidato à reeleição.
Numa conversa captada por escuta telefônica autorizada pela Justiça, Rasera diz a uma representante da Pctel, uma firma que fabrica gravadores telefônicos para computador, que pode intermediar a aquisição de equipamentos para o governo. No diálogo, ele se refere a Requião como "meu governador" e diz que trabalha no governo como araponga.
"A minha participação no governo, eles me olham como um araponga, entendeu como é que é? Agora eu vou entrar no ramo do mercado, de vender merchandising para eles", diz.
Uma evidência de que a gravação é recente é uma menção de Rasera à aliança de PMDB e PSDB nas eleições estaduais. O acordo foi selado em junho, mas anulado em agosto pelo Tribunal Regional Eleitoral.
Rasera, que está preso numa delegacia de Curitiba, é acusado também de porte ilegal de arma. Nos escritórios onde atuaria o policial civil, a PIC (Promotoria de Investigações Criminais), braço do Ministério Público paranaense que coordena a operação, encontrou, além de aparelhos para fazer grampos, dezenas de armas (até fuzis de uso exclusivo do Exército) e munição pesada. A oposição acusa Requião de usar Rasera como araponga com fins políticos. O governador nega e diz que o investigador "não é problema do Palácio".
Rasera usava um cartão de visitas de "assessor da Governadoria" e, graças à intervenção de Requião, teve arquivados quatro processos disciplinares a que respondia na Polícia Civil. Na investigação da PIC, há indícios de que o acusado realizava serviços de grampo para membros do Executivo e do Judiciário do Paraná.
Num dos CDs do material apreendido, há também a cópia de uma carta identificada como "Confidencial", na qual Rasera indica a um representante da Nextel os passos para conseguir que o sistema fosse adotado na Casa Militar e na Granja do Cangüiri, onde vive Requião.
Falando como "assessor do governo", Rasera informa ao representante José Quaresma Ribeiro que há mais de 200 usuários potenciais do telefone móvel da Nextel no governo. A Casa Militar e a Secretaria da Segurança adotaram o celular da Nextel no final de 2003.
Um terceiro sinal de que Rasera interferia na compra de equipamentos de inteligência para o governo é a cópia de um ofício a Requião que apresenta o aparelho de escutas telefônicas conhecido como "Guardião", que tem capacidade para captar simultaneamente 600 conversas telefônicas simultâneas, e estimula sua compra.
O governo comprou ao menos um "Guardião". O deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) pediu à comissão de controle das atividades de inteligência do Congresso a abertura de investigação sobre o "Guardião", alegando suspeita de que o aparelho era usado para grampear adversários de Requião. O governo nega.

Crise na Promotoria
Além de agitar a campanha eleitoral no Paraná, o "caso Rasera" abriu uma crise no Ministério Público do Estado. O estopim foi uma declaração do procurador-geral de Justiça, Milton Riquelme de Macedo, veiculada no horário eleitoral de Requião, desvinculando as atividades de Rasera do governo.
O julgamento, por parte do chefe do Ministério Público, de um caso que está sob investigação da própria instituição que comanda gerou pesadas críticas ao procurador-geral.
A Associação do Ministério Público do Paraná cogita levar o caso ao Colégio de Procuradores. A OAB-PR disse que a posição de Riquelme constitui improbidade administrativa.


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