São Paulo, segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

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Morre, aos 83, dom Aloísio Lorscheider

Arcebispo emérito de Aparecida foi o brasileiro que teve mais chances de virar papa; ele sofria de insuficiência cardíaca

Ao lado de d. Ivo Lorscheiter, d. Hélder e d. Luciano, lutou contra a ditadura; enterro será na quinta-feira, na cidade de Imigrante (RS)

SIMONE IGLESIAS
DA AGÊNCIA FOLHA EM PORTO ALEGRE

LEANDRO BEGUOCI
DA REPORTAGEM LOCAL

O brasileiro que teve mais chances de virar papa morreu ontem, por falência múltipla dos órgãos. Dom Aloísio Lorscheider, 83, arcebispo emérito de Aparecida (SP), estava internado desde o dia 28 de novembro no Hospital São Francisco, em Porto Alegre.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que "sua dedicação aos pobres e à justiça social são exemplos que permanecerão vivos para todos os brasileiros". A governadora do Rio Grande do Sul, Yeda Crusius (PSDB), declarou luto oficial de três dias.
Dom Aloísio sofria de insuficiência cardíaca. Somente neste ano, havia sido internado quatro vezes. Em 28 de novembro, teve um acidente vascular cerebral isquêmico. Seu estado piorou no dia 11 de dezembro. Levado para a UTI, ficou em coma induzido por medicamentos até a morte, constatada às 5h20 de ontem.
O corpo foi levado para a Catedral Metropolitana de Porto Alegre às 16h, onde será velado até às 20h de amanhã. Depois, irá para a nave central da igreja, onde permanecerá até quarta-feira. Às 9h30 do dia 26, será celebrada uma missa pela Província Franciscana e, às 18h, o arcebispo de Porto Alegre, dom Dadeus Grings, irá realizar a "missa de exéquias", que é o ritual de corpo presente.
Na noite do dia 26, o corpo seguirá para Imigrante, cidade vizinha a Estrela (109 km de Porto Alegre), onde dom Aloísio nasceu em 8 de outubro de 1924. Lá, será velado por mais uma noite, até o horário do enterro, marcado para às 17h de quinta-feira no Cemitério dos Franciscanos Daltro Filho.

Franciscanos
Nascido em uma comunidade alemã em Estrela, ele voltou ao Rio Grande do Sul em 2004, quando deixou a arquidiocese de Aparecida (SP) e foi viver entre 18 frades franciscanos no convento Monte Alverne, em Porto Alegre. Frei Jorge Hartmann, responsável pelo convento, diz que ele continuava a dar palestras a comunidades próximas e rascunhar livros que pretendia levar ao prelo.
Também gostava de receber amigos, como d. Cláudio Hummes (hoje "ministro" do papa Bento 16 no Vaticano, a quem d. Aloísio ordenou bispo em 1975), com quem se encontrou em setembro deste ano.
"Ele resistiu enquanto pôde, era estóico, homem de fé, dizia estar tranqüilo para quando Deus o chamasse", diz Hartmann. "Era obediente no convento e, mesmo cardeal entre os frades, queria viver como um de nós, pedia autorização para sair. A gente estranhava, mas ele sempre dizia que quem não sabe obedecer não sabe mandar", conclui o frade.
A saúde do presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) entre 1971 e 1978 e do Celam (Conselho Episcopal Latino-Americano) entre 1976 e 1979 sempre foi frágil. Ao longo da vida, sofreu um infarto, tinha pressão alta, passou por oito cirurgias (duas no coração), colocou quatro pontes de safena e um marca-passo. Era também diabético.

Conclave
Em 1978, durante o conclave que transformou Albino Luciani no papa João Paulo 1º, d. Aloísio recebeu votos dos cardeais presentes. Uma das versões diz que o próprio Luciani votou em d. Aloísio. Entre os fatores que enfraqueceram a sua candidatura está o infarto sofrido pouco tempo antes.
Anos mais tarde, em 2005, d. Aloísio acrescentaria outra razão, em entrevista sobre as chances de d. Cláudio na sucessão de João Paulo 2º. "Os europeus, maioria no conclave, têm uma indisfarçável sensação de superioridade. Eu conheço bem isso. Nós, não-europeus (e isso vale também para os africanos e asiáticos), sofremos uma certa discriminação. Tudo isso, bem entendido, é humanamente falando."
Junto com bispos como seu primo d. José Ivo Lorscheiter (morto em março deste ano), d. Hélder Câmara, arcebispo de Olinda e Recife morto em 1999 e d. Luciano Mendes de Almeida, bispo de Mariana (MG) morto em 2006, d. Aloísio tomou a frente no combate ao regime militar. Também foi um dos bispos mais ligados à Teologia da Libertação, corrente que vê a igreja a serviço da transformação social. Mas não era um dos bispos mais ligados ao PT. Um de seus interlocutores políticos era o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). Quem conviveu com ele afirma que era disciplinado e piedoso.


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